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1. Introito
O presente artigo contém no seu título uma expressão muito comum em ciência
política quando se trata dos cuidados que cada cultura, civilização,
comunidade, nação, associação, tem ao organizar o seu poder soberano.
“Checks and balances” é uma expressão oitocentista do constitucionalismo
norte-americano significa muito literalmente “verificação e correção”.
As questões de sistema de governo surgem com naturezas distintas nos
domínios políticos e nos domínios societários. Nos primeiros trata-se do
exercício de poderes soberanos, da formação e manifestação de decisões sobre
tudo o que pode interessar à vida das pessoas abrangidas, que assim, apesar de
serem estas as detentoras do efetivo poder soberano, estão sujeitas a esse
exercício de poder sobre elas desde que este aconteça pela forma organizada por
estas. Nos segundos trata-se do exercício de poderes sobre coisas que são
colocadas em comum, ou ditas em sociedade. É uma diferença de nível, ou de
domínio: supra-individuo para inter-individuos.
Ressalvadas estas diferença conceptuais, a importância dos checks and
balances numa e noutra é evidente.
A teorização do sistema de governo surge em distintas formas de estado,
quer estados unitários, quer federais, têm questões próprias de sistema de
governo. O mesmo não se verifica quanto às distintas formas de governo ou de
sistema político.
Para que se levantem questões de sistema de governo é necessário que se
verifique que o poder soberano é detido pelas pessoas, sujeitas a esse mesmo
poder; e que estas criem um conjunto de instituições que encarnem, pelo menos,
a clássica divisão do poder soberano em legislativo, executivo e judicial.
Verificando-se a concentração do poder soberano numa pessoa, família, partido
ou instituição, como por exemplo numa monarquia absoluta, ou numa república
autoritária, com exclusão do reconhecimento do poder soberano dos súbditos não
haverá aí problemas de sistema de governo e nestas formas de governo ou de
sistemas políticos em que os cidadãos perderam o poder soberano de que são
titulares para que o recuperem deve operar nessa comunidade uma revolução do
poder para que o povo organize novamente as suas instituições às quais pretende
se sujeitar.
Nos sistemas políticos democráticos o poder soberano deve ser exercido em
conformidade à organização política determinada pelos cidadãos, pela forma que
estes estabeleceram, pois, em democracia são sempre, a todo o momento, os
cidadãos os titulares do poder soberano, e em república são todos súbditos do
que é coisa pública, principalmente os que encarnam, por qualquer razão que
seja, instituições soberanas.
Numa República Democrática quando um titular de uma instituição soberana
forma uma decisão e a manifesta na prática deve fazê-lo em todos os seus
momentos em plena obediência a quem está a exercer o poder soberano, que são os
cidadãos e isto acontece com o respeito pelos pressupostos, procedimentos e
finalidades, que estes, directa ou indiretamente, estabeleceram.
Numa república democrática os cidadãos, conformando-se ou não com a prática
das instituições soberanas, não carecem de operar uma revolução para sanear o
exercício do poder soberano.
Numa república democrática surgem naturalmente, e com primor, as questões
de checks and balances, e a consequente procura de criação de instituições e de
dotá-las de poderes e de conformá-las a procedimentos para o assegurar. Tal é
disposto, normalmente, por escrito, numa Lei Magna, também chamada de Lei
Fundamental ou de Constituição.
Numa república democrática se a instituição é boa, mas circunstancialmente
verifica-se que não está a servir como é seu dever, ou seu propósito, os
interesses dos cidadãos e é apenas o seu funcionamento, ou alguns aspetos do
seu funcionamento, que carecem de ser sanados, corrigidos, esclarecidos,
redirecionados, devem funcionar os checks and balances determinados pelos
cidadãos nessa lei fundamental, lei magna, lei fundamental, para assim ser
sanado o funcionamento dessa instituição boa. No limite dos checks and
balances, num quadro de vigência constitucional democrática estará o novo
exercício do poder soberano dito originário pelo meio institucionalizado do voto,
em eleições, em referendos, etc…
Enquanto a Constituição está a ser cumprida são os cidadãos que estão a
exercer o poder soberano. No limite, numa república democrática, quando as
instituições deixam de todo de servir o interesse determinado nessa lei
fundamental verifica-se uma situação tal de coincidência inaudita,
imprevisível, que deve resultar na desordem pública, num vazio do exercício do
poder soberano que deve ser sanado com um novo exercício radical do poder
soberano dito originário.
É um introito, talvez, algo por demais extenso, abstracto, ou filosófico
para um artigo online mas que espero sirva de guia, de balizas aos leitores,
para assim formularem as suas próprias questões do domínio dos sistemas de
governo.
Assim, com sentido crítico, melhor se aproveita a participação do leitor
neste artigo.
Caso o introito tenha ficado apenas extenso, abstracto e filosófico, sem
que com isso alcance no leitor o exercício do seu sentido crítico na leitura
deste artigo, as minhas desculpas ao leitor pois o objetivo era servi-lo o que
espero alcançar no próximo artigo.
2. Forma de Estado e
Sistema Político da Guiné-Bissau
Quem encarna a Guiné-Bissau, as suas instituições, todos os partidos e seus
dirigentes, todos os ministros, dirigentes e funcionários públicos, agentes
administrativos, militares, e principalmente, o seu povo – na vigência atual da
Constituição aprovada e adoptada para vigorar como lei fundamental desde 16 de
Maio de 1984, deve conformar-se ao princípio republicano do Estado, este é
essencial na identidade da organização do poder político soberano do Estado da
Guiné-Bissau.
A par do princípio republicano devem os mesmos conformar-se ao princípio de
unidade do povo da guiné-bissau e, junto com este, ao princípio democrático da
organização e funcionamento do poder político.
Assim o determina o artigo primeiro da Constituição, lei fundamental
escrita da organização do poder político do povo da guiné-bissau, sobre o seu
território.
Estes princípios podem ser discutidos, podem ser melhorados, mas enquanto
vigorar a presente constituição, estes princípios formam a identidade da organização
do poder político do Estado, e como tal devem ser cumpridos.
Quem não os cumprir não é digno de encarnar qualquer função mínima que seja
nesse Estado.
É verdade que são vários os níveis de responsabilidade das funções num
Estado e na mesma proporção a projeção dos efeitos do comportamento de quem
está a servir a coisa pública, a tal res pública, teorizada no Antigo Egípcio,
desenvolvida pela civilização clássica grega e melhor protagonizada pelos
clássicos romanos donde do latim surgiu o termo República para o nosso léxico
lusófono, mas são sempre nefastos os comportamentos que não respeitem a forma
de estar republicana e democrática do Estado guineense.
São elementos essenciais duma República: i) a possibilidade de cada pessoa,
cidadãos, membros do povo, poder aceder ao exercício institucionalizado do
poder soberano; ii) a limitação temporal do exercício do poder soberano pela
mesma pessoa; iii) a fiscalização do exercício do poder soberano pelos que
encarnam as instituições soberanas.
Democracia, é um termo grego, que significa essencialmente o exercício do
poder soberano pelo povo, direta, em democracias não representativas, como era
por exemplo nas Cidades-Estado gregas no tempo de Sólon o estadista fundador da
forma de governo democrática dos atenienses; ou representativas como é o caso
de quase todas as democracias soberanas atuais em que o povo exerce o seu poder
soberano pela eleição dos seus representantes na Assembleia dita Nacional ou
Popular, ou ambas, Nacional Popular.
O povo pelo voto radicalmente define de com tendência perene a organização
política soberana, máxima, fundamental, magna para, em seguida,
conjunturalmente, por meio do voto em eleições, referendos, ou outras formas
institucionalizadas ou não de participação política popular – por exemplo, a
iniciativa legislativa por grupo de cidadãos, a manifestação pública, a
reclamação no livro de reclamações de entidades administrativas, a opinião
pública nos meios de comunicação, a opinião pública manifestada pela cultura,
dança, música, literatura, pela atividade comercial e empresarial, pela
migração, natalidade, etc. – determinar a interpretação do serviço à coisa
pública que deve seguida por quem exerce no quotidiano os poderes e funções de
soberania.
3. Sistema de Governo
da Guiné-Bissau
No capítulo do sistema de governo a Constituição institui na República
Democrática da Guiné-Bissau como órgãos de soberania:
1. O Presidente da República;
2. A Assembleia Nacional Popular;
3. O Governo;
4. Os Tribunais.
A numeração não consta do texto constitucional, é apenas a ordem por que
são enumerados os órgãos de soberania. Está assim expressa aqui no presente
artigo porque apesar de ser apenas uma das ordens possíveis da enumeração dos
órgãos de soberania é esta a ordem escolhida sistematicamente em toda a
Constituição para a apresentação dos órgãos de soberania o que entendo como um
sinal do valor, ou importância das responsabilidades (ou funções) em causa, e
friso das responsabilidades (ou funções) e não das instituições em causa, pois
as instituições citadas resultam todas do mesmo poder soberano que é divido,
separado, por graus para servir os interesses de checks and balances que o povo
instituiu e fez escrever nessa Lei Magna por meio dos seus representantes na
Assembleia Nacional Popular Constituinte.
Um dos principais elementos deste sistema de governo é a independência de
cada um dos órgãos de soberania, perante os demais. Esta independência, na
constituição da república portuguesa é afirmada expressa e imediatamente no
texto constitucional como interdependência, pois é disso que se trata. A
independência dos órgãos de soberania não pode ser total, dogmática, plena,
pois tal impediria o curso natural do poder soberano que na sua essência é só
um e não quatro, ou vários. Não se entende a independência dos Tribunais se têm
de respeitar as leis da Assembleia Nacional Popular, nem a do Presidente se
está sujeito à decisão dos Tribunais, ou às iniciativas do Governo ou da
Assembleia.
A independência dos órgãos de soberania, deve ser entendida nos termos em
que a constituição coloca essa independência, nenhum órgão de soberania do
Estado da Guiné-Bissau exerce o poder soberano que lhe compete de forma
isolada, independente, dos demais órgãos de soberania, todos cooperam como o
pedalar numa bicicleta para que sejam alcançados os propósitos de serviço à
coisa pública determinada pelo povo, pelas suas várias formas de manifestação
institucionalizadas ou não.
A independência dos órgãos de soberania, no respeito da interdependência
que a Constituição exige, serve à melhor fiscalização de cada um dos órgãos de
soberania pelo outro. Pois num cenário em que por partidarismos domina em todos
os órgãos de soberania a presença dum mesmo dirigente, aí descaracterizamos o
Estado, pois deixamos de ver o Estado guineense como uma república democrática,
e será um Estado absolutista.
São alguns sinais desta independência:
a) a eleição por sufrágio universal direto do Presidente (art. 64.º, n.º 1)
e dos titulares dos cargos de deputados à Assembleia Nacional Popular (art.
77.º); atribuiu igualdade de legitimidade a ambas as instituições, o que
permite a independência de um perante o outro para o exercício das respetivas
funções de fiscalização recíprocas;
b) a superação de veto presidencial sobre as leis da Assembleia Nacional
Popular por voto favorável da maioria de dois terços dos deputados em
efetividade de funções;
c) a imunidade dos deputados à Assembleia Nacional Popular (art. 82.º);
d) a incompatibilidade da acumulação simultânea do cargo de deputado com o
de membro do Governo (art. 84.º, n.º 4);
e) entre outros.
São alguns sinais desta interdependência:
a) a responsabilidade política, civil e criminal pelos atos e omissões que
os titulares de órgãos de soberania pratiquem no exercício das suas funções
(art. 32.º, art. 61.º, art. 72.º);
b) a nomeação e a exoneração dos membros do Governo pelo Presidente da
República (art. 68.º alíneas g a J, art. 69.º, n.º 1 alínea b, art. 104.º, n.º
2);
c) a promulgação dos atos legislativos pelo Presidente da República (art.
68.º alínea s, art. 69.º, n.º 1 alínea c);
d) a convocação extraordinária da Assembleia Nacional Popular pelo
Presidente da República (art. 68.º alínea d);
e) a ratificação dos tratados internacionais aprovados pela Assembleia
Nacional Popular (art. 68.º alínea e, art. 85.º, n.º 1, alínea h);
f) a fixação da data de eleições à Assembleia Nacional Popular pelo
Presidente (art. 68.º alínea f);
g) a presidência do Conselho de Ministros pelo Presidente da República
sempre que o entender (art. 68.º alínea m);
h) a investidura pela Assembleia Nacional Popular do Presidente da
Republica, prestando perante esta o respetivo juramento, (art. 67.º);
i) a investidura pela Assembleia Nacional Popular do Governo, com a
aprovação do Programa de Governo (art. 85.º, n.º 1 alínea d, art. 104.º, n.º 1,
alínea b), assim como a aprovação pela Assembleia Nacional Popular do Orçamento
Geral do Estado (art. 100.º, n.º 1 alínea c, art. 85.º, n.º 1 alínea g), de
moções de confiança ou de censura ao governo (art. 85.º, n.º 1 alínea f), 85.º,
n.º 3 a 5, art. 104.º, n.º 1 alínea d);
j) a determinação pela ANP da organização judiciária e o estatutos dos
magistrados (art. 86.º alínea g);
k) o término do mandato dos membros do Governo com o término da
legislatura, assim como a caducidade das autorizações legislativas da ANP ao
Governo, com o fim da legislatura;
l) entre outros.
3.1. Presidente da
República
O Presidente da República da Guiné-Bissau (PR) é eleito por sufrágio
universal direto, dispondo assim de legitimidade democrática própria ou seja
diretamente do povo, para o seu mandato de cinco anos renovável imediatamente
uma vez. É investido no respetivo cargo pela Assembleia Nacional Popular
perante a qual presta o juramento a todo o povo de defender a Constituição e as
leis, a independência e a unidade nacionais, e de dedicar a sua inteligência e
energias ao serviço do povo, condensando o juramento o essencial do quadro de
funções que deverá orientar o PR no exercício dos seus poderes.
O PR tem também funções ditas cerimoniais, mas estas não caracterizam o
essencial da sua função, limitar o horizonte dos poderes presidenciais às
funções cerimoniais é um equívoco. São funções desta natureza, por exemplo, a
representação do Estado; a presidência do conselho de ministros; as funções de
comandante supremo das forças armadas; as mensagens à Nação e à Assembleia
Nacional Popular; o empossamento dos juízes do Supremo Tribunal de Justiça; entre
outras.
O PR tem a principal função de magistrado máximo do Estado devendo em todos
os seus atos por comissão ou omissão, cerimoniais ou não, defender a
constituição e as leis do Estado da Guiné-Bissau, principalmente, no exercício
dos poderes de promulgação, veto, ratificação ou não ratificação de tratados
internacionais, num nível quotidiano de atuação e num nível mais elevado de
defesa da constituição e das leis, ou seja, em defesa do normal funcionamento
das instituições tal como o povo a determinou desde logo na Lei Fundamental,
nos seus preceitos, princípios e demais atos legislativos, exercer os
procedimentos à sua responsabilidade de controlo e saneamento dos órgãos de
governo.
No que respeita aos poderes de controlo do PR sobre outros órgãos de
soberania, destacam-se os sobre o Governo.
Compete ao PR: i) nomear, dar posse e exonerar o Primeiro-Ministro, tendo
em conta os resultados eleitorais e ouvidas as forças políticas representadas
na Assembleia Nacional Popular (ANP); ii) nomear e exonerar os demais membros
do Governo, sob proposta do Primeiro-Ministro, e dar-lhes posse.
Assim entendendo-se que tendo em conta o normal funcionamento das
instituições e essencialmente para esse propósito o PR deve escolher o
Primeiro-Ministro. Não está o PR limitado nessa escolha à sugestão de qualquer força
política, nem deve estar o PR nessa escolha limitado a deliberação de eventual
partido político que o tenha apoiado com maior ou menor determinação na
campanha que culminou na sua eleição para PR. A Constituição permite algum
partidarismo noutros órgãos de soberania, mas pretende excluí-los do titular do
cargo de PR, pois só com a exclusão desse carácter partidário pode ser
alcançada pelo PR a independência devida para a fiscalização que lhe compete
sobre os demais órgãos de soberania com carácter partidário, nomeadamente, a
Assembleia Nacional Popular e, em grau variável, o Governo.
Para o propósito de alcançar o funcionamento normal das instituições o PR
deve nomear um Primeiro-Ministro que possa não apenas chefiar o Governo mas
liderá-lo para que a sua composição, programa e atuação mereça o voto favorável
da Assembleia Nacional Popular.
Desde logo na aprovação do Programa de Governo, posteriormente em várias
matérias do quotidiano da atuação do Governo que cada vez mais os tempos de
atuação e complexidade das matérias fazem remeter para o maior pragmatismo e
celeridade da sua atuação; e periodicamente para a aprovação do Orçamento Geral
do Estado, instrumento determinante para a atuação quotidiana governativa.
Para o mesmo propósito de manter o funcionamento normal das instituições o
PR tem a função de demitir o Governo, e aqui a Constituição, não obriga a que o
Governo seja demitido necessariamente na sua forma colegial, que assume por
exemplo em Conselho de Ministros. A Constituição no âmbito dos poderes do PR
refere-se numa disposição à exoneração do Primeiro-Ministro, e noutra a
restantes membros do Governo (art. 68.º, alíneas g e i). Refere-se ainda a
Constituição numa disposição que a demissão do Primeiro-Ministro acarreta a
demissão do Governo (art. 104.º, n.º 1 alínea c). Não exigindo a Constituição a
integral coincidência entre a forma colegial do Governo e a sua forma singular,
pela qual cada membro do Governo, constitui o Governo no seu ministério.
Podendo assim o PR decidir por substituir membros do Governo sob proposta do
Primeiro-Ministro, assim dando lugar às chamadas remodelações ministeriais. A
demissão parcial do Governo se incluir o PM implica a demissão de todo o
Governo.
A proposta do Primeiro-Ministro (PM) para a nomeação e exoneração dos
demais membros do Governo é essencial para manter a liderança daquele sobre
todos os membros do Governo. A iniciativa da intromissão do PR na composição do
Governo é também admitida pela Constituição desde que tal intromissão tenha o
consentimento do PM. Um dos corolários deste procedimento é que a confiança
constitucionalmente exigida entre PR e PM para o normal funcionamento das
instituições é maior do que a exigida entre o PR e os demais membros do
Governo, devendo o PM como líder do Governo e responsável perante o PR,
responsabilizar-se com o membro do governo cuja demissão seja sugerida pelo PR
e apresentar a sua demissão ao PR, ou procurar corresponder às suas pretensões
de modo que consiga garantir o normal funcionamento do Governo, o qual depende
intrinsecamente da sua normal aceitação junto do PR.
Não estará o PM a garantir o normal funcionamento do Governo se não
procurar corresponder às legítimas pretensões conforme interpretadas pelos
competentes órgãos de soberania e manter o Governo que lidera a integrar, por
exemplo, valores contrários aos princípios republicanos de serviço, conformação
e respeito, à coisa pública e tal seja verificado pela forma institucional
adequada, designadamente, pelo PR, ou ANP, ao interpretar politicamente a atuação
do Governo perante a constituição e demais leis, ou pelos demais magistrados da
nação ao interpretar civil, administrativa ou criminalmente a atuação do
Governo.
Na graduação dos seus deveres o PR deve valorar sempre a defesa das
instituições, nomeadamente, a Constituição e demais leis, acima do necessário
respeito e compreensão que tenha para com o PM.
A confiança exigida entre PR e Governo é essencial para que o Governo possa
com “desembaraço” desempenhar as suas funções. A distinção entre PR e Governo
serve para que o PR possa fiscalizar e conformar o Governo à Constituição e às
Leis. O PR deve ser a válvula de escape ao partidarismo das instituições de
soberania, em especial nas situações em que um partido as domina. Não pode o PR
ficar refém de interesses partidários, essa situação seria o sequestro da
Constituição, dados os poderes de soberania que são conferidos ao Governo,
sujeitos apenas à fiscalização do PR e da ANP (a qual pode ser dominado – e
normalmente o é – por um partido político do qual resulta normalmente a
indigitação do PM).
A presidência da república é uma instituição com um órgão singular, o PR,
no qual se confia a principal função de defesa da constituição e das leis.
Apesar de órgão singular, e sem deixar de o ser, o PR deve consultar o
Conselho de Estado, o qual corresponde a um órgão constitucional, de consulta
não vinculativa, mas obrigatória para o PR em certos assuntos e facultativa nos
demais.
É obrigatório para o PR o parecer do Conselho de Estado sobre a interpretação
da situação de grave crise política que justifica o ato de dissolução da ANP; a
interpretação da situação de grave crise política que justifica a demissão do
Governo; a interpretação da situação que justifique a declaração de estado de
estado de sítio e de emergência; e da interpretação da situação que justifique
a declaração da guerra ou da instauração da paz (art. 75.º, 104.º, n.º 3).
O parecer do Conselho de Estado nestas matérias apesar de obrigatório não é
vinculativo. O PR é que tem a legitimidade democrática e o dever de empenhar a
sua inteligência e energias para como supremo magistrado da nação decidir pela
melhor interpretação da Constituição e das leis.
Apesar do seu parecer não ser vinculativo a obrigatoriedade da sua consulta
obriga a que o PR fundamente a sua decisão considerando expressamente a
pronúncia do Conselho de Estado, sob pena de na prática não o ter ouvido como
lho exigia a Constituição.
No sistema de governo da constituição o PR não responde politicamente a
qualquer órgão. Desta norma resulta o corolário de que deve ser o PR o supremo
magistrado da nação no que em matéria politica diga respeito, no que diga
respeito ao normal funcionamento das instituições e defesa dessa normalidade
constitucional e institucional.
O PR responde pelos crimes cometidos no exercício das suas funções, perante
os órgãos de soberania judiciais, designadamente a sua instância judicial
máxima, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ). Para tanto, dentro dos limites
constitucionais e de ius cogens a ANP pode definir os crimes políticos que
entender necessários à defesa dos valores constitucionais em face do PR.
A responsabilização criminal do PR perante o STJ é de tal forma
incondicionada nos seus efeitos que a condenação por qualquer crime que seja
implica a sua destituição do cargo e a sua inelegibilidade da sua imediata
reeleição (art. 72.º). A responsabilidade criminal do PR parece ser de âmbito
incondicionado, ao contrário da de um deputado, todavia, tal interpretação é
equívoca, pois a responsabilização criminal do PR só pode ser apreciada
judicialmente caso a maioria qualificada da ANP votar favoravelmente tal acção
penal em face de suspeitas suficientemente concretas da prática de crime por
parte do PR e entenda-se de crime grave que justifique tal “embaraço” ao normal
funcionamento das instituições.
A interpretação da situação que justifica o desencadear do processo
judicial penal que pode culminar na condenação do PR é determinada pela ANP,
por proposta de um terço do total de deputados em efetividade de funções e
aprovada por dois terços do total de deputados em efetividade de funções.
Pelo que não será iniciada semelhante ação penal contra o PR sem a
iniciativa de uma maioria qualificada da ANP. A aprovação dessa iniciativa por
essa maioria pode culminar na condenação judicial ou não do PR.
Os efeitos da não verificação judicial da situação de crime suspeitada por
aquela maioria da ANP não estão expressamente previstos na Constituição. Mas
entende-se que em semelhante situação deve ser avaliada pelo PR a necessidade
de dissolução da ANP e a convocação de novas eleições legislativas, ou de
apenas, por exemplo, proceder a comunicação de uma mensagem à nação e à ANP. O
fiel da decisão do PR deve ser sempre a defesa da constituição e das leis, pela
defesa das instituições e do seu normal funcionamento, é esse o seu dever,
manter o Estado a funcionar normalmente com as suas instituições, tal como
definido principalmente na constituição.
O STJ deve atuar em sede de responsabilização criminal do PR como válvula
de escape ao partidarismo que pode dominar a ANP.
É um cuidado recorrente na constituição, um cuidado que deverá ter animado
os constituintes, conscientes da possibilidade do eventual “sequestro
partidário” e da necessidade desses cuidados em defesa do normal funcionamento
do Estado, máxime dos seus órgãos de soberania, com a respetiva independência
bem proclamada na constituição.
A ausência de responsabilização política do PR é comum nos sistemas de
governo, em especial nos ditos semi-presidencialistas, ou semi-parlamentares.
3.2. Assembleia
Nacional Popular
A Assembleia Nacional Popular é um órgão colegial composto pelos deputados
representantes de todo o povo, eleitos por círculos eleitorais, em sufrágio
universal directo.
Cada deputado, não representa por si só a ANP, mas constitui um órgão de
soberania singular com competências próprias. A ANP corresponde à vontade da
maioria dos deputados, formada e manifestada em conformidade à Constituição.
Os deputados tomam posse ao ocupar o seu lugar na ANP e ao prestar
juramento pelo qual se comprometem a representar com lealdade os interesses do
povo, em especial os interesses, princípios e objetivos que o povo inscreveu na
constituição.
Cada deputado tem o dever, em muito semelhante ao do PR de defender a
Constituição, quer dizer o normal funcionamento das instituições definidas pelo
povo na sua lei máxima, em especial no que respeita ao exercício do poder
soberano.
Cada deputado tem o poder de interpelar o Governo, de forma oral ou
escrita, com direito de resposta por parte deste no âmbito da sessão em que a
pergunta foi formulada, ou no prazo de 15 dias por escrito, caso haja
necessidade de investigações.
Os deputados devem eleger de entre si, o seu presidente e os demais membros
da mesa da ANP (art. 84.º), por maioria simples.
O Presidente da ANP tem competências próprias acrescidas às de deputado,
nomeadamente, deve presidir às sessões da ANP velando pela aplicação do
regimento da ANP; convocar as sessões ordinárias da ANP; superintender e
coordenar os trabalhos das comissões da ANP; assinar e ordenar a publicação no
Boletim Oficial das leis e resoluções da ANP; dirigir as relações
internacionais da ANP (art. 93.º); investir o PR nas suas funções (art. 67.º);
participar no Conselho de Estado (art. 74.º, n.º1 alínea a); substituir
interinamente o PR (art. 71.º, n.º 1 e 2); entre as demais funções.
O Presidente da ANP é a segunda figura de Estado a seguir ao PR, e representa
a plenitude da legitimidade democrática do deputado à ANP.
Pela mesma maioria simples com que deve ser eleito o Presidente da ANP pode
ser destituído pela ANP com fundamento em falta grave aos seus deveres (art.
83.º, n.º 2), o mesmo estende-se a qualquer outro deputado à ANP.
Após a eventual destituição do seu Presidente a ANP deverá eleger o novo
Presidente nos termos normais. Nada na constituição impede que eleja o mesmo, a
não ser o dever de cada deputado de defender a constituição e as leis, e assim
o normal funcionamento das instituições. O deputado a ser eleito Presidente da
ANP deve garantir o normal funcionamento das instituições, principalmente, o
normal funcionamento da ANP com o PR, com o Governo e com os Tribunais.
A ANP é o supremo órgão legislativo e representativo do povo, tem
competências para aprovar leis em todas as matérias, sendo que algumas matérias
são da sua reserva legislar e, noutras, legislar em concorrência com o Governo,
competindo-lhe especiais poderes de controlo político do Governo e de revisão
dos atos legislativos aprovados por este, e até o poder de superar um veto
presidencial e obrigar o PR a promulgar.
À ANP compete proceder à revisão constitucional, aprovada pela maioria
qualificada de dois terços do total de deputados em efetividade de funções;
decidir da realização de referendos populares, não dispondo a Constituição de
condicionamentos ao âmbito dos referendos e ao seu efeito vinculativo, ou não
vinculativo, quanto à ANP, ou a outros órgãos, sendo que os referendos
populares terão por princípio um efeito consultivo; fazer leis e votar moções e
resoluções; aprovar os tratados sobre determinados assuntos, designadamente, a
participação da Guiné-Bissau em organizações internacionais, amizade, paz,
defesa e de retificação de fronteiras e ainda aprovar os demais tratados que o
Governo entenda submeter-lhe; pronunciar-se sobre a necessidade da declaração
de estado de sítio e de emergência; apreciar as contas do Estado; conceder a
amnistia; entre outros.
Entre os assuntos que são da reserva exclusiva da ANP legislar, inclui-se:
a nacionalidade; o estatuto da terra e a forma da sua utilização; a organização
da defesa nacional; o sistema monetário; a organização judiciária e o estatuto
dos magistrados; a definição de crimes, penas e medidas de segurança e o
processo criminal; o estado de sítio e o estado de emergência, a definição dos
limites das águas territoriais e da zona económica exclusiva; direitos,
liberdades e garantis, associações e partidos políticos; sistema eleitoral.
São também da reserva da ANP, a prática de leis sobre os seguintes
assuntos, podendo a ANP autorizar o Governo a praticar atos legislativos sobre
estes assuntos, então sujeitos à posterior ratificação pela ANP: organização da
administração central e local; estatuto dos funcionários públicos e
responsabilidade civil da administração; expropriação e requisição por
utilidade pública; Estado e capacidade das pessoas; nacionalização dos meios de
produção; delimitação dos sectores de propriedade e das atividades económicas.
Curiosamente no elenco de assuntos da reserva, exclusiva ou não, da ANP não
consta legislar sobre a criação de impostos, competindo em concorrência à ANP e
ao Governo legislar sobre este assunto.
A reserva da criação de impostos ao órgão representativo máximo é um
clássico liberal, elemento fundamental do princípio conhecido por
auto-tributação, segundo o qual grosso modo é o próprio povo, e apenas o povo,
que determina os seus impostos.
Mais ainda compete à ANP na sua relação com o PR, dar-lhe posse,
pronunciar-se sobre assuntos de consulta obrigatória do PR ao Conselho de
Estado, com excepção da dissolução da própria ANP, devendo o PR considerar
expressamente na fundamentação da sua interpretação a pronúncia da ANP sobre
esses assuntos. Compete à ANP, por maioria qualificada de dois terços dos
deputados em efetividade de funções, como já acima vimos, o desencadear da ação
judicial penal contra o PR que pode culminar na sua condenação e consequente
destituição e inelegibilidade nas eleições presidenciais imediatamente
seguintes.
Mais ainda compete à ANP na sua relação com o Governo, investir o Governo
no exercício das suas funções pela aprovação por maioria simples do Programa de
Governo. Caso a ANP não aprove em primeira apresentação o Programa de Governo,
haverá lugar a uma segunda apresentação do Programa de Governo à ANP no prazo
de 15 dias. Nesse período o Governo deverá procurar corresponder às pretensões
da ANP que lhe garantam a aprovação do Programa de Governo. Caso o Programa de
Governo não seja aprovado pela ANP em segunda apresentação, o Governo é por
efeito automaticamente demitido pela ANP (art. 104.º, n.º 1 alínea b).
À ANP compete ainda nas suas relações com o Governo a aprovação do
Orçamento Geral do Estado (art. 85.º, n.º 1 alínea g), instrumento preparado
pelo Governo, mas, aprovado pela ANP, sem o qual o Governo não consegue
desempenhar normalmente as suas funções. Devendo o PR apreciar a capacidade do
Governo em garantir o funcionamento normal das instituições quando este não
consegue a aprovação do orçamento geral do Estado junto da ANP e não apreciar a
eventual dissolução da ANP por não conferir a aprovação ao Orçamento Geral do
Estado.
Ainda compete à ANP na sua relação com o Governo, autorizá-lo a legislar em
certas matérias da sua reserva (art. 87.º), bem como ratificar, ou não, o
exercício do poder legislativo do Governo nessas matérias da reserva da ANP
(art. 92.º, n.º 3).
Compete ainda à ANP deliberar sobre moções de confiança ao Governo, desde
que formalmente solicitadas pelo Primeiro-Ministro, após deliberação do
Conselho de Ministros (art. 85.º, n.º 3).
A moção de confiança é aprovada pela maioria absoluta dos deputados em
efetividade de funções. A não aprovação da moção de confiança é causa
automática da demissão do Governo, assim como a aprovação da moção de censura
pela maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções (art. 104, n.º 1
alínea d).
A aprovação da moção de confiança ao Governo confere a garantia de que o
Governo em causa tem condições para o seu normal funcionamento junto da ANP. A
moção de confiança não blinda o Governo de ser demitido pelo PR. O Governo para
cumprir a sua função deve garantir o seu normal funcionamento junto da ANP e do
PR. Caso o PR entenda demitir o Governo que goza de recente moção de confiança
da ANP, pode fazê-lo nos termos acima descritos.
Distinto da ANP são as forças políticas nesta representadas, as quais
correspondem aos partidos políticos donde foram eleitos os deputados à
legislatura em curso da ANP. Nos termos constitucionais o PR deve considerar a
pronúncia das forças políticas representadas na ANP na decisão de nomear e
exonerar o PM (art. 68.º alínea g), bem como na decisão de demitir o Governo
(art. 104.º, n.º 2).
A independência do deputado à ANP não prejudica a garantia do partido em
envidar esforços junto dos seus membros para viabilizarem a atuação de um
Governo liderado por uma personalidade independente ou apartidária que goza da
confiança do PR para essa função – os chamados governos de iniciativa
presidencial.
Perante um Governo de iniciativa presidencial a atuação da ANP deve
conformar-se à Constituição e ao interesse público mais do que aos interesses
do partido. O deputado deve representar o povo e não o partido.
Um Governo de iniciativa presidencial goza de igual legitimidade do Governo
que resulta do partido vencedor na legislatura em curso e está sujeito à mesma
fiscalização, de facto até maior, por parte da ANP, o que por sua vez reduz a
sua margem de erro junto da ANP, ao contrário de um Governo que resulte do
partido vencedor na legislatura em curso.
Observando certos limites temporais, pode o PR dissolver a composição em
curso da ANP com fundamento em grave crise política, devendo para o efeito o PR
considerar o parecer do Presidente da ANP, o parecer dos partidos políticos
representados na legislatura em curso (art. 69.º, n.º 1 alínea a) e ainda
considerar o parecer do Conselho de Estado (art. 75.º, alínea a) para
fundamentar a grave crise política que justifica a dissolução da ANP.
A ANP deve cumprir as suas funções e zelar para que a constituição seja
cumprida no seu seio e na atuação dos demais órgãos de soberania. No dissenso
institucional entre ANP e PR nenhum dos dois órgãos, diga-se grosso modo,
ganha.
A ANP pode desencadear a responsabilidade criminal do PR mas nada garante
que venha a ter sucesso, assim como o PR pode dissolver a ANP e verificar na
nova legislatura eleita que a força política com quem estava em manifesto
dissenso voltou mais reforçada.
Em todas as situações de dissenso entre PR e ANP deve prevalecer o
interesse do serviço à coisa pública, designadamente, a defesa da constituição
desde logo pela procura do normal funcionamento das instituições.
Não se alcançando consenso entre PR e ANP sobre situações em litígio que
prejudicam o normal funcionamento das instituições, por exemplo, quanto à
nomeação de PM, o PR deve devolver o poder ao povo para que vote por uma nova
composição da ANP e que da nova legislatura surja uma solução de consenso que
permita o normal funcionamento das instituições.
Note-se que uma das limitações constitucionais à dissolução da ANP é a de
que esta não pode ser dissolvida nos seus primeiros 12 meses, não podendo o PR
dissolver consecutivamente a ANP à procura de uma composição com forças mais
conformes à sua vontade.
A composição da ANP impõe-se obrigatoriamente ao PR nos primeiros 12 meses
da legislatura. Não estará a permitir o normal funcionamento das instituições o
PR que não consiga nomear um PM que goze da garantia de um normal funcionamento
junto da ANP e deverá por essa razão encontrar um fundamento para a sua
demissão com fundamento político, tal demissão do PR num primeiro mandato não
impede a sua apresentação às eleições imediatamente seguintes.
Por outro lado a ANP que sequestrada por interesses partidários não
permitir o normal funcionamento de um Governo poderá ser sancionada pelo povo
nas eleições a que for sujeita após a sua dissolução.
3.3. Governo
O Governo é o órgão executivo e administrativo supremo do Estado da
Guiné-Bissau compete-lhe essencialmente conduzir o país de acordo com o seu
programa aprovado pela ANP, em conformidade à constituição e demais leis.
O Governo é constituído pelo PM, o qual é o Chefe e Líder do Governo de que
faz parte. Ao PM compete dirigir e coordenar a ação do Governo, assim como
assegurar o seu regular funcionamento junto da ANP e do PR, tendo o PM especial
dever de informação ao PR acerca dos assuntos respeitantes à condução da
política interna e externa do país (art. 97.º, n.º 3), assim como informar os
deputados acerca dos assuntos sobre os quais estes o interpelem (art. 81.º).
A composição do Governo é determinada em primeiro lugar pelo PR ao nomear o
PM, tendo em conta os resultados eleitorais e ouvidas as forças políticas
representadas na ANP.
O PM é nomeado por escolha determinada pelo PR.
O PR ao formar a decisão de escolha do PM deve ter em vista dois critérios
essenciais à luz da constituição: i) a escolha deve recair sobre um guineense
com idoneidade e competências dignas à função que tenha a capacidade de reunir
os demais membros do Governo igualmente todos guineenses, com idoneidade e
competências dignas às respetivas funções e liderá-los na condução das
políticas do país; e ii) essa pessoa deve conseguir liderar o Governo com vista
ao seu normal funcionamento junto da ANP e do PR.
Um pressuposto essencial é que o PM deve ser da confiança do PR, é a
própria constituição que exige a existência de confiança especial entre PR e
PM, como acima já referido. Essa confiança é a expressão da legitimidade que o
PR empresta ao PM.
O PM não é eleito por sufrágio, nem é determinado direta ou indiretamente
pela força política que alcance a maioria na legislatura.
A legitimidade do PM não resulta apenas da legitimidade que lhe é
emprestada pelo PR, resulta também da legitimidade que lhe é emprestada pela
ANP.
A constituição proíbe a que um deputado possa ser membro do Governo, assim
é impossível que se verifique, por exemplo, o Presidente da ANP a acumular em
simultâneo as funções de PM e assim desvirtuar o equilíbrio de poder disposto
na constituição.
A escolha do PM não é determinada pela ANP, nenhuma deliberação da ANP
concorre para a escolha do PM. São as forças políticas representadas na ANP que
são convocadas pelo PR para se pronunciarem sobre a escolha da pessoa para PM,
tendo maior importância a pronúncia da força política com a maioria, pois a
participação desta – apesar frisa-se a independência de cada deputado perante o
partido pelo qual foi eleito não obstante depois a sua integração em grupos
parlamentares – poderá garantir ao Governo o seu normal funcionamento junto da
ANP.
A escolha do líder ou dirigente do partido político com a maioria na
legislatura para PM é uma escolha comum nos sistemas de governo
semi-presidencialistas, ou semi-parlamentares. Tal escolha visa obviar ao
problema da normal condução do Governo junto da ANP, entende-se que o líder do
partido maioritário pode determinar a formação da vontade dos deputados por si
eleitos e assim, exógeno à ANP, dispõe de um poder que permite ao Governo a maior
margem de manobra junto desta. Tal depara-se com um problema que a constituição
acautela suficientemente que é o de um dirigente, o líder do partido mais
votado nas legislativas, a dominar a ANP e o Governo, se este, por qualquer
razão que seja, tiver ascendente sobre o PR, verificamos o domínio de um
partido, ou de quase uma só pessoa, sobre todos os órgãos de soberania, ou seja
sobre todo o poder soberano – incluindo o poder judicial, pois a sua composição
depende em larga medida de determinações da ANP e do PR (art. 120.º, n.º 1 e 6,
art. 125.º, n.º 3) – o que é a constatação do total falhanço dos checks and
balances e do sistema de governo tal como disposto na constituição.
Na constituição compete à ANP, mas em especial ao PR, evitar o sequestro
partidário das instituições.
Na sua morfologia o Governo tem uma natureza dupla: i) singular, pois cada
ministro é o Governo no âmbito das suas competências e; ii) colegial por meio
das deliberações em conselho de ministros. Na constituição o PR pode, sempre
que o entender presidir ao Conselho de Ministros, o que evidencia no texto
constitucional o ascendente que o PR deve ter sobre todo o Governo e, em
especial, sobre o PM – com o qual deve se coordenar nesse exercício pois para o
normal funcionamento das instituições tal prática não pode servir para
substituir ou desvalorizar politicamente o PM.
O PR que perde a confiança em membros do Governo, mas que por razões que
lhe são próprias a mantém no PM, note-se que a confiança exigida entre PM e PR
é maior do que a exigida entre PR e os demais membros do Governo, pode
manifestar publicamente a sua decisão de demitir o Governo com vista a que a
nova composição do Governo, seja liderada pela mesma pessoa, mas com um
programa de governo novo, sujeito a nova investidura parlamentar e a nova identidade
coletiva junto dos órgãos de soberania e do povo que é a quem pertence o poder
e não aos partidos que melhor ou pior os representem.
3.4. Tribunais
Do já acima referido foram destacados os aspetos importantes dos Tribunais
para o sistema de governo do Estado da Guiné-Bissau, ficaremos no presente
artigo pelo já exposto.
4. Conclusão
A constituição da guiné-bissau vigora há 30 anos, com algumas interrupções,
mas tem feito um caminho que prova a sua suficiência para o quotidiano normal e
para as chamadas crises políticas, como a situação atual à data do presente
artigo e que muito determinou a que o mesmo fosse escrito.
Não são muitas as soluções para cada situação. Todavia, algumas delas são
más e outras boas. Tal reduz o leque de possibilidades e amplia a capacidade de
compreensão e de informação sobre cada uma.
Salvo melhor opinião.
Barreiro, 19 de Agosto de 2015.
Nota: Os artigos assinados
por amigos, colaboradores ou outros não vinculam a IBD, necessariamente, às opiniões neles expressas.
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