A reconquista da liberdade e do
território retirado durante a ocupação colonial motivou os líderes africanos a
negar qualquer tipo de opinião e acção política vinda da antiga metrópole.
A euforia e avidez pelo poder originou
uma nova liderança africana que acreditava ser dona do próprio destino, mas
ninguém deve intrometer-se nos assuntos que não lhe dizem respeito, nem ouvir
conselhos ou ter em consideração sugestões alheias.
Após a retirada do território africano,
os antigos colonos aconselharam os novos lideres a erguer um novo Estado. Para
o efeito era necessário adoptar uma democracia parlamentarista, pois seria o
modelo mais viável e profícuo para o desenvolvimento social e económico de
África. No entanto, muitos não viam essa proposta com bons olhos e as reacções
não se fizeram esperar.
A maior parte dos líderes africanos
encarava a democracia como um fardo pesado para o novo Estado, pois
consideravam-na uma “coisa dos brancos”. Segundo Paul Biya “África não tinha
uma cultura democrática e tudo isto não passava de uma imposição dos seus
colonos” (Shillington:1995,3). Neste contexto, a concordância seria uma má
escolha para África, pois poderia tirar ao povo a liberdade conquistada
arduamente.
Na altura pensava-se que os líderes
africanos deviam ser capazes de pensar pelas suas próprias cabeças e decidir
qual o modelo político e económico mais eficaz para conduzir à prosperidade
social e económica do povo africano. Essa aspiração era saliente no discurso do
Amílcar Cabral, fundador da nacionalidade da Guiné e Cabo-Verde, passamos a
citar: “o que quer o Homem africano é ter a sua própria expressão política e
social (…). Quer dizer, a soberania total do nosso povo no plano nacional e
internacional, para construir ele mesmo, na paz e na dignidade, à custa dos
seus próprios esforços e sacrifícios, marchando com os seus próprios pés e
guiado pela sua própria cabeça o progresso que tem direito como qualquer povo
do mundo” (Cabral; 1973 )
Os africanos estavam convictos que
apesar dos parcos recursos humanos, mas com os recursos naturais abundantes era
possível construir um novo Estado e devolver a esperança ao povo martirizado
durante a ocupação estrangeira.
Acima de tudo era importante consolidar
a “unidade africana” e para isso era fundamental criar um “partido único”. Esse
conceito foi aceite e começou a alastrar-se por toda a África, dando azo à
concentração do poder numa única pessoa, ao aparecimento de grupos de elite, ao
nepotismo e ao neopatrimonialismo que veio despoletar a luta entre facções
rivais para controlar o poder. Esta situação restringiu a liberdade de
expressão e a participação dos cidadãos na vida política, económica e cultural.
O propósito dos antigos colonos foi
rejeitado e passou a impor-se a agenda de governação dos novos líderes. Após
alguns anos, devido à falta de visão estratégica para o desenvolvimento do
continente e à política enviesada centrada em torno dos interesses individuais
instalados, a economia africana começou a dar sinal de fadiga e caos em todos
os quadrantes sociais.
Esta situação obrigou a maioria dos
Estados africanos a pedir ajuda aos seus antigos colonos, pois só assim seria
possível ultrapassar a penúria em que se encontravam. Porém, eles recusaram e a
indigência acabou por se tornar uma realidade. E quando os Estados africanos
pediram apoio financeiro, pela segunda, para atenuar a pobreza extrema,
foi-lhes proposto que aceitassem o sistema democrático multipartidário ou
recusariam a ajuda financeira. Citando Bush filho “estás connosco ou és nosso
inimigo” (Publico:2001).
Foi-lhes feito um ultimato e como quem
necessita tem que se sujeitar às exigências dos outros foram obrigados a
vergar-se e a anuir sem contrapor o solicitado.
Por um lado, a democracia acabou por ser
aceite e, por outro, o dinheiro desembolsado permitiu continuar a senda de
práticas ilícitas.
Perante o caos que se vive na maioria
dos estados africanos, sobretudo a dificuldade de pensar e agir pela sua
própria consciência, podem ser lançadas várias questões, nomeadamente,
identificar o motivo que tem impedido o desenvolvimento dos países africanos.
Neste âmbito, o Presidente da República
do Conacri e em exercício da União Africana, Professor Alfa Condé, numa
entrevista, enfatizou que “a interferência estrangeira está na origem da
maioria dos problemas em África” (E-global: 2017). Deste modo, defendemos a
prossecução do nosso caminho, pois só assim seremos capazes de materializar os
ideais que nortearam a nossa luta de libertação do continente africano contra
subjugação colonial.
Perante o exposto, colocam-se as
seguintes questões:
Será que a consolidação da coesão nacional, após a independência, era deveras premente para o desenvolvimento social e económico de África?Será que a unidade nacional que ditou a vitória na luta pela independência não era suficiente para permitir a construção de um Estado novo?Se não fossem as atrocidades e a barbárie cometidas contra o povo, no período subsequente a independência, será que a unidade nacional desagregaria?Será que os líderes africanos tinham razão quando rejeitaram a democracia, e adoptaram um regime despótico?Se a democracia tivesse sido adoptada quando a maioria dos Estados se tornaram livres e independentes teria contribuído significativamente para a maturação e para o despertar de consciência cívica do povo?Será que a África está preparada para continuar a ter a democracia como sistema?O que mudou em África com a terceira vaga de democracia?
Em suma, podemos concluir que:
Apesar de, aparentemente, sermos livres
e independentes e termos o pleno direito de conduzir a política interna,
enquanto autonomia dos poderes dos Estado conforme o estabelecido no Tratado de
Vestefália de 1648, citamos: “Soberania significa um poder que não reconhece
outro a ele superior, seja no plano intra-estatal (independência), seja no
plano interno (supremacia), a maioria de estados depara-se, ainda, com enormes
dificuldades para levar a cabo as suas políticas internas.
O referido tratado, após Estados Unidos
de América (EUA) ter sofrido um rude golpe devido ao ataque terrorista às
torres gémeas – World Trade Center, padeceu de profundas alterações devido à
pretensão das potências hegemónicas ou dos Estados mais ou menos organizados,
em querer impor a sua vontade e políticas através do direito à “ingerência nos
assuntos internos dos Estados”.
Porém, ainda, estamos muito longe de
fazer vincar a liberdade de pensar pelas nossas próprias cabeças e agir.
Nota: Os artigos assinados por amigos, colaboradores ou outros não vinculam a IBD, necessariamente, às opiniões neles expressas.
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