A opção de Jesus por fazer de Cafarnaúm
local de residência e centro de irradiação missionária na Galileia parece
estranha e indicia a novidade que vem anunciar: “Arrependei-vos, porque está
próximo o reino de Deus”. Pressionado pela urgência interior de ir ao encontro
das pessoas e partilhar a grande notícia “Deus vem e já está connosco”,
desloca-se para a terra dos gentios, junto ao lago de Tiberíades, tomando como
indicador claro de ter chegado a hora para a sua decisão a prisão de João
Baptista. Estranha opção para quem faz uma leitura superficial dos factos e não
tem em conta o seu contexto histórico e cultural. Estranha opção para quem
esquece a dimensão simbólica que frequentemente os acompanha e abre a um nova
dimensão.
Mateus, o narrador evangelista, recorre
ao profeta Isaías para apresentar alguns traços de Cafarnaúm e destacar que a
nova situação de Jesus corresponde ao que estava anunciado. Traços centrados no
povo que vivia nas trevas e viu uma grande luz, que jazia na região sombria da
desesperança e levanta o ânimo, voltando a esperar. “A verdadeira realidade de
Cafarnaúm - afirma Florentino Hernandez, autor do «Guia de Terra Santa:
História-Arqueologia-Bíblia» é a de ter sido escolhida por Jesus de Nazaré como
sua segunda pátria e de haver sido o centro do seu ministério apostólico na
Galileia”. Gente pobre, não miserável, vivia do campo que cultivava entre
pedras e na zona marítima, da pesca e do comércio de alguns produtos. Terra
onde se cruzavam rotas de negociantes e peregrinos.
A Galileia dos gentios era uma região
pobre, abandonada e com má fama. Chamar «galileu» a alguém constituía um
insulto, Os seguidores de Jesus antes de serem designados por «cristãos» eram
depreciativamente conhecidos por «galileus» (Actos dos Apóstolos 2, 7). Esta
desconsideração provinha certamente da religião e da política. Religiosamente
não observavam as obrigações do Templo, sendo ignorantes e pecadores.
Politicamente, não aceitavam o jugo de Roma e revoltavam-se. A retaliação era
de morte. Pilatos mandou executar um grupo quando oferecia sacrifícios
religiosos ( Lc 13, 1).
Jesus inicia a sua missão entre os
gentios, desconsiderados e indignados. Nas “periferias” existenciais como gosta
de dizer e de fazer o Papa Francisco O jesuíta italiano Antonio Spadaro,
diretor da revista ‘La Civiltà Cattolica’ e consultor do Conselho Pontifício
para a Cultura (Santa Sé) a propósito da próxima visita de Francisco a Fátima
afirma que “o Papa viaja às periferias, também da Europa. Se repararmos, as
viagens europeias partiram de Lampedusa e seguiram pela Grécia, Turquia,
Bósnia, Polónia, Suécia e depois a Portugal: está a circum-navegar a
Europa”. E explicita o sentido desta opção: “As viagens do Papa servem para
tocar lugares em que há efervescência, onde existem estímulos, que possam
ajudar a compreender melhor o centro e também os lugares onde se vivem feridas
abertas, que se tocam para serem curadas”,
Esta opção pode provocar estranheza, mas
está em consonância com a de Jesus para anunciar e viver o Evangelho de Deus: A
quem sofre e anda insatisfeito, a quem é vítima das trevas da ignorância
religiosa e da opressão cultural e económica, a quem está despojado da
dignidade humana e sujeito à violência “mental” que manipula as notícias e
silencia a verdade, a quem pode despertar as energias adormecidas e reagir
acolhendo a novidade de que “outro mundo é possível”, de que Deus está connosco
e é nosso aliado incondicional. O garante desta convicção é o próprio Jesus, a
luz verdadeira que vindo ao mundo ilumina todo o homem (Jo 1, 9) e dá sentido a
toda a criação.
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