Dr.ª Carmelita Maria Barbosa Rodrigues Pires, é uma política, jurista e advogada Bissau-guineense…Presidente da Organização das Mulheres do Partido da Renovação Social (PRS). É uma destacada ativista feminista, empenhada na luta pela igualdade de género na sociedade guineense.
Nas
reuniões da plenária da CNE realizadas durante a 1.ª e 2.ª volta das
presidenciais, adotou-se como procedimento
e ponto 1 da ordem dos trabalhos a leitura, a submissão e assinatura da acta da
reunião precedente. Assim se trabalhou. Depois das eleições da 2.ª volta,
realizadas no passado dia 29 de Dezembro, a plenária reuniu-se no dia 1 de
janeiro, convocada para a apreciação, deliberação e posterior divulgação dos
resultados provisórios.
Para análise e comparação com os dados que as
candidaturas detinham foram distribuídas as Actas dos resultados parciais de
votação em cada uma das Regiões, bem como o mapa de resultados nacionais
provisórios, este obtido do apuramento regional e integrante da Projeção de
votos por Região e Nacional. Nesta reunião, nenhum dos presentes reclamou de
alguma irregularidade desses documentos. Porém, a representante do Candidato
posteriormente Reclamante referiu que houvera problemas na votação e que a
Polícia Judiciária estaria ao corrente, solicitando o adiamento da divulgação
dos resultados provisórios. Pediu-se-lhe prova documental, ou testemunhal ou
outra qualquer que se pudesse apreciar. Não apresentou. Depois de uma aturada discussão
e prolongamento da reunião plenária, esclareceu-se-lhe sobre o cumprimento de
prazos na divulgação dos resultados e deu-se-lhe conhecimento da inexistência
de quaisquer reclamações, protestos ou contraprotestos feitos em conformidade
com a lei. Durante e concluída a reunião, ninguém, nem a representante do
Candidato posteriormente Reclamante, tão pouco o representante do Governo, que havia
corroborado na tese do adiamento da
apresentação dos resultados provisórios, solicitou que o conteúdo da reunião
fosse imediatamente revertido em acta e esta assinada. Ou seja, que se alterasse
o habitual procedimento. Tanto que, estava o coletivo atrasado em relação à
hora marcada para a divulgação dos resultados provisórios e todos cientes do
que tinha sido tratado na reunião. Apressada e atrasada, a CNE compareceu ao Acto Público de apresentação dos
resultados provisórios da 2.ª volta das presidenciais, presidido pelo seu
Presidente, na presença da Comunidade e Observadores das Eleições
Internacionais, como de todos que se fizeram presentes. Neste Acto, igualmente ninguém
solicitou Acta de apuramento nacional, assinada. Afinal eram os provisórios e a
Acta era explanada em apresentação pública.
Dois dias depois, ao arrepio
da disposição imperativa da Lei Eleitoral (LE), que condiciona o objeto do recurso contencioso ao
plenário do Supremo Tribunal da Justiça às decisões proferidas pela CNE sobre
as reclamações, protestos ou contra protestos (art.º 142.ª), enquanto instância
recorrível e sempre que esteja esgotada a possibilidade de reclamar ou recorrer
para entidades administrativas com competência própria na matéria, foi
interposto recurso pelo Candidato que perdera o pleito eleitoral, com fundamento em irregularidades e pedindo
ao STJ a recontagem dos votos. Naturalmente que o STJ, que controla, em última
instância, a legalidade dos atos do processo eleitoral, por “inobservância de prescrição legal
imperativa”, nem sequer conheceu o mérito
da causa (exceção dilatória). Assim como, resolvendo todas as questões
submetidas à sua apreciação (art.º 660.º/2 do CPC), o STJ mais decidiu:
indeferiu o incidente de suspensão da instância por fraude eleitoral; não deu
provimento a providência cautelar, considerando-a expediente dilatório;
indeferiu o incidente de suspeição de Juiz Conselheiro do STJ; e não considerou
sequer a queixa-crime interposta contra o Presidente da CNE. Pois, ficou
evidente que, se mais se pudesse, mais se inventaria.
Todavia, na sua decisão, a título oficioso, o STJ ainda encerra
a ação interposta junto a si com uma interpelação à CNE para observar as
exigências constantes no art.º 95.º da LE, como seja o envio de um exemplar da
Acta do apuramento nacional aos órgãos de soberania, aos partidos políticos ou
coligações de partidos concorrentes.
O STJ decidiu e está decidido, definitivamente (art.º 147.º da
LE).
Interessantemente, para quem
tenha seguido todo este processo eleitoral com alguma ironia, designadamente a 2.ª
volta, o convite do STJ foi imediatamente revertido em cavalo de batalha pelo
Reclamante dos resultados provisórios. O assunto passa à ordem do dia e a Acta
de apuramento dos resultados nacionais passa a ser ausência de operações do
apuramento nacional, preterição de uma formalidade e a falta de pressuposto
essencial. No fundo, a Acta é agora uma abébia e, necessariamente, o caminho
trilhado para já não se aceitar a própria Acta, de maneira a não se aceitar os
resultados divulgados. Algo que, nem o STJ poderia prever. Pois, sabe-se que a
falta de pressuposto processual essencial são aquelas exigências legais sem cujo atendimento o processo, como
relação jurídica, não se estabelece ou não se desenvolve validamente; e que, em
consequência, não atinge a sentença que deveria apreciar o mérito da causa.
A Acta foi investida em tábua
de salvação, e à sua celebridade acresceu um ataque acérrimo à CNE e à
reputação dos seus membros. A CNE foi posta de rastos, não escapando a
acusações de questionamento, tais como: omissão tão brutal, de tão primária?
Falta de profissionalismo? Incúria? Atitude deliberada? Incompetência? Coerção?
Irresponsabilidade? Má-fé? Como se todos não soubéssemos que estes adjetivos
estariam melhor se reportados ao recenseamento
eleitoral que esteve na base desta tripla eleição. O pior da história democrática
guineense, feito na total incúria e amadorismo jamais responsabilizado, para
que a culpa, como sempre, morresse sozinha.
É caso para hoje também se
questionar se terá sido deliberado a omissão do pedido da Acta e sua assinatura?
E se fosse o contrário? E se o reclamante tivesse ganho? E se houvesse boa-fé?
Mas afinal o que é uma acta
de apuramento de resultados nacionais? É onde se limita a somar as parcelas das
dez CREs. São burocracias, um pró-forma, que em nada podem alterar o resultado.
As actas das mesas fazem fé, mormente quando não existem reclamações, protestos
ou contra protestos. Ademais, a verificação e confrontação do
apuramento geral de todos os resultados da votação das assembleias de voto que
constituem o círculo é feita com a obrigatoriedade da presença de delegados das
listas, sob supervisão dos presidentes das mesas e da fiscalização dos
delegados do Ministério Publico (art.º 83.º al. c) da LE).
Um mero convite para
suprimento de irregularidade transformou-se num incidente para agora se tomar a
nuvem por Juno, sabendo-se que esse convite não pode ter impacto ao nível dos
resultados e, muito menos invalidar um processo eleitoral. Por isso, o
Reclamante, cautelosamente, não pede a aclaração
do Acórdão.
Por decisão do STJ, a CNE só
tem que elaborar a bendita Acta, assinando-a, formalizando o atraso, atribuindo
ao "acto público" igual valor, e anunciar e publicar os resultados
eleitorais definitivos. A vontade do
Povo é soberana!
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