Viriato Rodrigues Pã,
vítima do "Caso 17 de Outubro" de má memória ocorrido (1985/86) na
Guiné Bissau
Era um Balanta, duro consigo próprio e com os que ele trabalhava. Pontualíssimo, rigoroso em tudo o que fazia profissionalmente, exigente na qualidade, brusco nos protestos por erros, intolerante com mediocridade, a vaidade enfatuada, a mentira, a desonestidade. Era um procurador da república da Guiné-Bissau disciplinador sem emoções aparentes e sem dar confiança a ninguém de “baixo”.Respeitador e respeitado; delicado e cortês; grave, quase distante; um riso comedido, quase tímido; de olhar franco e directo - Dr. Viriato Rodrigues Pã era fundamentalmente um homem bom. Gostava de ajudar o seu semelhante e sofria com os que sofrem. Trajava com aprumo, mas com modéstia, pois procurava mais impor-se pela positiva do que fazendo apelo a vulgaridade mundana. Ordenado, disciplinado e metódico, Viriato não tolerava desconsiderações, sendo capaz de uma reacção imediata e convincente. Sem favor, era um perfeito “Gentleman”, conduta que, durante os seus cinco anos de vivência na Guiné-Bissau, lhe granjeou fama e prestigio entre o povo e a classe intelectualizada.Procurador-Geral da República da Guiné-Bissau, Integro, estudioso arguto, homem do estado responsável, cidadão exemplar, Dr. Viriato Rodrigues Pã, príncipe da cidadania do seu tempo, bem pode ser apresentado as novas gerações de cidadãos guineenses e dirigentes como um modelo a conhecer e respeitar.Foi morto por Nino Vieira, em Julho de 1986
No dia 17 de Janeiro de 1947 em
Quinhaque, pequena aldeia dos arredores de Bissorã, na então Colonia Portuguesa
da Guiné, viu a luz do dia, uma criança do sexo masculino que, meses depois,
viria a receber o nome de Clabús. Entre os Balantas é costume atribuir-se nome
às crianças apenas alguns meses após o nascimento.
Era o primeiro filho de N’hona Siga e
quando nasceu, o marido, Infoy Pã, encontrava-se preso num calabouço colonial
em Bissorã.
Dai o nome de Calabús, tradução em
língua balanta do vocábulo português “calabouço”.
Situada no Centro Norte do território, a
região de Bissorã, pelas suas condições climáticas, era uma zona de cultivo da
mancarra (amendoim), tomate, arroz e mandioca, produtos que movimentava a quase
totalidade dos habitantes da área. Como é normal nas sociedades tradicionais,
os filhos são uma garantia para a continuidade, no futuro, das actividades
agrícolas e, no presente, força que permite manter e ampliar os recursos
familiares. Possuir uma prole numerosa significativa uma bênção de Deus e foi
nesta óptica que Infoy Pã encarou o nascimento de mais oito filhos, seis
rapazes e duas raparigas.
Além da estima pelos valores
tradicionais e respeito pelos mais idosos, a educação básica de então visava a
robustez e resistência físicas, preparando o jovem para as inúmeras
dificuldades da vida. As árduas tarefas do campo e das bolanhas (terrenos
baixos e alagadiços próprios para o cultivo do arroz na Guiné-Bissau) eram
também acauteladas nessas zonas predominantemente agrícolas.
(…)
Viriato
Pã Ingressa na Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa
Viriato Ingressa, no ano lectivo de
1969/70, na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, onde se inscreve
aos 06/10/1969.
Desde logo, procura impor-se
intelectualmente, habito que criara desde a educação primária, graças à solida
formação de base que trazia do colégio e completara em Lisboa.
Nesta altura já não era um simples
estudante: era um jovem que sentia necessidade de se posicionar, quer perante o
regime de então, quer perante os seus professores.
A coerência e a audácia de que dava
mostras e que sempre o haviam de acompanhar pela vida fora, retiram-lhe
qualquer hipótese de disfarçar a sua posição. O seu embate psicológico e ideológico
com alguns dos seus professores, que mais se identificavam com o regime, tinha
de se manifestar. Em relação a esses, assumia uma atitude de reserva e de
distanciamento.
(…)
O
perfil sociopolítico do Dr. Viriato
Talvez a faceta mais saliente da
personalidade do Dr. Viriato Rodrigues Pã fosse a sua solícita dedicação a família,
tanto aquela donde originalmente proveio como a que ele próprio constitui. Dele
pode dizer-se, no mais clássico sentido da expressão, que foi um verdadeiro bom
pai de família.
Parece exacto inferir que a intensidade
com que se entregava ao estudo das causas forenses que lhe vinham parar às mãos
era por ele integralmente transferida para a família. A sua devoção à família manifestava-se
nas mais pequenas atenções.
A sua vida em família era o reflexo da
sua vida pública, social e profissional.
O Dr. Edmundo Mateus, um conhecido
advogado angolano em lisboa, dedicado amigo do Dr. Viriato Rodrigues Pã,
dizia-lhe frequentemente, numa clara alusão à sua capacidade em fazer amigos: “as
vezes, penso que deveria ser diplomata em vez de advogado. Quando queres um
carpinteiro, tens; se precisas de um médico, tens um amigo à disposição; se
pretendes um sapateiro, há sempre um pronto a prestar-te o saber do seu ofício.
Admira-me a tua capacidade em fazer amigos.”
Respeitador e respeitado; delicado e
cortês; grave, quase distante; um riso comedido, quase tímido; de olhar franco
e directo - Dr. Viriato Rodrigues Pã era fundamentalmente um homem bom. Gostava
de ajudar o seu semelhante e sofria com os que sofrem. Trajava com aprumo, mas
com modéstia, pois procurava mais impor-se pela positiva do que fazendo apelo a
vulgaridade mundana. Ordenado, disciplinado e metódico, Viriato não tolerava
desconsiderações, sendo capaz de uma reacção imediata e convincente. Sem favor,
era um perfeito “Gentleman”, conduta que, durante os seus cinco anos de vivência
na Guiné-Bissau, lhe granjeou fama e prestigio entre o povo e a classe intelectualizada.
Tolerante por princípio, não acreditava
que divergências ideológicas pudessem levar os Guineenses a tornarem-se tão
inimigos uns dos outros ao ponto de se negarem mutuamente a identidade
nacional.
Apesar da sua clara posição face ao
projecto da unidade política da Guiné-Bissau com cabo verde, vector principal
da política do regime de Luís Cabral, Viriato, não obstante, nunca se furtava
ao diálogo com elementos afecto ao PAIGC que pretendessem falar-lhe.
O secretário da Embaixada, Maximiano Sá,
contactou-o, uma vez, em 1976, para ele falar. Com o maior à-vontade, Viriato
aceitou recebê-lo, convidando-o para um almoço em sua casa. As relações de proximidade
entre ambos chegaram a ser tão estreitas que Maximiano, um dia, lhe pediu que
lhe apresentasse os elementos do afamado grupo Roque Gameiro, núcleo oposicionista
de alguns estudantes em Portugal, adversários da unidade Guiné-Bissau e Cabo Verde.
Toda a Lisboa sabia que Maximiano era o
homem da segurança da Embaixada, naqueles difíceis anos que se seguiram à independência,
em que o silêncio era a melhor companhia da prudência.
Nacionalista convicto, Viriato Pã
aceitava por igual os seus compatriotas e não tinha reserva mental contra ninguém,
nem dos próprios inimigos, unilateralmente declarados. Fazer política para ele
era, talvez devido à sua profunda e solida educação humanista, uma forma de
ajudar o próximo.
Tratando-se de um guineense, Viriato R.
Pã nunca se preocupou com o facto de Maximiano poder estar ou não a
desempenhar, sem escrúpulos, o seu papel de agente do regime. Dissuadindo a
esposa dos seus receios, céptica quanto às reais intenções do secretário da
embaixada, Viriato, honrado a sua amizade por Maximiano, avançou com o almoço,
que consistiu num elaborado prato típico da Guiné-Bissau: Caldo de mancarra.
In, Viriato Pã, uma vida pela
pátria
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