quinta-feira, 29 de novembro de 2018

GUINÉ-BISSAU: GREVES DOS PROFESSORES E FANTASMAS DO PRIMEIRO-MINISTRO

São os professores responsáveis pela planificação e coordenação no sistema do ensino guineense? Qual é a causa da acumulação de dívidas para com os docentes na Guiné-Bissau? Porque os professores são descontados no final de cada greve e os deputados “imunes” depois de três anos sem trabalhar? São mais guineenses que os professores?

Quem é responsável pela existência de professores “fantasmas”? O senhor Primeiro-ministro acredita que as greves são as causas do descalabro do ensino guineense ou são antes de tudo, uma consequência da falência da falhada elite dirigente nacional? O Primeiro-ministro podia explicar a razão pela qual os seus filhos sempre estudaram no estrangeiro, em França, no Senegal e nos Estados Unidos? A procura da qualidade que estaria na base dessa escolha, porque no país de Cabral só reina a banalidade? Qual é a razão de a remuneração do professor e médico guineenses ser uma das piores do mundo enquanto os políticos deste país compram viaturas de 30, 40 e 50 milhões de francos CFA, a custa do erário público?

As repetidas declarações infelizes do Primeiro-ministro, Aristides Gomes, qualificando de selvagens as greves dos sindicatos de professores, constituem um autêntico desnorte da parte de quem se reclama do estatuto do intelectual. O fracasso do sistema educativo guineense é a marca indelével da incapacidade e inércia dos sucessivos dirigentes da Guiné-Bissau que nunca elegeram a educação como prioridade. É aí que reside o fundo da questão. Um país sem prioridades, sem foco na educação, não é surpreendente que dirigentes políticos, de forma populista, inundem o espaço público com diagnósticos vazios e avaliações levianas, a semelhança das recentes tentativas do actual chefe do governo em querer imputar a responsabilidade do falhanço no sector do ensino às greves de professores.
Aristides Gomes (Canchungo, de etnia manjaca, 8 de Novembro de 1954) é um político da Guiné-Bissau, alto dirigente do PAIGC, foi primeiro-ministro de seu país de 2 de Novembro de 2005 a 13 de Abril de 2007 e novamente desde 16 de Abril de 2018.

Aristides Gomes é licenciado em Sociologia na Universidade de Paris VIII. Foi director-geral da Televisão Experimental da Guiné-Bissau (1990-1992) e ministro do Planeamento e Cooperação Internacional durante o governo de João Bernardo Vieira-Nino. 

Ao invés de humildemente promover um diálogo sério sobre a possibilidade de se encontrar uma solução mínima e parcial ao crónico quadro educativo, tendo em conta a conjuntura, o chefe do executivo preferiu a lógica de extremismo e diabolização para com a classe professoral. Aliás, já havia qualificado de selvagens as reivindicações da União Nacional dos Trabalhadores da Guiné (UNTG) antes de compreender que tinha colocado o pé na lama e começar um diálogo sério.

Infelizmente, continua a repetir os erros de palmatória a semelhança do anterior ministro do Comércio, Victor Mandinga, que num acto de demagogia e propaganda política, quis carregar o pesado fardo de anarquia do sistema educativo aos professores, ao ponto de os chamar de incompetentes, advogando a sua substituição por estrangeiros. Caricato, senão uma aberração sintomática!

Quem define a visão e a política para o sector educativo, se é que existe realmente! São os professores responsáveis pela planificação e coordenação no sistema do ensino guineense? Qual é a causa da acumulação de dívidas para com os docentes na Guiné-Bissau? Porque os professores são descontados no final de cada greve e os deputados “imunes” depois de três anos sem trabalhar? São mais guineenses que os professores?

Quem é responsável pela existência de professores “fantasmas”? O senhor Primeiro-ministro acredita que as greves são as causas do descalabro do ensino guineense ou são antes de tudo, uma consequência da falência da falhada elite dirigente nacional? O Primeiro-ministro podia explicar a razão pela qual os seus filhos sempre estudaram no estrangeiro, em França, no Senegal e nos Estados Unidos? A procura da qualidade que estaria na base dessa escolha, porque no país de Cabral só reina a banalidade? Qual é a razão de a remuneração do professor e médico guineenses ser uma das piores do mundo enquanto os políticos deste país compram viaturas de 30, 40 e 50 milhões de francos CFA, a custa do erário público?

Sem excluir totalmente a responsabilidade dos professores no presente quadro sombrio do ensino nacional que, em diferentes ocasiões, são penetrados e influenciados pelas agendas politiqueiras visando interesses obscuros. Este é um fato. Mas também indissociável está a infeliz estratégia mais profunda do político guineense em manter o professor na dependência e através disso vedar os cidadãos de terem acesso aos conhecimentos e serem donos do seu destino. É o que justifica igualmente a permanência do fenómeno de “bolsas” para estrangeiro ao invés de um investimento robusto sério localmente através de construção de infra-estruturas modernas (universidade pública de raiz, escolas politécnicas e academias de excelência).

Neste desgraçado sistema, só teria acesso ao ensino de qualidade os filhos dos que roubam ao Estado. A igualdade de oportunidades não passa de um simples slogan eleitoralista visando a enganar aos menos atentos e aos adormecidos da miséria imposta.

A crónica situação actual da educação, resultado de desgoverno em detrimento do amadorismo, precisa de um remédio que necessariamente passará pela ruptura com o actual paradigma de indiferença, ausência de visão e de prioridades. Essa mudança de direcção só será possível quando a liderança política for encarnada por pessoas que atribuem à educação o seu justo valor, de instrumento transformador da sociedade. Com Odemocrata

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