segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Verdade foi dita pelo Victor Gomes Pereira



Portugal já começou a materializar o seu instrumento de chantagem contra a Guiné-Bissau, através da recusa de vistos de entrada em seu território aos atuais governantes guineenses. A antiga potência colonizadora, ao utilizar dois pesos e duas medidas, esquece-se do razoável interesse que ainda representa o empresariado português residente no País, que aliás, recentemente já manifestou publicamente no Palácio do Governo, o seu repúdio e distanciamento da visão facciosa do seu governo na insistência em apoiar a solução belicista para a crise guineense. Certamente, não teriam o mesmo tratamento se os mesmos fossem residentes em Angola.

A direita trauliteira portuguesa, encarnada na pessoa do seu Ministro dos Negócios Estrangeiros, por certo ou por lapso, ou melhor, convenientemente, também deve-se ter esquecido de um dos axiomas do velho Salazar, seu mentor e ditador, que “reinou” em Portugal durante 4 décadas, e que rezava o seguinte: “O Estadista é aquele que está”, numa alusão galhofeira e discordante à obstinação de Moisés Tschombé, que na época, ainda se julgava Primeiro-Ministro do ex-Congo Belga. O paralelismo é por demais evidente, para um bom entendedor.

A descolonização mental e cultural da nossa rapaziada saudosista tarda em chegar, apesar dos quase quarenta anos passados. Daí alguma fertilidade encontrada pela ultradireita septuagenária lusa, que ainda monopoliza importantes centros de decisão em Portugal, para a disseminação do seu proselitismo neocolonialista. As chagas da derrota militar e a consequente perda do império colonial, ainda estão por sarar, e o desejo de vingança fala mais alto. E não tenhamos dúvidas, de que o mesmo desejo, só se satisfará, no dia em que a intolerável e arrogante independência guineense for completamente vergada através da destabilização permanente das nossas instituições.

O que acontecerá se o permitirmos. Essa veleidade, aliás, já se encontrava escamoteada na nova indumentária da cooperação lusa com a cumplicidade dos peões domésticos, não fosse o aguçado instinto guerrilheiro das nossas forças armadas, neutralizá-la a tempo e horas.

Até já tínhamos o pessoal do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras português a controlar as saídas e entradas das nossas fronteiras aeroportuárias. Também por isso não admira que durante esse período nunca tenha sido feita qualquer apreensão de estupefacientes.

Pelos vistos, o Paulinho das Portas, ou melhor, das Feiras, e algumas empedernidas mentes da extrema-direita portuguesa, assimilaram na perfeição a lição do histriónico general Kaúlza de Arriaga, que ludibriou Marcelo Caetano depois da operação “Nó Górdio”, afirmando-lhe que vencera a guerrilha da Frelimo com uma caixa de fósforos. O tal general, falcão da direita militar, que nas suas célebres lições de estratégia fazia com ardor a apologia da tese de que a massa cinzenta humana diminuía de capacidade em termos de coeficiente de inteligência conforme a sua proveniência se aproximasse da linha do Equador.

E na mesma linha, pretendendo passar um atestado de menoridade mental aos dirigentes dos chamados PALOP, o senhor Silva, candidato a Presidente, e atual inquilino de Palácio de Belém, impante, havia afirmado que os mesmos, a chegarem à fala com a União Europeia deveriam antes falar com Portugal.

Mas que pretensão à portuguesa. O país da sopa do Sidónio, hoje vulgarmente conhecido pelo país da “sopa dos pobres”, que beneficia 400.000 almas, metade da população da Guiné-Bissau, com veleidades de se arvorar em porta-voz dos PALOP, donde foram corridos a toque de caixa.


Por estas e por outras, se pode descortinar, que para estes senhores, cujas cabeças ainda se encontram localizadas no antigamente, tamanha façanha emancipacionista, não era admissível para pretos vassalos do seu império.

Portanto, para a Guiné, tinha-se de arranjar uma solução radical. Com o guião escrevinhado, o casting de atores feito, a legitimação pelo nosso Supremo Tribunal de Justiça da fantochada do Procônsul selecionado a dedo, só faltava levar à cena a última parte da peça, que era a coroação desse peão e déspota de serviço, a Presidente da República, para que se consumassem os verdadeiros, mas inconfessos intentos.

A forma como foi montada toda esta tramoia, com a gritante cumplicidade da comunidade internacional aqui residente, até metia dó, mas nem por isso, embora sem sucesso, deixou de ser denunciada ao longo do tempo pela oposição democrática. Mas o mais estranho nisto tudo, foi a intervenção de reputados constitucionalistas portugueses a debitarem pareceres encomendados pelo regime, que endossavam a estranha legitimidade de um Primeiro-Ministro, poder candidatar-se a Presidente da República, ainda que constitucionalmente não fosse possível destituí-lo e nem nomeá-lo, por um Presidente interino, como era o caso. Não é pois de admirar o contentamento mal disfarçado da classe política portuguesa face à instabilidade política fomentada e cavada que se vive na Guiné-Bissau.

Se recuarmos no tempo, é fácil constatar que as investidas de Paulo Portas, qual epígono dos velhos do Restelo, têm o seu entroncamento, na oposição, ou reviralho, conforme lhe queiram chamar, ao regime salazarista, o qual, sempre pugnou e preconizou aos quatro ventos a manutenção à custa de sangue do património ultramarino português. Que o digam os históricos resistentes Cunha Leal, Norton de matos, o Calígula de Angola, Ramada Curto, Azevedo Gomes, entre outros.

Ao dizermos isto, as pessoas podem ficar com a ideia de que nós somos inimigos de Portugal. Nós não somos inimigos de Portugal. Não nutrimos ódio contra nenhum país, e nem contra nenhum povo. Porém, já é tempo desta direita nostálgica, hoje emblemadas em Paulo Portas e a ala direita do PS português, se compenetrarem da seguinte realidade:

Que nós não toleraremos a menor ingerência de Portugal nos assuntos internos da Guiné-Bissau.
E que o governante português pare de justificar a sua correria internacional, como o fez agora em Cabo Verde com o pretexto de ajudar a Guiné-Bissau a não se transformar num Estado falhado. A verdade é que, com a ajuda de Portugal e dos seus acólitos, o nosso país esteve à beira de se transformar num Estado terrorista.

Somos um povo acolhedor, e lhano no trato, e à guisa de exemplo mais recente podemos citar o caso do Comandante Alpoim Calvão, um alto oficial da Armada portuguesa, que defendeu de armas na mão a presença e a manutenção de Portugal em terras guineenses. Mesmo assim, transcorridos alguns anos depois da Guiné liberta, ele despido de qualquer rancor e ódio instalou-se no nosso país como empresário no sector da transformação, onde desenvolve um trabalho meritório empregando centenas de trabalhadores.

Está cá entre nós. Perguntem-lhe se alguma vez, terá sido vítima de ataques ou hostilidades? Que eu saiba, até os homens contra os quais se bateu, tratam-no com respeito. Alguma vez terá havido interesse guineense na política interna de Portugal? Nunca! É caso para dizer que enquanto Portugal se põe de cócoras perante Angola, arma-se ao pingarelho em relação à Guiné-Bissau.

Pedimos ao senhor Paulo Portas que a despeito da errática política externa portuguesa, perdoe-me a ingerência, que se mantenha de pedra e cal no seu desígnio visando o isolamento da Guiné-Bissau na cena internacional.

Mas que com o rodar do tempo, e quando os ventos começarem a soprar a favor das novas autoridades guineenses nos areópagos internacionais, ele, que à boa maneira do chico-esperto português, que se mantenha dentro de portas, e que não venha a dar uma de “Maria-vai-com-as-outras”.

Até podia aproveitar a grande lição de realismo político que a França – um dos donos da União Europeia - vai dar na próxima cimeira da Francofonia a ter lugar em Kinshasa no próximo mês. O Presidente François Hollande, num grande exemplo de solidariedade e de honestidade política, já fez saber que se deslocará à República Democrática do Congo, para discutir com todos os atores políticos locais, a despeito das graves falhas verificadas no capítulo dos direitos humanos, e numas eleições gerais recentemente realizadas, e que ficaram aquém das boas práticas exigidas pelas normas internacionais, por parte das atuais autoridades.

O escorraçado “Carlitismo”, ou “Cadoguismo”, se é que o regime deposto seja digno de alguma denominação, caracterizava-se, essencialmente, pela brutalidade dos assassinatos de figuras políticas incómodas, passando pela campanha de intimidação, espancamentos, e a promoção de uma rede de compadrio e clientelismo políticos, até à forma displicente e pouco profissional, com que alguma imprensa apoiava as suas teses.

E ainda a propósito dos crimes de sangue ocorridos durante este fatídico mandato, e diga-se o que se disser, da responsabilidade política sobre os mesmos, ninguém consegue ilibar o atual Presidente do PAIGC. Ninguém em seu perfeito juízo conseguirá descortinar outra pessoa, com esta agenda de matanças, que não o Carlos Gomes Júnior, porque, Infelizmente ou felizmente, ele era o único beneficiário de tais atrocidades. O que não se deve desdenhar à luz das promíscuas ligações que o expulso Primeiro-ministro mantinha com a malta dos Serviços de Informação Estratégica e de Defesa de Portugal nas pessoas do Coronel Manuel Esperança e de Elísio Figueiredo, conhecido nos círculos do poder em Luanda, pelo cognome de general Matubeira.

Imagine-se os gigantescos e fastidiosos tempos de antena que eram atribuídos pela RDP, RTP, e até a própria TGB, a uma simples oferta de computadores, quais migalhas da cooperação lusa, para não falar da afronta à soberania que ainda constitui a presença desse veículo de propaganda português no nosso País. Se quisermos continuar a ter uma transição política pacífica, não podemos continuar a albergar aqui a RTP, a fazer o papel de uma agência de contrainformações, e de propaganda ao serviço de Portugal com o único objetivo de destabilização do nosso país.

Todo este pano de fundo constituía sintomas evidentes de que algo de muito mau se estava a passar, mas que servia na perfeição os planos de consolidação de um regime ditatorial apoiado por alguns sectores políticos de Lisboa, Luanda e Praia. Sem esquecermos dos atos criminosos do Primeiro-Ministro deposto quando fazia negócios consigo próprio, solicitando empréstimos avultados ao banco onde é acionista, com juros proibitivos para pagar salários que eram a grande bandeira do seu regime. Assim, toda a gente paga salários. Afinal governar assim era fácil.

E a escandaleira do branqueamento fiscal que envolvia empresas locais com interesses portugueses tutelados e protegidos pelo ex-Primeiro-ministro. Só uma delas, e ainda com dados por apurar, já só leva de crédito aduaneiro mal parado a módica quantia de 8 Milhões de dólares.

Com valores destes, conseguidos à margem da lei, é fácil financiar e ganhar eleições, e ainda arranjar trocados para financiar o terrorismo de Estado que se praticava. Com este infindável regabofe, é fácil perceber que não seria tão cedo que o país deixaria a mania de pedinchar a caridade internacional para nos pagar isto e aquilo.

E por isso, havia que arranjar um bode expiatório, que se consubstanciava na ideia que o PAIGC de Carlos Gomes Júnior e dos seus patrões andavam, e ainda andam a vender: a falsa ideia de que o único foco de instabilidade, o único entrave à estabilidade na Guiné-Bissau, são os Balantas nas forças armadas. Portanto, na cabeça deles, a única e verdadeira filosofia que encerra a reforma das forças de defesa e de segurança, é correr com essa famigerada etnia dos quartéis.

A perigosa campanha de diabolização dos Balantas levada a cabo por Carlos Gomes Júnior, é tanto mais verdade, que até os professores angolanos foram de tal modo enganados, que já andavam a questionar a origem étnica dos nossos militares em formação nas academias em Angola. Esta seleção étnica atingiu raias inaceitáveis, de tal modo, que ainda antes do golpe de Estado, a receção de mais oficiais formandos ficou adiada sine die.

Sem comentários :

Enviar um comentário


COMENTÁRIOS
Atenção: este é um espaço público e moderado. Não forneça os seus dados pessoais (como telefone ou morada) nem utilize linguagem imprópria.