domingo, 30 de dezembro de 2012

Obama e sua busca pela identidade racial, um caminho a seguir pelo povo Brassa e, pelo guineense em geral.



Na Indonésia, Obama era considerado muito negro. No Havaí, um mestiço. Em Los Angeles, multicultural. Em Nova Iorque, se transformou num homem invisível, mais um na multidão. E finalmente, em Chicago, ele encontrou sua identidade negra. Na biografia “Barack Obama: a história” (em tradução livre para o português), o autor David Maraniss descreve a jornada de autoconhecimento cultural do presidente americano, uma trajetória marcada pelo sentimento de deslocamento e pela solidão.
Com apenas 6 anos, Obama se sentiu pela primeira vez como um estranho no ninho, um sentimento que se tornaria recorrente durante sua infância e adolescência. De acordo com a biografia do presidente, cujo primeiro capítulo foi publicado no “Washington Post”, Barry, como era chamado, era o único aluno da sala de uma escola em Jacarta que não sabia falar a língua local e precisava se comunicar com as outras crianças por mímica. Usava meias e sapatos, calças compridas, enquanto os colegas iam geralmente de shorts e chinelos. Durante um ano, a professora foi a única compreendê-lo na classe. Naquela época, sua cor de pele não chegou a ser um problema, já que a turma era bastante heterogênea, mas ela intrigava a todos.
— Sua mãe se apresentou como uma estrangeira, chegada do Havaí. Ela apontou para Barry e disse: “Este é meu filho” — contou a professora Israela Pareira. — Nós, eu e os alunos que os víamos pela primeira vez, ficamos nos perguntando: “Como a pele de sua mãe é clara enquanto a do filho é mais escura?”
Filho de uma americana com um queniano, seu pai naquela época já havia abandonado a família e voltado para o Quênia. Para os colegas de turma, a mãe, Ann, era mais exótica do que Barry.
Após quatro anos na Indonésia, Obama regressou ao Havaí. Apesar de ter nascido na ilha, ele também teve dificuldades para se adaptar ao local. Os havaianos costumavam ter uma postura hostil com aos americanos da parte continental dos EUA. Obama não podia ser claramente encaixado numa categoria: esse menino hapa (meio a meio) vivia com parentes brancos, havia acabado de voltar da Indonésia, era metade africana numa terra em que havia poucos negros. Para ajudar ao neto, seu avô inventou que Barry era descendente de uma antiga realeza havaiana. Mas alguns de seus colegas de turma lembram de uma história diferente: o rapaz dizia ser filho de um príncipe indonésio.
Em Los Angeles, negritude de Obama é questionada pela 1ª vez
Após se formar no colégio no Havaí, Obama foi para Los Angeles. Na Califórnia, pouco falava sobre sua ascendência africana. Foi uma época de confusão para o jovem. Ressentido com a ausência do pai, o adolescente nunca tinha visitado o Quênia e pouco sabia sobre seus parentes africanos. Os próprios colegas negros na universidade viam Obama com desconfiança e chegaram a apelidar o futuro presidente americano de Oreo, um biscoito de chocolate com recheio de baunilha famoso nos EUA. Muito multicultural, o criticavam com desdém.
— Barry Obama, que tipo de nome é esse para um irmão? — perguntou certa vez o amigo Eric Moore, que já havia visitado o Quênia. — E ele respondeu: “Bem, meu nome verdadeiro é Barack Obama.” E eu disse: “Bem, é um nome forte: Rock, Buh-Rock.” E nós dois rimos. Ele continuou: “Eu uso Barry. Assim não tenho que me explicar para o mundo. Você é meu bro, posso te contar meu passado.”
Mas a questão racial ganhou mesmo força na vida de Obama quando ele se mudou para Nova York e começou a estudar na Universidade de Colúmbia. Na busca pessoal por sua identidade, o livro “O homem invisível”, de Ralph Ellison, se tornou acessório inseparável do democrata.
Data desta época, as primeiras cartas de Obama para uma namorada, lamentando sua falta de estrutura familiar e a ausência de uma tradição na qual se apoiar ou, ao menos, se identificar. Filho de pais tão diferentes e crescendo em várias cidades do mundo, ele questionava aos 20 poucos anos suas verdadeiras raízes.
Confuso, ele embarcou numa viagem de autoconhecimento para Indonésia e Havaí, mas se viu ainda mais frustrado. Foi em um trabalho como supervisor de um grupo de trabalhadores temporários em Nova York que Obama experimentou o maior senso de pertencimento até então. “Sinto uma grande afinidade com negros e latinos (que compreendiam três quartos da força de trabalho), a maior em muito tempo”, confessou à namorada da época, Alex McNear.
Em Nova York, Obama deu o primeiro passo para assumir sua identidade racial. Primeiro, o jovem deixou de lado a postura de estrangeiro para assumir de vez seu lado americano. O segundo passo foi natural: trazer à tona o lado racial. Pessoas próximos ao atual presidente dizem na biografia que até então Obama não tinha muitos amigos negros e costumava rejeitar essa identidade, assumindo sempre a postura de um outsider.
Se em Nova York Obama fez as pazes com seu lado americano, foi em Chicago que sua percepção da identidade negra ganhou força. Na nova cidade, o presidente começou a trabalhar em um projeto de desenvolvimento de comunidades e passou a frequentar cada vez mais casas de outros negros. No programa, Obama encontrou um ambiente barulhento e acolhedor no qual nunca tinha vivido. Sua trajetória fora até então marcada pela solidão, e, em alguns aspectos, o presidente ainda preserva um lado discreto e reservado.

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