sábado, 29 de junho de 2013

Opinião/Memória: Helder Proenca e a participaçao da juventude na luta pela independencia (II)

Huco Monteiro
Os anos setenta foram muito à parte, cruciais e replectos de desafios para a Juventude guineense. PAIGC granjeava dia após dia vitórias militares e diplomáticas (Leopoldo Amado). Os avanços na Luta de Libertação Nacional levavam a uma maior tomada de consciência do absurdo que era a situação colonial e mostravam claramente que a independência era ineluctável. 
 
O PAGC fortalece o sector da comunicação e de propaganda e os efeitos se fazem sentir em Bissau, através da Rádio Libertação e da revista “Actualités”. Os jovens conseguem também notícias mais frequentes sobre os países vizinhos. Lembro-me de alguns djumbais, designadamente um tido naquele célebre acampamento de Quinhamel evocado por Ansumane Keita, em que eu, Sandji Fati, Djili, Licínio Ledo Pontes, Nelson Nascimento e outros colegas passámos uma noite inteira a falar do Bembeya Djazz, do Abubacar Demba Camara e de outros miticos artistas do país de Sekou Turé. 

Mas a chegada do Governador Spinola, com o seu projecto de Guiné Melhor, causa algumas e substanciais perturbacoes na marcha dos acontecimentos. Criou o congresso do povo, instancia através do qual valoriza os poderes tradicionais, confere voz a notaveis locais sobre os assuntos do território. De repente Baticam, Cambanco Sanca, Afuam Nandingna, Demba Djassi, Embalo, Tcherno Rachid, Banjai, Ndja Ká, régulo de Ntim e outras personalidades ganham visibilidade e proeminencia política que transvasavam o quadro territorial dos respectivos regulados.
 
Pela primeira vez a Guiné faz-se representar por autoctones no Parlamento portugues, na figura de Nicolau Martins, ex-dirigente nacionalista e ex-prisioneiro político, e do médico Gardete Correia, o que mexe algures com a auto-estima colectiva. Uma fornada de oficiais africanos aparecem no comando do exercito, pela via dos Comandos Africanos, apresentado falaciosamente como um elevador social. 
 
Spinola, prosseguindo no fundo o objectivo do controlo das populaçoes, afastando-as da influencia do MNL, leva a cabo uma politica de amelhoramento dos aldeamentos. Houve uma propulsao do ensino primario, com a criacao de escolas de postos. Embora com professores improvisados, este estratagema gera uma evolucao positiva e crescente em termos do alargamento do acesso escolar. Há substancialmente mais alunos na escola, mais escolas em todo o território, mais estudantes guineenses no ensino secundário, a partir dos finais dos anos sessenta e inicio dos anos setenta, merce de uma política de afrouxamento de barreiras economicas, sociais e políticas. 
 
Como escrevera algures, registam-se as mais substantivas mostras de acesso e de aceitação social do guineense na sociedade colonial, durante o Governo de António Sebastião Ribeiro de Spínola, mercê da chamada política de Guiné-Melhor,. Todavia, apesar de algumas dificuldades conjunturais, a luta prossegue e com cada vez mais sucessos. Foi durante este período de ascensão social que a juventude fez mostra de uma consciência nacionalista reforçada, que as ideias nacionalistas penetrariam com maior acuidade e teriam mais impacto na sociedade, mormente no seio da pequena burguesia montante. Zé Carlos e Cobiana tiveram um papel decisivo na desconstrução do mito da Guiné-Melhor, ajudando o movimento da independência a vencer a batalha, a renhida batalha da juventude que se travava em Bissau e nas capitais regionais ainda ocupadas.

E a libertação de prisioneiros em 1969, que se inscrevia numa perspectiva de desmobilização da sociedade com relação à independência, teve o efeito inverso. Não obstante os episódios invocados como tipificantes da infiltração das estruturas do PAIGC na zona ocupada (Leopoldo Amado, Oleg Ignatiev, José Vicente Lopes …), permitiu a reconstituição da célula clandestina do partido, o desenvolvimento do trabalho de mobilização e inclusive a intensifiação de acções de sabotagem.
 
OS Casos paradigmáticos foram as actividades de sabotagem promovidas por António Cabral, Romão Correia e colegas da Força Aerea (contra aviões utilizados no bombardeamento de aldeias da zona libertada, as bombas do Zé Carlos Schwartz. Pode-se igualmente convocar nesta memória a afronta popular que o tio Nicolau Martins e os activistas da Acçao Nacional enfrentaram em Pilum di Bas, quando pretenderam realizar um comicio em Ga Sampaio, em 1972 etc.).
 
Muitos jovens do Liceu são seduzidos por Rafael Barbosa e aproximam-se dos círculos nacionalistas onde são doutrinados e encaminhados para as fileiras do movimento de Amílcar Cabral. 
 
Os Jovens estudantes abandonam as perspectivas evolucionistas que lhes eram oferecidas no quadro de uma Guiné-Melhor e juntam-se à resistência nacionalista protagonizada pelo PAIGC de Amílcar Cabral. Esse movimento acontece quer na Guiné, quer no estrangeiro.
 
Em Portugal, Victor Freire Monteiro, economista e alto funcionário do Banco de Portugal, Mário Cabral, jovem licenciado em Agronomia e sua esposa, Hugo Borges, irmão do nosso professor João Galvão e sua esposa, ambos estudantes bem-sucedidos, zarpam de Portugal para se juntarem a Amílcar Cabral em Conakry. Em França, os emigrantes aproximam-se de Amilcar Cabral, depois de uma largo periodo de dominaçao monopolista exercida pela Fling de François Kankoila Mendy. Nomes como Bosco Mendy, Joao da Silva, Fernando Gomes (pai do Paulo Gomes), Simao Mendes e outros aderem ao PAIGC e desenvolvem acçoes inolvidáveis no seio da comunidade emigrante, essencialmente manjaca, na altura.
 
Uma legião extensa de jovens e de estudantes fogem de Bissau e dos outros centros ainda sob o controlo colonial para se juntar ao PAIGC.
 
Lembram-se de Mário as Custas, irmao mais novo da Plácida que fugiu muito novo? E o Manel Mina que também era um garroto?Seguindo passo ao grupo de Tcherno Indjai, Jomel, Mandu Fati, Carlitos Barros bai matutornou-se numa verdadeira debandada nos circulos escolares.
 
A última imagem que tenho do You antes de I fidi, foi durante uma rixa em que as meninas djunta na él em Fonti di Bás, nos finais de 1972. O gajo era malcriado. Veio arranjar problemas com um grupo de meninas e levou. Landa Vieira, Note Perdigão, Ata de Carvalho, Fina Pereira, Carmen Tchuntchun, Mbutcha Ndingui djunta na él, com ranhaduras, limbidas, chineladas e outros, naquela célebre altercação na Floresta. Fonti di bás era um bosque expressivo no meio da cidade, entre Gambiafada e Chão de pepel, povoado de mangueiros. Perto daí, no Alto de Krim, havia uma outra mancha de árvores, bem mais densa do que em Fonti di bás, constituida de eucaliptos, a que chamavamos de Parque. Estas manchas de sombra eram um espaço muito frequentado por estudantes. Lá brincávamos, lá jogávamos à malha, ringue, futebol, etc, e lá mantinhamos os nossos encontros amorosos.
 
A Bancada situava-se na actual residência de Victor Saúde Maria. Os mangueiros de Fonti di bás, qual um baú, encerram segredos de Kerenças célebres: Carlos Pereira com Fina, Landa ku Rui Tita (Camará), Note com Nelson Nascimento, Zinha di mana Ndini com Caetano Cigismundo, Fontino com Liliana Pontes, Pedrinho ku Necas, Nair com Gil, Admir ku Tpya di Aquino, Armindo com Odilia di nha Messia, Sidónio ku Plácida, Olivais ku Zinha e tantos outros que o tempo borrou da minha memória. Fonti bás de nomes de vulto como Zeca di mati, Oredja-oredja, Zé Carlos, Fanda, Milu Camará, Lote, Nando Davyes, Tony Marques, Zeca Boy, Carlinhos, Nelson Galina, Rui ku Abel Galina,Tukay, Bana.

(Continua ...)
  
Huco Monteiro
 

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