Em
40 anos de independência da Guiné-Bissau, apenas três dos dez Presidentes e
ex-Presidentes estão vivos e dois deles afastados da política. Observadores
falam em um novo ciclo político no país, após a presidencial.
Com
a morte, a 4 de abril, do ex-chefe de Estado Kumba Ialá - deposto em 2003, após
três anos na Presidência, na sequência das eleições de 2000 - apenas estão
vivos três políticos que se sentaram na cadeira presidencial na Guiné-Bissau,
todos eles interinos: o atual Presidente do governo de transição, Serifo
Nhamadjo, que assumiu a Presidência após o golpe de Estado de 12 de abril de
2012; o homem a quem sucedeu, Raimundo Pereira, o único Presidente de transição
que acabou deposto; e Carmen Pereira, há muito afastada da política, mas que
continua a ser uma das incitadores de instabilidade no PAIGC.
Dos
10 chefes de Estado que a Guiné-Bissau já conheceu, apenas quatro foram
legalmente escolhidos ou eleitos. Os outros seis, ocuparam o cargo como
interinos ou num governo de transição.
O risco de ser Presidente
O
sociólogo guineense Leonardo Cardoso, Mestre em Ciências Sociais e historiador,
não acredita que ser Presidente na Guiné-Bissau signifique correr sérios
riscos.
"Ser
Presidente é ser o magistrado supremo da nação, é ter de trilhar o compromisso
no sentido de resolver da melhor forma aqueles que são os anseios das
populações," define.
O
problema estaria em não conseguir gerir o país e transferir a família e os
amigos para a esfera do poder.
"As
pessoas geralmente assumem o poder, esquecem-se dos compromissos que têm com a
população e, por outro lado, em primeiro lugar, põem a relevo os compromissos
que têm com os amigos, com os familiares, com os militares etc, e aí sim
começam os riscos," explica.
Mas,
por si só, ser Presidente não tem qualquer risco na Guiné-Bissau, acredita o
sociólogo.
Entre mortes e golpes militares
Pelo
Palácio Presidencial da Guiné-Bissau passaram Luís Cabral, João Bernardo Vieira
(ou "Nino"), Kumba Ialá e Malam Bacai Sanhá. O país conheceu ainda os
seguintes Presidentes interinos: Raimundo Pereira, Carmen Pereira, Ansumane
Mané, Veríssimo Seabra, Henrique Rosa e o atual Presidente de transição Serifo
Nhamadjo.
Uma
longa lista desde a conquista da independência do país, em 1973, e que leva
muitos guineenses a perguntar se existe uma "maldição" de ser
Presidente na Guiné-Bissau. Leonardo Cardoso refuta esta tese.
"A
única maldição à qual se pode referir, na Guiné-Bissau, é a má gestão da coisa
pública. São os compromissos que as pessoas assumem antes de serem Presidentes,
as alianças que fazem - à excessão talvez do Presidente Malam Bacai Sanhá, que
faleceu por razão de doença prolongada," considera.
Fatores que influenciam o mandato
do Presidente
Num
país de muitas crenças populares, várias etnias, religiões, um índice elevado
de analfabetismo e onde um Presidente nunca chegou a concluir o seu mandato,
poder-se-á pensar que tudo isso perturba o comportamento do eleitorado
guineense.
Para
o sociólogo guineense, a explicação não estaria ligada a tais fatores, mas sim
aos compromissos e às alianças que os políticos contraem antes de assumirem o
mandato.
Se
quisermos falar das amarras da tradição que normalmente são os Presidentes -
são todos os governantes, não só guineenses mas africanos de uma forma geral -
que acabam por ficar reféns dessa tradição, porque fazem muitos compromissos
junto aos santuários do culto religioso, de forma que ficam reféns dos
compromissos que eles assumiram," revela.
Leonardo
Cardoso explicita, no entanto, que isso não significa "inquirir que as
mortes tenham alguma relação com os compromissos que eles têm com aquilo que
nós chamamos de imãs, que são pais de culto religioso tradicional."
Perfil do eleitorado
Leonardo
Cardoso, fala ainda do que considera ser os elementos que condicionam a decisão
do eleitor guineense no exercício do seu dever de cidadania, ou seja, de votar
nos pleitos eleitorais.
Os
aspectos étnicos, que são claramente notórios; as afinidades culturais e
religiosas, em menor escala; e também os compromissos que advêm dos
investimentos que os candidatos fazem nas comunidades rurais e mesmo urbanas
guineenses. Estes elementos condicionam grandemente a decisão do eleitorado
guineense," avalia.
Muitos
guineenses já dizem que o mês de junho de 2014 - altura em que o governo e o
novo Presidente deverão entrar em funções - ficará na história da Guiné-Bissau
como o momento da rutura do ciclo de golpes de Estado, de insegurança e de
instabilidade. E o sociólogo guineense também acredita nesta tese.
"Em
princípio deve marcar, porque nós todos esperamos que estas eleições venham
marcar o fim das sucessivas crises e o início de uma nova era que se espera
para a Guiné-Bissau," finaliza.
//D.W
//D.W
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