Titulo
original: Classe
política guineense busca concórdia no solo em que Cabral tombava há 43 anos
Quis a Comunidade Económica Dos Estados
da África Ocidental, quis a União Africana, quis a Guiné-Bissau, quis o Partido
Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), quis José Mário Vaz,
quis Alpha Condé, quis a história que a Guiné-Conacri, país irmão e vizinho,
recebesse representantes de cada vez mais radicalizados e intransigentes grupos
políticos guineenses, que se digladiam há já bastante tempo nos fóruns
partidários e institucionais do país, com vistas a tentar reconciliá-los e
formar um governo inclusivo de transição.
É deveras impressionante a rapidez com
que o país trocou Bruxelas por Conacri. Mesa de propostas de desenvolvimento
por mesa de busca pelo apaziguamento político, no exterior, sim, no palácio
presidencial do vizinho ao lado. Apenas se passaram dois anos para que os
desafios do desenvolvimento apresentados à Bruxelas transformassem em desafios
de necessária e urgente concórdia política e partidários desembarcados em
Conacri. Chamava a atenção, ainda nas vésperas da realização da mesa redonda,
em 2015, que os resultados obtidos em Bruxelas poderiam representar projecção
de conflitos políticos e partidários por recursos conseguidos, se não fossem
criadas as condições políticas necessárias, fundamentadas em uma consistente
reconciliação no PAIGC.
Hoje, propiciar uma sólida reconciliação
dos actores políticos em disputa constitui o fulcral desafio da Guiné-Bissau,
tendo despertado a preocupação dos parceiros regionais e globais. Conacri que
permeou alguns momentos da trajectória de Guiné-Bissau enquanto nação e
enquanto Estado em formação, mais uma vez é cenário de um momento importante e
decisivo para o futuro político da Guiné-Bissau, pelo menos a curto e médios
prazos.
Há 43 anos, nesse mesmo solo que acolhe
os desavindos políticos da nossa terra, gotejava o sangue do pai e fundador da
nacionalidade guineense e cabo-verdiana. Pode-se dizer que a covarde morte de
Amílcar naquele fatídico e infortunado 20 de Janeiro de 1973 representava uma
radical mudança nos rumos e nortes que a Guiné-Bissau se propunha a seguir. Com
o orquestrado e precoce tombo, em Conacri, de um dos maiores pan-africanistas e
pensadores do transacto século dilatava-se as chances e abria-se horizontes
para que tivéssemos o PAIGC que hoje temos, o qual desvirtua e deturpa os
objectivos nacionais fundamentados no cabralismo.
Por outro lado, em alguma medida Conacri
representa um baluarte de resistência à perpetuação do colonialismo, um reduto
territorial e político (inclusive do PAIGC) contra o colonialismo e
colonialidade. De lá Cabral e seus camaradas mais próximos pensavam e esboçam
não só as directrizes e dinâmicas que as operações militares deviam tomar com
vistas à emancipação territorial e política do nosso povo. A partir do seu
escritório em Conacri, Abel Djassi também reflectia e desenhava programas do
desenvolvimento e políticas que deveriam orientar a plena e efectiva execução
dos referidos programas no momento pós-independência.
Conacri é um dualismo simbólico, em
alguma medida uma contradição simbólica para a Guiné-Bissau. Fraterna e
solidariamente sediou o PAIGC de Cabral no período anticolonial, mas ali também
tombou Abel Djassi. Será que o país de Ahmed Sékou Touré, hoje representado ao
mais alto nível por Alpha Condé logrará o grande triunfo que passa a
representar a necessária e urgente reconciliação da classe política guineense,
mormente o PAIGC, os chamados 15 e o PRS?
O facto é que o nível de radicalização
das partes em disputa é colossal e se não houver concessões políticas, como não
tem havido até aqui, particularmente no que se refere ao nome do chefe de
eventual novo governo, de Conacri poderá se acrescer frustrações e inquietações
da nossa já inquietada terra, como naquele fatal e trágico 20 de Janeiro, em
vez de servir de um solidário e fraterno terreno que outrora abrigou o PAIGC –
PAIGC de Cabral e dos ex-combatentes da liberdade da pátria.
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