Caros
compatriotas,
Enquanto Presidente da República, Chefe
do Estado, garante da Constituição e do normal funcionamento das Instituições
da República, dirijo-me a vós, mais uma vez, num momento particular da nossa
caminhada colectiva para a consolidação do Estado de Direito e das nossas
instituições democráticas, com uma única preocupação: garantir o melhor para a
Guiné-Bissau e o nosso povo.
Depois de ter falado à Nação e de ter
vindo interpretar o sentimento da Nação, reuni o Conselho do Estado, órgão
constitucional de consulta do Presidente da República, a fim de auscultá-lo
sobre a actual crise política e o seu reflexo no normal funcionamento das Instituições
da República.
Também tive oportunidade, na passada
terça-feira, de receber em audiências separadas, os líderes dos partidos
políticos com assento parlamentar, com igual propósito de os ouvir sobre a
mesma matéria.
A estas auscultações associei os
representantes permanentes dos nossos parceiros internacionais, nomeadamente,
Nações Unidas, União Europeia, União Africana, CEDEAO e CPLP, no quadro dos
esforços colectivos de busca de uma solução política para a crise despoletada
na Assembleia Nacional Popular.
Na mensagem que dirigi à Nação no
passado dia 19 de Abril, manifestei que entendia ser “(…) a vez dos Digníssimos
Deputados da Nação, porquanto legítimos representantes dos interesses do Povo
na Assembleia Nacional Popular, darem mostras de maturidade política que lhes é
reconhecida e oferecerem ao povo que representam uma solução para esta
inusitada crise política (…)”.
Infelizmente, não obstante todos os
esforços de diálogo e mediação nacional realizados pelas organizações da
sociedade civil, da assistência da comunidade internacional residente, do
empenho pessoal do Enviado Especial dos Chefes de Estado e de Governo da
CEDEAO, da iniciativa do Presidente da Assembleia Nacional Popular, não foi,
mesmo assim, possível encontrar-se uma solução para esta crise política, com
epicentro na ANP, mas cujas réplicas têm afectado negativamente o funcionamento
das instituições da República, em geral, e do Governo, em particular.
Mulheres
e Homens Guineenses,
Perante situações de grave crise
política, como esta que vivemos hoje, para além da opção política no âmbito da
minha magistratura de influência, a nossa Constituição da República confere ao
Chefe de Estado dois instrumentos constitucionais com a virtualidade de corrigir
e repor o seu normal e regular funcionamento, a saber:
Primeiro, encorajar o actual
Primeiro-Ministro a encetar diligências no sentido de estabelecer compromissos
e operar uma remodelação profunda do Governo, por forma a permitir que este
tenha o apoio maioritário do Parlamento e garantir a estabilidade governativa
até ao fim da legislatura (proposta essa apresentada na minha Mensagem do Fim
do Ano e retomada no Projecto do Acordo Político de incidência Parlamentar para
a Estabilidade Governativa);
Segundo, dissolver a Assembleia Nacional
Popular, com a consequente convocação de eleições legislativas antecipadas;
Terceiro, demitir o Governo e iniciar um
processo de audição às forças políticas representadas na Assembleia Nacional
Popular, tendo em vista a nomeação de um novo Primeiro-Ministro capaz de formar
um Governo que tenha o apoio maioritário no Parlamento.
Se a primeira opção era, já de si,
remota, a mesma ficou inviabilizada perante o teor irresponsável e inadmissível
do Comunicado do Conselho de Ministros, de 11 de Maio de 2016, na medida em que
o Primeiro-Ministro e o Governo são politicamente responsáveis perante o
Presidente da República.
Relativamente aos dois poderes
discricionários, cabe ao Chefe do Estado assumir a responsabilidade de ponderar
e decidir qual das soluções se afigura mais adequadas aos superiores interesses
do nosso país e do nosso povo.
Ambas as medidas têm custos, pelo que
terei que optar por aquela que considero constituir, no actual contexto, um
“mal menor” e com menos prejuízos para o nosso já martirizado povo.
A dissolução da ANP e consequente
convocação de eleições legislativas antecipadas deve ser ponderada tendo em
conta, por um lado, as suas implicações financeiras e, por outro, a dimensão
moral dessa opção.
Quanto ao primeiro aspecto, convém
referir que o nosso país não dispõe de recursos financeiros próprios para
custear novas eleições legislativas. Decorridos apenas dois anos depois da
Comunidade Internacional nos ter pago, com o dinheiro dos seus contribuintes, a
realização de eleições por todos reconhecidas como livres, justas e
transparentes, não é dignificante voltarmos a estender a mão para a realização
de mais um acto voluntário de soberania.
Por outro lado, e tendo em conta a
fragilidade das nossas instituições, não é sensato sacudir o país com eleições
no actual estado de crispação e forte clivagem social.
Mas, mesmo que estas razões não fossem
suficientes e mesmo que tivéssemos dinheiro ou este nos fosse oferecido pela
Comunidade Internacional, esse dinheiro, em nossa opinião, seria certamente
mais merecido e melhor empregue na educação dos nossos filhos e na saúde e
melhoria das condições de vida das nossas populações.
Mais, num país em que a maioria das
crianças não frequenta a escola por falta de menos de 10 mil Francos CFA; num
país em que ainda há famílias inteiras que se alimentam com menos de 10 mil
Francos CFA por mês; num país em que mães e crianças morrem diariamente nos
hospitais por falta de menos de 10 mil Francos CFA, é imoral pedir-se que sejam
desviados mais de 10 milhões de Dólares dos sectores sociais como a saúde e
educação para realização de eleições legislativas antecipadas unicamente para
satisfazer caprichos democráticos; apenas porque não somos capazes de criar
coesão e unidade interna nos partidos simplesmente porque somos incapazes de
gerar consensos parlamentares; ou pura e simplesmente porque ambicionámos
voltar a ter acesso aos privilégios associados à governação.
Finalmente, eleições legislativas
antecipadas não são o meio idóneo para resolver problemas de disciplina, coesão
ou unidade interna de partidos políticos.
Caros
compatriotas,
Como Presidente de todos os guineenses,
registamos com preocupação algumas movimentações de sectores bem delimitados da
nossa sociedade político-civil, com o intuito de pôr em marcha uma agenda
política de caos social, tendo como pano de fundo a promoção da alteração da
ordem constitucional para justificar e provocar as ditas “eleições gerais”
antecipadas.
Porque razão os promotores dessas
iniciativas não encorajam os seus filhos e familiares próximos a participarem
nelas?
Exortamos, por isso, a esses nossos
irmãos, bem como a todos os guineenses em geral para manterem uma postura de
serenidade democrática, muita contenção e máxima responsabilidade, abstendo-se
assim da prática de quaisquer actos que possam pôr em causa a paz e a coesão
nacional.
No exercício das funções de Presidente
da República não tenho o direito de ter estados de alma, mas tenho, a obrigação
de preservar a dignidade e integridade das instituições, pelo que, na justa
medida, serão accionadas todas as medidas preventivas de actos susceptíveis de
pôr em causa a autoridade do Estado e que sejam julgados necessários para
garantir o respeito pela Constituição e assegurar o regular e normal
funcionamento das Instituições da República.
Mulheres
e Homens Guineenses,
É nossa profunda convicção que, sob o
véu do aparente bloqueio do regular e normal funcionamento da Plenária da
Assembleia Nacional Popular, encontra-se um problema congénito de fundo que o
actual Governo não conseguiu superar: a carência de legitimidade política para
entrar em plenitude de funções.
Um Governo há muito empossado, mas até
então sem Programa nem Orçamento Geral do Estado aprovados pelo Parlamento,
padece do vício da incapacidade política para gerar confiança e criar as
melhores condições político-institucionais para a sua entrada em plenitude de
funções. O actual Executivo encontra-se numa situação de caducidade objectiva
da caução de legitimidade política que lhe foi conferida pelo prazo
constitucional de 60 dias no acto da sua investidura em 13 de Outubro de 2015.
É constrangedor ver o Governo da
Guiné-Bissau a falar em voz baixa nos fóruns internacionais porque não tem
legitimidade plena. Não é mais sustentável permitir que o Executivo continue a
contrair dívidas, realizar despesas e emitir títulos de tesouro sem que haja um
Programa de Governo e a sua quantificação financeira aprovados pelo Parlamento.
É intolerável que o Governo escolha, em função dos seus interesses
circunstanciais, as decisões judiciais que lhe apeteça cumprir,
instrumentalizando para tanto as forças de segurança.
Nem se diga que o problema não é o
Governo, mas sim a Assembleia Nacional Popular. Não podemos confundir a causa
real com a causa virtual ou aparente do problema institucional que vivemos.
O problema real é o Governo. Por isso é
que em todos os cenários, de A a Z, todos os exercícios de busca de consenso
para saída da crise que me foram apresentados incidem sobre o Governo. Não há
nenhum cenário para a saída da crise que consista na divisão de Comissões
Permanentes da ANP, Conselheiros do Presidente da República ou Assessores do
Supremo Tribunal de Justiça.
Sejamos honestos. Hoje, o problema, ou
melhor, a solução é a composição de um Governo que reflicta os sentimentos
maioritários do povo representado no Parlamento e que lhe permita governar em
condições de estabilidade.
Guineenses,
Vamos assumir, por hipótese, que fazemos
eleições antecipadas. As mesmas vão ser, seguramente, livres, justas e
transparentes e o nosso povo vai voltar a demonstrar a sua maturidade cívica,
democrática e política.
E se depois das eleições legislativas
voltar a haver um bloqueio na ANP? Voltamos a fazer eleições legislativas
antecipadas para desbloquear a ANP?
Se a Assembleia Nacional Popular está
bloqueada é da responsabilidade dos Deputados desbloqueá-la. Nesta legislatura
não há alternativa ao diálogo político!
Meus
irmãos,
É chegada a hora de as lideranças
político-partidárias revelarem maturidade política e ultrapassarem as miudezas
institucionais que estão a empatar a saída desta desnecessária crise.
Perante o estado em que as coisas
chegaram, vou optar pela decisão que responsabilize as lideranças partidárias,
dando-lhes a soberana oportunidade para provar que colocam os superiores
interesses da Nação e do povo acima dos seus interesses pessoais, de grupos ou
partidários. Vou optar por uma decisão que obrigue os actores políticos a
encontrarem uma solução governativa no quadro parlamentar resultante das
últimas eleições legislativas.
Neste contexto, caberá ao partido
vencedor das eleições legislativas assumir, primeiramente, a responsabilidade
de apresentar uma solução governativa capaz de merecer a confiança política da
maioria do Parlamento. Como já disse, nesta legislatura não há alternativa ao
diálogo político!
Continuo a acreditar, à semelhança da
maioria do povo guineense, que ainda há condições para que, no quadro da
configuração parlamentar resultante das últimas eleições legislativas, os
Deputados eleitos pelo povo sejam capazes de estabelecer compromissos políticos
que permitam criar condições de estabilidade governativa até ao fim da presente
legislatura.
Para terminar, lanço um veemente apelo
às diferentes estruturas sindicais no sentido de suspenderem as greves em curso
no país, tendo em conta o estado de fragilidade e de incapacidade do Governo
para assumir compromissos, como forma de demonstrarem um gesto de solidariedade
nacional para com o nosso povo.
Como sempre, vou assumir as minhas
responsabilidades!
Que Deus abençoe a Guiné-Bissau e o seu
povo!
Bissau, 12 de Maio de 2016.
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