sexta-feira, 27 de junho de 2014

Guiné – Bissau, Insustentável leveza do ser


Por, José Fernando Gomes

A atitude do governo e diplomacia de Portugal em relação à Guiné-Bissau, atingiu ontem um pico de ligeireza e má-fé. Numa cimeira da União Africana, amesquinharam a CEDEAO chamando-lhes «um grupo de países das imediações», propondo alargar a ECOMIB à CPLP (falam despudoradamente de uma posição da CPLP que se desconhece onde e quando foi assumida e sem sequer referir a própria organização anfitriã, a UA). Trata-se de uma tentativa tardia e desinformada para converter a maior derrota da sua política externa dos últimos anos em algo parecido com uma desforra: qualquer pequena «capitalização» lhes serviria de compensação para a grande carga de esforços ingratos que despenderam ao longo de dois anos, tentando obstruir o processo de transição.

Agora que a transição chegou ao fim, é urgente uma clarificação por parte dos novos órgãos de soberania recém-empossados, em defesa da soberania nacional e desmarcando-se destas tentativas, por parte deste «eixo do mal», para se assumirem como patronos das suas candidaturas às eleições guineenses, transformando-os em simples «peões» (como já lhes chamaram) de estratégias que nem sequer podem ser consideradas neocolonialistas, pela sua inconsistência ao serviço de meia dúzia de interesses mesquinhos, sem sequer uma visão clara subjacente. Mesmo que tenham recebido apoios de certos países para a sua eleição, estão agora revestidos de uma nova dignidade e não devem cuspir no prato que lhes entregaram, sob pena de macularem desde já a sua legitimidade... e sustentabilidade.

A Guiné-Bissau está acima de qualquer compromisso que tenham assumido, deverão doravante evitar alinhar com estas estratégias... Correndo o risco de me repetir, quem quer ser governante de um país militarmente ocupado? O país que «aceitaram» e receberam, depois de terem concorrido às eleições é um país na sua integridade, esperando-se que a força que veio para garantir o processo de transição retorne a casa com o sentimento do dever cumprido e não que seja reforçada por mais forças, criando um foco de instabilidade e de desinteligências entre várias organizações, em prejuízo da soberania e do povo da Guiné-Bissau. Pensar pelas próprias cabeças, andar pelos próprios pés... Qualquer outra via, estarão definitivamente a conspurcar o nome de Amílcar Cabral, que usaram na campanha.

A África que querem impor em Malabo, com a ajuda de meia dúzia de governantes corruptos, desenraizados, provincianos e sem identidade do governo português (os quais de forma alguma se pode pensar que representam Portugal, o seu povo ou aspirações reais), é a África dos ditadores, um modelo de estabilidade política musculada para exploração dos recursos naturais a favor de uma pequena «elite» de beneficiados e em detrimento do desenvolvimento real da população. A CPLP, que poderia estar na linha da frente na reinvenção de novos modelos económicos glocais, está transformada num joguete local, entregue a palhaços mandatados por José Eduardo dos Santos, numa agonia sem fim à vista, que tem sido, aliás, muito criticada por Xanana Gusmão, nas suas alocuções sobre o assunto.

Quanto ao Ministro da Defesa de Cabo Verde, que acompanhava o Presidente deste país na tomada de posse do novo Presidente eleito, alinhou pelo mesmo diapasão, deixando a claro a existência deste «eixo do mal», a concertação entre estes três países para uma «intervenção militar», apoiando-se agora nas novas autoridades eleitas, mas sem paciência para esperarem que sejam elas a solicitar o seu apoio. E o apoio que pretendem prestar vai sempre dar ao mesmo: a reforma da defesa, que pretendem insistente e forçosamente apoiar com soldados seus e com dinheiro angolano. No entanto, as suas declarações caem mal, porque, como nos têm habituado os dirigentes cabo-verdianos, são pautadas pelo seu complexo de «superioridade» em relação à Guiné-Bissau: insinuar que as Forças Armadas guineenses não são credíveis é uma brincadeira! São tão credíveis que dissuadiram Portugal de se intrometer, há dois anos... Então o senhor ministro quer mandar homens que nunca ouviram um tiro ensinar aos guineenses a arte da guerra? Logo os cabo-verdianos, cuja independência mal desejada foi obtida à boleia dos combatentes guineenses? (exceptuo algumas honrosas e dignas excepções, como Osvaldo Lopes da Silva). Ler mais aqui»»

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