segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Homilia do bispo durante peregrinação a Cacheu



Os fiéis cristãos cumpriram este fim-de-semana (sábado) a peregrinação ao Santuário Mariano de Nossa Senhora de Natividade de Cacheu.

A peregrinação subordinada ao tema, “Djuntu ku Maria nô ianda na kaminhu de fé”, antecede, na proximidade do Natal, a festa solene da Imaculada Conceição de Maria.

Celebrou a liturgia, o Bispo Auxiliar da diocese de Bissau, Dom José Lampra Cá, que começou sua pregação com saudações aos bispos concelebrantes, às autoridades civis, aos representantes das outras confissões religiosas e aos fiéis cristãos presentes.

Depois continua o Bispo:

No tempo do Advento, a festa da Imaculada Conceição de Maria nos alenta no caminho da esperança. Somos conscientes dos nossos erros e pecados. Mas, apesar disso, Deus quis oferecer à humanidade um horizonte de perdão e de misericórdia, de graça e de beleza.

Por isso, a solenidade da Imaculada Conceição infunde em nossos corações uma grande alegria, porque nos reconduz ao início da nossa salvação. É uma vitória divina tornada possível antecipadamente pela paixão e ressurreição de Jesus, que vence o pecado de modo radical e definitivo.

Uma grande alegria invade o nosso coração em sabermos que existe uma criatura humana em relação a qual o mal não teve nenhum poder, uma criatura que não foi atingida pela perversão do mal, mas que foi completamente preservada dele.

A primeira leitura nos lembra o pecado original e a situação infeliz que dele derivou. Mas, na narração do Génesis temos já uma promessa de salvação: «... Estabelecerei a inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e a descendência dela. Esta há-de atingir-te na cabeça e tua a atingirás no calcanhar». Entre a serpente, símbolo do mal, e a descendência da mulher, existe uma hostilidade recíproca, mas a serpente não tem o mesmo poder da descendência da mulher.

A Imaculada Conceição é, ao mesmo tempo, um privilégio e um ideal (modelo).

É um privilégio porque Maria é a única pessoa que teve desde o início da sua existência, a perfeição da pureza; ser imune de qualquer pecado; possuir e viver a amizade de Deus, como nenhuma outra criatura possuiu e viveu.

Maria é a primeira criatura que não tem de se esconder de Deus, que não sente vergonha que Deus possa descobrir em si o pecado. Quando o homem, por palavras e acções cai no pecado do orgulho, de querer ser tanto como Deus, desprezando seus mandamentos e convites, não sente coragem para ser «visto» de Deus, foge d’Ele, como Adão e Eva, como Caim.

Maria não foge, porque não tem cumplicidade com o mal, com o orgulho de querer ser mais, de querer ser como Deus. Ela toma a atitude própria da humilde escrava que aceita plenamente a palavra do Senhor (cf. Lc 1, 38). Pela sua plenitude de graça, pode abrir-Se e abre-Se efectivamente ao olhar, às palavras e às propostas do Senhor. Foi Deus-Pai quem a preparou assim, para ser a Mãe do Seu Filho bem-amado.

Vemos, pois, o papel totalmente livre da criatura ao aceitar sem condições o plano de Deus e a realização total do plano sem violar a liberdade humana.

Mas, ao mesmo tempo, a Imaculada Conceição é um modelo, um ideal: todos nós somos chamados a sermos «na caridade, santos e imaculados diante d’Ele», como nos diz a segunda leitura.

No início da Carta aos Efésios Paulo bendiz a Deus «que nos encheu com toda a espécie de bênçãos espirituais em Cristo... nos escolheu antes da criação do mundo, a fim de sermos, na caridade, santos e irrepreensíveis diante d’Ele». Este é o projecto que tinha para nós antes da criação do mundo, um projecto que Ele nunca renunciou. Quando aconteceu o pecado, Deus manteve, por amor, este seu belíssimo projecto de ter filhos e filhas santos e imaculados, na caridade, que é o amor mais autêntico, mais generoso e mais profundo.

A santidade cristã, de facto, não é uma santidade de separação, mas de amor. Ser imaculados significa certamente afastar-se do mal, mas não dos outros. A Imaculada Conceição não separa Maria das outras pessoas, mas a prepara para um amor maior e mais universal, prepara o seu coração a doar-se com uma generosidade ilimitada para o bem de todos, em união ao sacrifício do seu Filho.

Esta festa de Maria leva-nos a celebrar uma nova criação. Nossa oração de hoje brota duma profunda alegria. Alegria de sabermos que, o que a Eva pedeu, “a Mãe de todos os viventes”, felizmente foi recuperado graças ao Avé que o anjo Gabriel dirige a Maria, Mãe de todos os redemidos.

Hoje nos é repetido o relato evangélico da Anunciação a Maria. Nele escutamos as palavras que lhe dirige o anjo do Senhor: “Maria, não tenhas medo, pois achaste graça diante de Deus”. Esta saudação transforma Maria na imagem de todo o género humano. Com ela, inicia-se o grande Advento da história humana. Com ela renasce a esperança.

A partir do mais profundo da sua existência, Maria reflecte fielmente a misericórdia de Deus e sabe traduzí-la na fidelidade. Maria gozou, durante toda a sua vida, da plenitude da graça e da salvação. Foi uma pessoa fiel, em tudo, ao projecto de Deus.

A sintonia de Maria com a salvação oferecida por Deus à humanidade, é um dom gratuito; porém encontrou nela uma resposta livre e generosa. O seu sim é um sim activo em que voluntariamente Se sente comprometida, com todas as consequências, no Mistério de salvação que Seu Filho inicia. É um acto de generosidade. Como os outros homens, podia ter-se refugiado no egoísmo. Não é o sim de certas atitudes ou de certas horas da vida; é um sim de consagração, doação total, em atitude de escrava que não reclama direitos e liberdades. É adesão pessoal a Cristo, cooperando com «fé livre e com inteira obediência»; «por esta obediência tornou-Se causa de salvação para si mesma e para o género humano» (L. G. nº 56).

No dia 23 de Novembro passado, foi feito o encerramento do Ano da Fé a nível das paróquias das nossas Dioceses; e no dia 24 de Novembro, festa de Cristo Rei, o Papa Francisco encerrou oficialmente o Ano da Fé, que havia convocado o seu predecessor, Bento XVI, Papa Emérito.

Hoje, nesta ocasião solene, queremos, a nível das nossas Dioceses, fazer o encerramento oficial do Ano da Fé. Encerrar o Ano da Fé não significa que tenhamos superado o exame. A fé é um dom que nos foi dado, como a Maria, porém, deve ser acolhido com gratidão. A fé é um caminho que se deve percorrer pacientemente. É uma pequena planta que se tem de regar com mimo. A fé tem que ser testemunhada com coerência de vida.

Neste caminho de fé, somos convidados a olharmos para Jesus e Maria. Na sua carta “A Porta da Fé”, Bento XVI no-los apresentava como modelos de crentes. Jesus confiou sempre em Seu Pai Celeste, foi fiel à Sua vontade, viveu com fidelidade à sua missão. Maria foi saudada por Isabel como “Bendita por ter acreditado”. Acreditar na Palavra do Anjo na Anunciação.

Sim, com Maria, caminhemos à luz da fé, como reza o lema da peregrinação deste ano.

«Feliz de ti que acreditaste, porque se vai cumprir tudo o que te foi dito da parte do Senhor» (Lc 1,45), ou seja, «Feliz aquela que tem fé…».

Maria é grande pela sua maternidade, para a qual foi escolhida. Mas a promessa, como diríamos, desta maternidade foi a sua fé. Sim, verdadeiramente «felizes as entranhas que trouxeram Jesus e o amamentaram» (Lc 11,27), mas sobretudo «felizes os que escutam a palavra de Deus e a metem em prática».

Maria é verdadeiramente a primeira entre estes. Maria é, antes de tudo aquela que escutou a Palavra de Deus, a guardou cuidadosamente, a meditou, a aprofundou. Duas vezes S. Lucas nota esta preocupação de Maria, de guardar e meditar dentro do seu coração a Palavra (Lc 2,19.51).

Além disso, Maria é aquela que traduziu esta fé, fruto da sua escuta e da sua meditação, numa vida quotidiana, e mais ainda numa vida singular e única. A fé em Maria foi, como deve ser em nós, personalizada, foi uma resposta pessoal, única, irrepetível a um desígnio singular, único e irrepetível.

A fé de Maria é uma fé profética. Ela abre-se imediatamente ao anúncio, ao testemunho. Torna-se missão no mundo. É o que podemos tirar do episódio da visita de Maria a Isabel. É um dos episódios chave para conhecer, na perspectiva evangélica, a personalidade, a missão de Maria. O Espírito Santo que está em Maria mete tudo em obra nela: vai depressa, mete-se em viagem, entra na casa de Zacarias, saúda Isabel, leva a alegria e uma efusão do Espírito Santo, que se torna uma alegria interior, até mesmo para a criança ainda dentro do seio materno, torna-se cântico, torna-se comunhão e serviço fraterno. Não temos aqui todo o programa da vida cristã? ... É possível sermos profetas hoje no nosso tempo, na nossa terra? Profetas, não no sentido de quem prediz o futuro, mas no sentido de anúncio e denúncia com a própria vida... (referência a Nelson Mandela como modelo de profeta do nosso tempo: profeta de reconciliação, de perdão, de fraternidade, de justiça, de verdade, de liberdade... ).

E o «Magnificat» não é por acaso, um compêndio do anúncio evangélico?

É o anúncio das maravilhas de Deus: «o qual fez grandes coisas». Toda a Bíblia, da primeira à última página afirma isso.

O canto de Maria denuncia ainda a malícia do homem fechado a Deus, o rico, o soberbo, o potente, e proclama, ao contrário, a bem-aventurança dos pobres, dos pequenos, dos famintos, antecipando assim o grande anúncio das bem-aventuranças, para convidar os homens a abrir-se completamente ao dom de Deus que em Cristo é oferecido a todos os homens…

Durante o Ano da Fé, o Papa Francisco publicou uma carta encíclica, que tem por título “ Lumen Fidei = A Luz da Fé” e no dia do encerramento do mesmo, no dia 24 de Novembro passado, publicou a exortação apostólica intitulada “Evangelii Gaudium = Alegria do Evangelho”. E conclui os dois documentos com uma preciosa invocação a Maria que hoje quero lembrar neste momento oportuno:

A Maria, Mãe da Igreja e Mãe da nossa fé, nos dirigimos, rezando-Lhe:

Ajudai, ó Mãe, a nossa fé.

Abri o nosso ouvido à Palavra, para reconhecermos a voz de Deus e a sua chamada.

Despertai em nós o desejo de seguir os seus passos, saindo da nossa terra e acolhendo a sua promessa.

Ajudai-nos a deixar-nos tocar pelo seu amor, para podermos tocá-Lo com a fé.

Ajudai-nos a confiar-nos plenamente a Ele, a crer no seu amor, sobretudo nos momentos de tribulação e cruz, quando a nossa fé é chamada a amadurecer.

Semeai, na nossa fé, a alegria do Ressuscitado.

Recordai-nos que quem crê nunca está sozinho.

Ensinai-nos a ver com os olhos de Jesus, para que Ele seja luz no nosso caminho. E que esta luz da fé cresça sempre em nós até chegar aquele dia sem ocaso que é o próprio Cristo, vosso Filho, nosso Senhor.

Finalizou o Bispo auxiliar Dom Lampra Cá, rezando com os fiéis a “Estrela da nova evangelização”.

//Sol  Mansi

1 comentário :

  1. Que Deus seja louvado na nossa terra da Guiné e que nos ilumine a viver a nossa fé

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