Jesus continua a desvendar os horizontes
novos da mensagem que anuncia. Os discípulos são exortados e fixar o seu
coração em Deus Pai e a imitar o seu modo de proceder. Mesmo nas situações mais
complexas e intrigantes. Mesmo nos casos de violência e de injustiça, e na
relação com os inimigos. Com estas duas concretizações perfaz a lista que antes
havia enunciado: o homicídio, o adultério, o divórcio, e o falso juramento. E o
rosto feliz do discípulo fiel brilha como a luz do mundo e mantém a integridade
do sal da terra.
Jesus define a sua missão em relação à
lei e aos profetas como a de não anular ou desvalorizar, mas de elevar à
plenitude. Ele dá o exemplo. Umas vezes cumpre e exorta a que se cumpra
fielmente, outras reinterpreta, dá-lhes um sentido novo e pleno e recomenda a
sua prática: “Eu porém, digo-vos…”. Também nas relações com os violentos e
injustos, com os adversários e inimigos. E justifica a sua atitude com o modo
de ser e de proceder do Pai que está nos Céus. Mostra assim a beleza exigente
da sintonia do agir humano com a vontade divina.
Esta sintonia torna-se força dinâmica
para a relação entre as pessoas, chamadas a viver na história e a conviver em
sociedade. Com afirma Platão, no seu livro «O Banquete» dirigindo-se a um
comensal: “Que bom seria, Ágaton, se a sabedoria conseguisse passar do mais
cheio de nós para o mais vazio sempre que estivéssemos em contacto uns com os
outros, como a água que desliza nas taças, através de um fio de lã, da mais
cheia para a mais vazia”.
As declarações que Mateus, o evangelista
narrador, nos apresenta são contundentes: renunciar à rebelião perante a
injustiça, praticar a não-violência como estilo de vida e amar o inimigo.
Provocam uma verdadeira “revolução” pacífica. Introduzem uma nova escala de
valores que dão vida e configuram as relações humanas em todos os âmbitos.
Anunciam a tão desejada civilização do amor, onde o humano é espelho polido do
divino que há em nós como centelha de Deus na sua comunhão trinitária.
A declaração “olho por olho e dente por
dente”, conhecida em muitas culturas pela “lei de talião”, introduziu um avanço
grande nas relações sociais, pois definiu a igualdade de medida da retaliação
face ao crime praticado. Frequentemente não era assim. E por uma ofensa feita,
quantos castigos a mais eram praticados. E de ordem superior como por exemplo:
pelo roubo de animal, a morte de uma ou mais pessoas. Visava, pois, pôr cobro à
vingança arbitrária.
Jesus, com os quatro exemplos que dá,
surpreende e provoca. A injustiça e o mal não se vencem à força de mais
violência que gera nova injustiça e fomenta os instintos de morte. Só a força
do bem, pode vencer o mal. É preciso humanizar os códigos de vingança sem
limiites. E, se dúvidas houvesse, o seu exemplo na cruz do Calvário e as
palavras de perdão aos algozes e de confiança filial em Deus Pai seriam
suficientes para as dissipar. (Homilética, 2017, 1, 72).
O Papa Francisco na mensagem para o Dia
Mundial da Paz, a 2017, afirma: “desejo deter-me na não-violência como estilo
duma política de paz, e peço a Deus que nos ajude, a todos nós, a inspirar na
não-violência as profundezas dos nossos sentimentos e valores pessoais. Sejam a
caridade e a não-violência a guiar o modo como nos tratamos uns aos outros nas
relações interpessoais, sociais e internacionais. Quando sabem resistir à
tentação da vingança, as vítimas da violência podem ser os protagonistas mais
credíveis de processos não-violentos de construção da paz. Desde o nível local
e diário até ao nível da ordem mundial, possa a não-violência tornar-se o
estilo caraterístico das nossas decisões, dos nossos relacionamentos, das
nossas ações, da política em todas as suas formas”.
“Amai os vossos inimigos”, prossegue
Jesus, deixando certamente espantados os discípulos já incomodados com as
exortações anteriores. E quem não ficaria? E para não haver hesitações, o texto
continua: Amar, rezar e fazer bem. Fica destruída a lógica antiga: amar a quem
te ama, odiar a quem te quer mal. A novidade surpreende pela positiva. O modelo
do nosso proceder é o agir de Deus que trata a todos como filhos, faz nascer o
sol e cair a chuva sobre justos e corruptos. Ele é a misericórdia em acção.
Bela e inesgotável fonte de energia para a nossa vida quotidiana! Deus é assim.
Está definida a medida do nosso amor.
Amar o inimigo é fruto do dom de Deus
que vai amadurecendo em nós. Vive-se, quase sempre, como um processo em que,
embora se sinta a ferida da ofensa, não se deseja mal nem se alimenta ódio ou
vingança; admite-se fazer-lhe bem em caso de necessidade; espera-se e aproveita-se
uma oportunidade para dar uma saudação e, talvez, algumas falas; ir provocando
ocasiões de encontro; desinflacionar as emoções sentidas e abrir-se ao perdão,
se for solicitado; ser condescendente e reganhar uma certa simpatia; rezar como
Jesus na cruz e na aparição a Tomé, com a cicatriz ainda viva, dar e aceitar o
perdão fruto do amor misericordioso. Percurso exigente, mas redentor.
Desabrocha na alegria pascal.
Façamos nossa a oração que um colega de
curso me enviou no domingo último: “Senhor Tu vieste revitalizar a nossa
história pessoal; vieste potenciar o melhor de nós mesmos; Tu vieste dinamizar
a nossa existência; vieste despertar a nossa coerência e fraternidade; Tu
vieste falar ao coração de cada um de nós; e vieste pôr as pessoas acima das
normas. Obrigado Senhor Jesus! Ámen! Aleluia!
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