Recebemos, de Bissau, para publicação, a
seguinte Mensagem Política, dirigida
pelo conhecido Jurista Guineense
Dr.Antero Binhã ao Congresso Extraordinário do Partido da Resistência da
Guiné-Bissau - Movimento Bafatá (RGB-MB), realizado, em Bissau, ontem e Sábado
(dias 14 e 15 de Dezembro), onde foi lida.
O
Dr. Binhã é considerado, em alguns círculos, como Pai da Democracia Guineense,
por ter sido o Autor do Programa e do Estatuto Político da RGB-MB (Resistência
da Guiné-Bissau – Movimento Bafatá), Movimento e Partido Político pioneiro na
Luta pela Implantação da Democracia, na Guiné-Bissau, iniciada em Julho de
1986, antes de qualquer outra Antiga Colónia Portuguesa (incluindo
Timor-Leste).
O
documento tem por título MENSAGEM AO
CONGRESSO DO MOVIMENTO BAFATÁ.
Foi-me pedida uma Declaração dirigida ao
Congresso, na impossibilidade de estar presente ao Congresso, como é o caso. O
tempo escasseia mas quis cumprir um dever cívico para com o Partido, para com
os Militantes e, em especial, para com os Senhores Congressistas, presentes
nesta sala.
Sou o Antero Binhã, Membro Fundador e
Militante da Resistência da Guiné-Bissau - Movimento Bafatá.
Saúdo, calorosamente, todos os Militantes e Simpatizantes da
RGB-MB (Resistência da Guiné-Bissau – Movimento Bafatá), nesta data, reunidos,
em Congresso, em Bissau, para definição do novo rumo do Partido, após 14 anos
de turbulência interna.
O Congresso reúne sob o signo da
reconciliação. Parabéns a todos os Intervenientes, nesse processo, em que eu,
pessoalmente, também tomei parte.
Nessa perspectiva de reconciliação, peço
licença ao Congresso para, em breves palavras, me dirigir ao Dr. Salvador
Tchongó Domingos pelo seu desempenho exemplar, enquanto Militante e Dirigente
político responsável.
Sem ele, o Movimento Bafatá não teria
sequer existido. Com ele, o Movimento Bafatá sobreviveu à uma longa crise
interna.
Só ele, de facto, juntamente comigo,
pode contar a História do nosso Partido, desde os momentos difíceis que
antecederam a sua fundação em 1986.
Como devem saber, o Movimento Bafatá
nasceu, em Julho de 1986, sobre o sangue derramado de alguns dos Filhos mais
queridos deste nosso Povo, que ainda choram o seu desaparecimento prematuro.
Foi posto à prova (refiro-me ao Dr.
Salvador), das mais variadas formas, e superou cada etapa da sua provação. Como
eu compreendo o motivo da sua heróica resistência!
Se o Movimento tivesse caído, como era
desejado pelos nossos adversários, era como se aqueles Mártires da nossa
Pátria, vítimas da má governação e do egoísmo humano, fossem votados ao
esquecimento eterno.
Eu sei do que falo. O surgimento do
Movimento Bafatá resultou de um desafio, que eu e ele assumimos, no último
comunicado, de uma série de três, ao longo de alguns meses, após o chamado
“Caso 17 de Outubro de 1985”, que escrevemos e distribuímos a todas as
Embaixadas em Portugal (incluindo a Nunciatura Apostólica do Vaticano), a todos
os órgãos de comunicação (incluindo a então Agência Noticiosa ANOP - de
Portugal), após ser tornada pública a sentença de morte de Viriato Pã, Paulo
Correia e outras figuras de todas conhecidas.
Nesse último comunicado, denunciámos,
perante a Comunidade Internacional, essa intenção anunciada do Governo do PAIGC
(então Partido único), dizendo, com toda a firmeza, que, se eles fossem mortos,
o Povo da Guiné poderia ter de optar pela criação um novo Partido Político, para
libertar o País do boqueio político, em que se encontrava.
Tal como dissemos, assim sucedeu, uma
semana depois, com a criação da RGB-MB. O resto do percurso, difícil e
dramático, muitos de vós já conheceis.
Todos sabemos que aquele desfecho do
Caso 17 de Outubro (que podia ter sido diferente, no âmbito de uma Política
inteligente – de inclusão) é a origem de todos os males da instabilidade que
tem afectado o nosso País, desde então, porque ninguém mais quer presenciar, no
nosso Chão, semelhante acto de barbárie.
Desde então, o nosso compromisso
político com o Povo Guineense tem sido um compromisso para a Vida.
Por isso, o Dr. Salvador Tchongó merece
todo o meu respeito pelo reconhecimento dos seus méritos de Militante exemplar,
um Dirigente escrupuloso no cumprimento das suas responsabilidades.
Só o facto de, corajosamente, ter
mantido aceso o facho da resistência e sobrevivência do Partido, enfrentando as
mais diversas provações, são disso um magnífico exemplo.
Toda a Bissau sabe como ele passou estes
anos, ao serviço do nosso Povo, apenas para dar testemunho do seu engajamento.
E tudo isso ele fez, no maior
desconforto que se pode imaginar, quer de natureza económica e social, quer do
reconhecimento político, que tão bem merecia, longe da família, longe dos
filhos, apenas movido pelo sentimento do dever para com o nosso País e a sua
gente.
Não vou maçar o Congresso com a
enumeração das suas qualidades, que são muitas.
De facto, desde 1999, ele foi o
verdadeiro rosto da Resistência, preservando e assegurando os valores mais
emblemáticos do nosso Partido, como Militante fiel e incorruptível, humilde e
sincero, honesto e dedicado.
Apesar disso, enfrentou incompreensões, críticas
infundadas e qualificações pouco simpáticas, usadas
como armas de arremesso político, para o desqualificar, para o humilhar.
Com serenidade, porém, manteve-se sempre
fiel ao ideal do bom Militante, tal como delineado no Estatuto Político da
RGB-MB.
Com sacrifício da sua vida pessoal, da
carreira profissional que prometia ser de sucesso, suportou tudo o que podia,
longe da Família, longe dos Filhos, no desconforto da vida, em nome do
cumprimento de um dever patriótico.
O que dizer sobre a sua abertura total,
desde o primeiro instante, em que, após a morte do Dr. Domingos Fernandes
Gomes, se começou a esboçar a via da reconciliação interna?
Sem hesitar, mostrou-se, prontamente,
disponível para a reunificação do Partido, apesar das farpas que lhe foram
lançadas, apesar de fintas e malabarismos.
Uma a uma, cedeu a todas as exigências
que lhe foram sendo feitas, até ao limite do inadmissível. Em nome de um
projecto colectivo, de um Partido reunificado e mais actuante, que alguma insensatez colocou em risco
de desaparecimento, fosse por que motivo fosse.
Militantes,
como ele, deveriam, a meu ver, merecer da parte do Congresso um reconhecimento,
uma distinção especial, como estímulo à boa maneira de estar na Política, ao
serviço do Povo e do País.
Aqui fica a minha homenagem que sei que
é acompanhado por muitos que o conhecem!
Caros Congressistas,
O Congresso Político é, por definição, o
órgão supremo de qualquer organização politica, o mais importante, pela
expectativa de nele se poder apresentar pontos de vista diferentes e inovadores
sobre a dinâmica interna e externa do Partido.
É, por isso, um Órgão extremamente importante.
A sua preparação deve, por isso, merecer o maior cuidado possível, quer na fase
da preparação, quer na convocação, na escolha dos membros para a constituição
das Listas dos Órgãos Estatutários, as quais devem ser previamente discutidas,
no foro próprio.
Fosse qual fosse o motivo, é fácil
constatar que a convocação do Congresso foi, totalmente, negligenciada, no que
respeita à diáspora.
Em Portugal, por exemplo, há gente que
participou, activamente, nas várias reuniões, que se fizeram, para chegarmos ao
ponto de se poder realizar este Congresso, que não souberam sequer que a data
do Congresso era 14 e 15 deste mês e que estavam vivamente interessadas em
estar presente nesta Assembleia magna.
Sendo um momento especial, na vida do
Partido, a convocação do Congresso deveria ter merecido uma preparação mais
cuidada.
Só, na região de Lisboa, há,
seguramente, dezenas de Militantes, que nem sequer souberam da realização do
Congresso.
Por isso, fazem apelo, e esperam, vivamente,
que, na composição das Listas, os seus nomes não sejam esquecidos, por falhas
que (dizem) não são da sua responsabilidade. Certamente, os interessados
far-se-ão ouvir nas instâncias próprias do Partido. Obviamente, não é o meu
caso!
Quanto aos trabalhos preparatórios do
Congresso, impõe-se dizer, premonitoriamente, que as Listas devem obedecer ao
critério da representatividade dos candidatos propostos, assim como da
competência técnica e política.
É comum ouvir-se dizer que o Parlamento
Guineense está repleto de pessoas que nem sequer conhecem as suas funções ou
não sabem sequer expressar o seu pensamento.
Não devem ser elaboradas Listas em
função de simpatias pessoais, de laços familiares, de afinidades regionais, ou
qualquer outra particularidade menos nobre.
Nada mais pernicioso para uma
organização política do que quando cede à tentação do protagonismo, com base em
relações familiares ou de amizade, em afinidades étnicas ou interesse económico.
Esse foi um erro do passado, que
esperamos não se repita, futuramente, porque quase levou à extinção o Movimento
Bafatá, dividido em facções de interesses particulares, que nada tinha a ver
com o Partido.
Devemos estar atentos à excessiva
concentração de poder num indivíduo ou no pequeno grupo em que se apoia. Já
tivemos essa má experiência no passado, no País e no nosso Partido.
Foi um erro que não pode repetir-se. Mas,
a tentação da sua repetição sempre existe. O diálogo interno e externo ao
Partido é sempre fundamental como via de solução.
A concentração obsessiva do poder impede
o diálogo e não é aconselhável em circunstância alguma.
O Congresso é, sem dúvida, um momento
importante da vida do Partido. E este, realizado sob o signo da reconciliação,
ainda mais o é.
Há reparos a fazer, com certeza, e um
dos aspectos tem a ver com a convocatória, a forma de dar conhecimento aos
membros de que um Congresso se vai realizar.
O Congresso deve ser convocado com uma
antecedência razoável para dar tempo aos Militantes para conhecer e debater os
assuntos que irão ser discutidos no Congresso.
A elaboração das Listas de Candidatos deve
merecer um cuidado especial para que seja suficientemente inclusivo, mas ao
mesmo tempo eficiente, no sentido da sua abrangência aos mais amplos sectores
da sociedade.
Só assim, a Lista vencedora pode ser
sentida como uma vitória de todos e de cada um dos militantes.
Vencer o Congresso não pode ser visto
como licença para a arbitrariedade, mas um compromisso sério para realizar a
vontade dos Militantes, isto é, a orientação política aprovada pela maioria e
em linha com o nosso Estatuto e Programa Político.
Ao
Partido não interessa a vitória de uma pessoa, nem de um grupo ou gente ligados
pelos laços de parentesco ou amizade. Disso, também, já tivemos uma má
experiência no passado. Ficou provado que não serve a ninguém nem aos próprios.
O desafio maior não é ganhar o Congresso,
mas convencer o nosso Povo de que somos a escolha certa, quer individualmente,
quer colectivamente.
É no confronto com a realidade da vida,
na interacção com a sociedade, que se vai testar a escolha que, hoje, fizestes
aqui enquanto Congressistas.
O Povo é quem realmente julga e decide,
aprova, ou reprova, o comportamento público ou privado daqueles que hoje
elegestes para desempenhar os diversos cargos previstos no Estatuto do Partido,
dando expressão à vontade dos Militantes.
Fazer política é assumir uma
responsabilidade perante todo o Povo Guineense e não apenas em relação àqueles
que vos elegem.
É a assunção dessa responsabilidade
colectiva que deve ser sentida como uma honra concedida ao Politico por cada
Guineense, por todos os Guineenses, em geral, independentemente da sua origem
social ou étnica, do sexo, idade, filiação partidária ou religião.
Um político que se preze pertence ao
Povo, deve aprender a viver e a trabalhar com o Povo, onde quer que resida, ser
testemunho da realidade da sua vivência para poder ajudar a melhorar o que deve
ser mudado.
Não interessa ao Partido, nem ao Povo,
nem ao País, o tipo de político elitista, distante, soberbo ou vaidoso, que
vive para o seu próprio interesse ou do seu pequeno grupo de amigos. Esses não
merecem a honra de ser políticos. Talvez fiquem melhor na sua vida particular.
Ser político é estar comprometido com a
sociedade, conhecer a realidade da vida para poder buscar as soluções aos
nossos problemas colectivos.
O nosso País precisa de Paz e Estabilidade,
de cooperação com todos os Povos e Países do Mundo, mas, também, de respeito
pelo esforço de normalização, que está sendo feito, a vários níveis, em
condições manifestamente difíceis, para superar as nossas deficiências.
Esse esforço deve merecer o nosso
respeito, quer se trate da esfera do Governo, quer do sector da Defesa e
Segurança, ou qualquer outro, em que se empenhem os nossos compatriotas, a dar
o seu melhor para sairmos bem da crise política e regressarmos à normalização
institucional.
Termino, dizendo que se cumpriu a
Declaração de Lisboa, de 3 de Fevereiro deste ano, que tive a honra de redigir
e subscrever com alguns Militantes do nosso Partido, alguns dos quais se
encontram nessa sala.
O objectivo da Declaração foi lembrar a
todos que devemos estar unidos para restaurar o Projecto Político da RGB-MB e levar
à prática a realização de um Congresso de Unidade, para celebrar a reunificação
do Partido, na certeza de que é mais o que nos une do que o que nos divide.
Viva a Resistência da Guiné-Bissau - Movimento
Bafatá!
Viva a Guiné-Bissau!
Desejo um Bom Trabalho ao Congresso!
Lisboa,
15 de Dezembro de 2013
Antero Branco Binhã
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