Habitantes de Gorongosa e Muxúnguè,
centro de Moçambique, consideram que os desencontros entre o Governo
moçambicano e a Renamo são "potenciais focos de instabilidade" e
estão a provocar um clima de insegurança naquelas zonas atingidas por recentes
confrontos militares.
Em declarações à Lusa, Feliciano
Matchisso, deslocado nas últimas confrontações, entre 2013 e 2014, na
Gorongosa, província de Sofala, disse que esperava "um 2015
apaziguado" mas que o agravamento da tensão política entre o Governo e a
Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), principal partido da oposição, "alimentam
incertezas" a centenas de pessoas que ainda se mantêm longe das suas
casas.
"Há muitos que saíram do campo de
deslocados para o interior, mas mantêm casas em bairros de reassentamentos,
porque ainda não há garantias de cessar-fogo completo. Aqui [na Gorongosa] são
mantidos os militares de ambas partes e, com o aumento das divergências, o medo
voltou", declarou Feliciano Matchisso.
Centenas de pessoas, dos cerca de seis
mil deslocados de guerra na Gorongosa, recusam-se a regressar às suas zonas de
origem, por considerarem que as condições de segurança permanecem instáveis um
ano após Acordo de Cessação de Hostilidades, que encerrou, a 05 de setembro do
ano passado, um conflito na região centro de 17 meses, entre as forças
governamentais e o braço armado da Renamo.
"Nós continuamos capim dos dois
elefantes em luta. Infelizmente estão a acontecer todas as divergências
político-militares sem se interessarem pelo nosso sofrimento. Dormimos atentos
todo o tempo, sem sossego, pois o dia que rebenta de novo não sabemos",
lamentou à Lusa outro deslocado, Chico Tantofaz, falando em chiduma, a língua
local da Gorongosa.
Também em Muxúnguè, no sul da província
de Sofala, voltou a ser assunto de conversa o receio de uma nova instabilidade,
com o rompimento do diálogo entre o Governo e a Renamo, e a recusa do líder da
Renamo, Afonso Dhlakama, para se avistar com o Presidente moçambicano, Filipe
Nyusi.
Durante 17 meses, até ao acordo de 05 de
setembro, assinado por Dhlakama e pelo ex-presidente moçambicano Armando
Guebuza, a Renamo condicionou o troço Save-Muxúnguè da única estrada que liga o
sul ao centro do país, cujo trânsito passou a ser feito com escoltas militares
obrigatórias do exército, ainda assim atacadas em emboscadas sistemáticas dos
homens armados da oposição, em confrontações que deixaram um número
desconhecidos de mortos e feridos, entre combatentes dos dois lados e também
civis.
"As pessoas ainda vivem um clima de
medo, com as frescas memórias dos ataques aqui [em Muxúnguè]. Apesar de a vida
parecer normal, as pessoas assustam-se muito com certas posições dos líderes
políticos. Nunca sabemos o dia de amanhã", declarou Abdul Ismael, um morador
local.
Também em declarações à Lusa, José Luís,
pároco de Muxúnguè, descreveu que o clima de insegurança ainda "não se
sente muito" ao nível da vila, mas alerta que a ameaça do retorno dos
confrontos pode voltar a paralisar a economia da região.
Moçambique vive momentos de incerteza,
devido às ameaças de Afonso Dhlakama de governar à força nas seis províncias em
que reivindica vitória nas eleições gerais de 15 de outubro do ano passado,
depois de ver o seu projeto de criação de autarquias provinciais rejeitado pela
maioria da Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique), partido no poder, na
Assembleia da República.
No final de agosto, Afonso Dhlakama
rejeitou um convite do chefe de Estado para se encontrarem e discutirem a paz,
acusando o executivo de movimentar as forças de defesa e segurança, em violação
do Acordo Geral de Paz de 1992 e o Acordo de Cessação das Hostilidades
Militares.
Também em agosto, o líder da Renamo
ordenou à delegação do seu partido para suspender a participação nas negociações
de longo-prazo com o Governo, argumentando com falta de seriedade por parte do
executivo, que, por sua vez, lamenta que nem um homem da oposição tenha sido
desarmado no âmbito do processo de diálogo.
//Lusa
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