[…] garante-lhe que é preciso nascer de novo, nascer da água e do Espírito Santo. Esta garantia constitui um pré-anúncio do baptismo cristão, que a Igreja organizará e celebrará em forma de ritual.
Jesus deixa a casa de Nazaré onde vive
em família para iniciar a fase de missionário itinerante e anunciar a nova
situação a criar com a chegada do reino de Deus. Na escola familiar de Nazaré,
cresceu em idade, sabedoria e graça, apetrechando-se com os meios
indispensáveis ao bom desempenho da sua missão. Em Nazaré, convive com os
vizinhos e outro povo, escuta as histórias de um passado memorável, vê o
realismo da vida em sobriedade digna e sonha com uma situação nova no futuro
que se avizinha. Deixa a casa e encaminha-se para a zona do rio Jordão onde o
primo João estava a baptizar. A abundância e a qualidade da água, o bom
ambiente natural e a fertilidade dos campos, fazem do local um sítio atraente e
simbólico de novas realidades.
Lucas, no seu estilo peculiar, faz uma
narrativa tão viva que impressiona o leitor atento. (Lc 3, 15-16 e 21-22). A
Igreja celebra hoje a festa solene do baptismo de Jesus. Em leitura litúrgica,
são cortados os versículos que se referem à denúncia da vida marital de Herodes
e a outras maldades. Vamos deter-nos em alguns pontos marcantes do texto
proposto e reflectir sobre a mensagem que apresentam e nos pode interpelar,
tendo em conta o nosso próprio baptismo.
“Para Jesus, afirma a Bíblia Pastoral em
comentário, o baptismo é um episódio no meio do baptismo de todo o povo.
Solidarizando-se com o povo, Jesus começa o tempo do baptismo no Espírito, isto
é, a formação do povo de Deus que vai construir a nova história”. Começa e
prossegue até consumar o envio do Espírito Santo, no Pentecostes, no termo do
tempo pascal. De permeio, fica a missão realizada com amor de doação total e o
assumir as consequências desta doação livre: o baptismo de sangue no processo
do Calvário. Baptismo que Deus Pai confirma com a feliz e definitiva
ressurreição.
Com este horizonte aberto, podemos
apreciar cada passo do texto que comentamos: A expectativa do povo, a suspeita
fundada em relação a João, a sua honestidade transparente, a fila dos
penitentes, de que se destaca Jesus, o baptismo, e o que acontece enquanto Ele
faz oração. Destes pontos, destacamos dois: A expectativa e os factos que
envolvem a oração.
A promessa do Messias surge com os
profetas antigos e ainda não havia sido cumprida. Há anúncios que reforçam a
esperança. Chegam configurá-la com rosto humano. Isaías, na 1ª leitura de hoje,
dá-lhe o nome de servo, o protegido, a quem é confiada a missão de levar a
justiça às nações. Lucas, nos Actos dos Apóstolos, apresenta Pedro a afirmar em
casa de Cornélio que Jesus é o enviado de Deus para anunciar a paz; que foi
ungido pelo Espírito Santo; que passou a vida a fazer o bem e a curar todos os
oprimidos pelas forças do mal. E conclui: “Porque Deus estava com Ele”. As
expectativas vêem-se realizadas: É Jesus que está na fila dos penitentes para
ser baptizado. E nós que expectativas alimentamos na vida? Onde pomos a nossa
esperança? É realmente Jesus Salvador que buscamos?
“Enquanto orava”, anota Lucas que refere
de passagem o baptismo, mas se detém neste momento solene. O que acontece,
desvenda a experiência singular de Jesus. Ele mergulha na comunhão com o Pai
que sempre o acompanha. Ele abre de novo o acesso a Deus, ao Céu. Ele acolhe o
Espírito Santo que o consagra para a missão e, como uma pomba, o guia nos
caminhos a percorrer e nas opções a fazer. Ele escuta a voz do Céu que o
credencia como Filho bem-amado. “Em Ti pus toda a minha complacência”.
“A oração, adianta Manicardi, é
experiência de comunhão com Deus, o Pai; … tanto para Jesus como para o cristão
é ocasião de conhecer o amor de Deus: «Tu és o meu Filho, o amado. …
Experiência de amor recebido, a oração torna-se lugar de nascimento sempre
renovado para o seguimento de Cristo, sob a acção do Espírito”.
Jesus, no diálogo com Nicodemos,
garante-lhe que é preciso nascer de novo, nascer da água e do Espírito Santo.
Esta garantia constitui um pré-anúncio do baptismo cristão, que a Igreja
organizará e celebrará em forma de ritual. E surgirá o nosso baptismo. Vamos
parar e rememorar o que aconteceu nesse dia. Talvez nos ajude visualizar o que
se faz hoje na comunidade eclesial: familiares, pessoas amigas, ambiente,
palavras e cânticos, festa.
A novidade ocorrida na celebração, após
o rito da água, é expressa por breves orações acompanhadas de gestos comuns que
têm um sentido singular: A unção do crisma da salvação para permanecer membros
do povo de Deus; a veste branca da graça para, com a ajuda de todos, ser
conservada sem mancha de qualquer pecado; a vela da fé, acesa no círio pascal
de Jesus Cristo, para iluminar todas as opções de vida e irradiar nos caminhos
de tantos outros; o abre-te para ser possível de, em breve, ouvir a Palavra de
Deus que é Jesus e professar a fé.
Perante tal maravilha, ocorre uma
pergunta fundamental: Estou baptizado, mas sou cristão? Pergunta que recebe
resposta na vida do dia-a-dia. As minhas acções, ainda que discretas, são
profissões de fé? Escuto e procuro compreender a Palavra de Deus? Há pessoas
que querem seguir o meu exemplo? Aproveito as ocasiões de pecado para fazer
brilhar as virtudes? Sinto-me verdadeiramente membro do Povo de Deus que, entre
nós, se organiza em Igreja, sobretudo na diocese e na paróquia?
Oxalá, as respostas a estas e a outras
perguntas credenciem o nosso caminhar ao longo do Ano, agora iniciado. Que o
Espírito Santo nos guie e abençoe!
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