sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

Ide contar a João, o que vedes e ouvis


“Deus está aí. Discreto, mas solícito. Silencioso, mas interveniente. “Ferido”, mas sanador. Peregrino e companheiro no tempo, mas “dono” da casa de família onde acolhe, em alegre festim, todos os que souberam caminhar com Ele e aceitar o ritmo do seu amor.”

Assim começa a resposta que Jesus dá aos enviados de João. “Ide contar o que vedes e ouvis”. Mt 11, 2-11. João estava na cadeia, onde chegam notícias contrastantes com o que havia anunciado na sua missão profética. E tem dúvidas, como é normal. Quer esclarecer e procurar a verdade. Não deixa que a cadeia lhe aprisione o espírito nem limite a liberdade. Para ele, como para qualquer pessoa, viver na dúvida é uma espécie de prisão que limita a razão e amarra o coração. Não deixa adormecer a pergunta inquietante nem se inibe face ao preconceito que mina a confiança. Fiel a si mesmo, honesto e decidido, quer saber e encarrega os seus discípulos de buscarem a resposta desejada. Que belo exemplo nos dá e apelo nos faz para sermos peregrinos da verdade!

João anuncia o reino prestes a chegar e urge a conversão com palavras duras, metáforas de amedrontar as “raças de víboras”, invectivas fortes aos palradores que “dizem e não fazem”, ameaças terríveis de castigos iminentes, apelos gritantes ao arrependimento e à correspondente mudança de atitudes. O “juízo de Deus” vai iniciar-se. O contraste é claro, como veremos a seguir.

O estilo de Jesus surge como resposta velada à pergunta preocupada de João. Acolhe os cegos e abre-lhes os olhos. Aproxima-se dos coxos e restitui-lhes a liberdade de movimentos. Escuta a súplica dos leprosos e estes ficam limpos da doença que marginaliza e rói a dignidade humana. Toca os ouvidos dos surdos e estes abrem-se à realidade nova da escuta que relaciona e insere no vasto horizonte comunicacional. Visita as famílias com defuntos, reza por eles e ordena-lhes que regressem à vida terrena, ao convívio dos seus. Que desafio nos lança o estilo de Jesus!

“O argumento chave que Jesus dá, a prova que ele aporta, não é de carácter sagrado, nem espiritual, nem sobrenatural, nem religioso, afirma J. M. Castillo. É algo humano, muito humano: aliviar penas, dar vida, felicidade e boas notícias”. E o teólogo espanhol prossegue: “Não nos entra na cabeça que a solução não está nos discursos, nos argumentos, nas teorias e nos dogmas. Só a vida é digna de fé, como só o amor merece ser crido”.

João quer saber quem é Jesus e manda fazer-lhe uma pergunta. “És tu o que está para vir ou temos que esperar outro?” Jesus não responde sim ou não. Mas apresenta as obras que faz como suas credenciais. Só estas tornam credível uma pessoa. Não são as declarações, mas os factos, o estilo de vida, a preocupação pelos outros, o cuidado da natureza e seu equilíbrio saudável.

O contraste é flagrante e desconcertante: João ameaça com a ira divina, com castigos inclementes; Jesus liberta de medos, cura as feridas da vida, estende as mãos benfazejas aos desconsiderados social e religiosamente. Este seu proceder desvenda um rosto diferente de Deus e da sua relação connosco. Quem não se sente atraído pelo amor que Deus nos tem e, espontaneamente, deseja corresponder-lhe?

A novidade de Jesus não anula a missão de João, mas re-situa-a no evoluir histórico do projecto de Deus. É um projecto em dinamismo crescente de realização. João correspondeu a uma etapa e, nela, é o maior dos humanos. Ele é mensageiro que prepara, voz que anuncia, pregoeiro que vai à frente, profeta de tempos novos que se avizinham. Cumprida a sua missão, cessa funções. A promessa faz-se realidade: O anunciado chegou e a palavra tem nome.

Deus está aí. Discreto, mas solícito. Silencioso, mas interveniente. “Ferido”, mas sanador. Peregrino e companheiro no tempo, mas “dono” da casa de família onde acolhe, em alegre festim, todos os que souberam caminhar com Ele e aceitar o ritmo do seu amor.

Com o Papa Francisco, podemos começar a contemplar esta realidade maravilhosa na gruta de Belém no Natal de Jesus. Diz-nos Ele: “O Presépio é como um Evangelho vivo que transvasa das páginas da Sagrada Escritura. Ao mesmo tempo que contemplamos a representação do Natal, somos convidados a colocarmo-nos espiritualmente a caminho, atraídos pela humildade daquele que se fez homem, a fim de se encontrar com todo o homem, e a descobrirmos que nos ama tanto, que se uniu a nós para podermos, também nós, unirmo-nos a Ele.”

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