domingo, 29 de junho de 2014

Recado ao Chefe do Governo sobre Marcha Da reconciliação



Por, James Wilbonh Flora
Caro Primeiro-Ministro,
Eng.º Domingos S. Pereira

 Congratulação Por
Uma Iniciativa Feliz
Como compatriota e nacionalista Guineense, que vive e trabalha, na Diáspora, mais exactamente, na Terra de sua Majestade Britânica (Inglaterra), onde exerço a minha actividade de Médico, venho expressar-lhe a minha profunda congratulação pela sua iniciativa de Marcha de Reconciliação Nacional.
Por ela, dou-lhe o meu voto de agradecimento, pois trata-se de uma iniciativa invulgar, do género de uma outra levada a efeito, no início da recente Campanha da Segunda Volta das Eleições Presidenciais, pelo candidato apoiado pelo PRS (Partido da Renovação Social) Eng.Nuno Gomes Nabian.
Penso compreender a sua visão e sentido da luta, que tenciona empreender, como Primeiro-Ministro.
A sua luta é, também, a minha, como julgo que seja de muitos compatriotas, que anseiam por mudanças decisivas, que coloquem o nosso País, na rampa do Desenvolvimento, desejado por todos os Guineenses, quer vivam no País, quer fora (na Diáspora).
Uma Sugestão Inadiável:
Criminalização da Discriminação Étnica
Principal Factor de Instabilidade
e Subdesenvolvimento
Sendo uma realidade, que eu próprio vivi, e senti na pele, cada vez que visito o nosso País, a minha primeira sugestão, como cidadão e filho genuíno dessa bendita Terra, é que o Governo de V.Exª ponha em prática esse nobre ideal de reconciliação nacional, legislando, como medida prioritária, o combate à discriminação étnica, em todos os domínios, seja nas relações privadas, seja nos contactos com os órgãos da Administração pública, nos Hospitais, na Alfândega, na Saúde (Juntas Médicas), sejam quais forem as entidades, nacionais ou estrangeiras.
Além de extremamente vergonhosa, no século em que vivemos, a discriminação étnica (ou de qualquer outra natureza) só reflecte a ignorância e o baixo nível cultural de quem a prática, porque tem a sua origem no egoísmo, e o seu objectivo é aprofundar o fosso da desigualdade social e a desconfiança entre os cidadãos, bloqueando e limitando a comunicação social, que é um valor imprescindível ao Desenvolvimento Humano.
De facto, com bastante frequência, deparamo-nos, em alguns sectores da nossa sociedade, com animosidades, absolutamente injustificáveis, só pelo facto de se falar uma língua étnica (um gesto tão vulgar e natural, pois trata-se, em geral, da língua materna da maioria da nossa população, sendo natural e espontânea a sua utilização, quando duas pessoas da mesma origem étnica se encontram e se cumprimentam.
Os ditos da “praça” reagem a tal gesto, com agressividade e hostilidade, pior do que os colonialistas, no tempo do antigamente. Não se compreende!...
 
Intolerância zero
Semelhante intolerância não se notava tanto, no período colonial, pelo menos, com a agressividade verbal, que, por vezes, se ouve, nalguns sectores da nossa sociedade, por parte de alguns indivíduos, que se pretendem superiores aos outros (não se sabe em quê), mas que contribuem, com as suas más práticas, para minar a coesão social e a paz pública. Coisa que nem o colonialista, no seu comodismo cultural, se atrevia a fazer, nos tempos que já lá vai!...
O mau relacionamento, que tais atitudes provocam, devem ser combatidas, pela via legal e da exigência ética e cívica, porque é uma das causas do desconforto social que comprometem o nosso Desenvolvimento colectivo.
Não é possível, em pleno século XXI, andar-se, numa rua de Bissau, ou na Feira de Bandim, e estar a ouvir remoques, em tom ofensivo, por se falar uma Língua nativa, a língua com a qual vimos ao Mundo, além da carga emotiva e sentimental dos valores sagrados que lhe estão associados!
Será preciso lembrar que a Guiné-Bissau é um Pais novíssimo (como a maioria dos Países Africanos) que, por isso mesmo, ainda não teve tempo (se calhar, nem capacidade política) para construir um quadro de valores éticos e culturais, em que todos os Cidadãos se possam rever, seja no plano religioso, educativo, social, etc..
É uma tarefa que o tempo e o sistema educativo se encarregará de completar.
As Nações mais antigas, no Mundo, levaram séculos a serem formatadas, através da Educação, do Pensamento Filosófico e da Religião.
Mesmo assim, mantêm fortes identidades regionais, tanto mais vincadas quanto maior é a vastidão do respectivo território e a escassez de meios de transporte e de comunicação social.
Não é o nosso caso, mas o problema é idêntico, porque não temos um sistema educativo universal (que abranja todos os interessados, com idêntica qualidade).
E onde pára a Educação, no nosso País, para a construção da nossa identidade nacional, se nem uma História Pátria, fomos capazes de escrever!...
Apenas para dizer que temos de ser tolerantes, uns com os outros, enquanto vamos buscando os valores que hão-de impregnar a nossa identidade pátria.
Não basta ter uma Bandeira e um Hino, mas uma comunhão de valores que impregnem a Alma e motivem a acção.
Quando atingirmos essa fase, a corrupção e a irresponsabilidade, na gestão da coisa pública, que constitui, ainda hoje, um problema, ao nível da governação e da administração pública, e no acesso ao emprego, tenderão a esbater-se, à medida que forem sendo entranhados, nas mentes dos cidadãos, o sentimento de unidade nacional e da interdependência.
 
A razão dos preconceitos
Sabemos bem qual é a razão de tais preconceitos: é a falta de uma educação cívica de base, com exigência do respeito mútuo entre cidadãos e por qualquer pessoa humana, independentemente da sua nacionalidade ou origem.
Se tal educação houvesse, não seria permitido que certas coisas se passem, entre nós, criando fricções, onde não deviam existir.
Propositadamente, não quero especificar, por respeito e consideração, de que lado vêm esses remoques ofensivos, porque toda a Bissau sabe do que estou a falar.
 
Novo Ciclo Político:
Paz -Verdade e Transparência
Mas estamos a começar um novo ciclo político.
Seria bom que toda a arquitectura do Estado (e da Sociedade Civil) fosse capaz de reflectir a preocupação pela verdade e transparência que vai na alma de cada Guineense.
O respeito pela pessoa humana, qualquer que seja a sua origem étnica, prática religiosa ou modo de vida, representam valores fundamentais da pessoa humana e são essenciais ao seu equilíbrio emocional que capacita o indivíduo para uma saudável intervenção cívica (ou sucesso profissional).
Para se viver em paz, em sociedade, é fundamental o respeito pelos valores sociais e éticos pelos quais se deve reger uma sociedade multiétnica, como a nossa, sempre dentro do princípio do respeito e consideração devidos à toda a pessoa humana.
E porquê?
Porque todos sabemos (Guineenses e estrangeiros, que vivem no nosso País) que essa forma jocosa de falar das outras pessoas, por causa da sua etnia ou costumes tradicionais, é transportada para qualificar o modo de vida em sociedade, onde facilmente despontam sinais de discriminação:
É na Escola (com as crianças inocentes), é no trato com os Funcionários da Administração Pública, é na Politica, é nos Hospitais, é nas Juntas Médicas, é na Alfândega, é nas Bolsas de Estudos, etc., etc..
Não é aceitável que tais práticas erradas continuem a fazer parte do nosso quotidiano nacional (apesar de algumas honrosas excepções, de gente que, aos poucos, vão despertando para a realidade do mal que não deve ser feito).
Discriminação:
Uma Ofensa à Cidadania
E aos Heróis da Independência
Só de escrever a palavra “discriminação”, sinto-me arrepiado, por ter de admitir que tal realidade existe ainda no nosso País, sabendo (como sei) que esse fenómeno está na base do subdesenvolvimento de vários Países cheios de recursos naturais (incluindo o nosso)!
Porque a palavra ressoa, aos meus ouvidos, como se estivesse falando da África do Sul, do tempo do Apartheid (há 20 anos atrás)!
Mas estou a falar do nosso País, cujos Filhos, um dia, pegaram em armas para eliminar o colonialismo e todas as formas de discriminação social e política, em que se manifestava.
Triste, não é?! Mas é exactamente isso que eu quis dizer!
Porque sinto isso como uma profunda ofensa para os nossos compatriotas que lutaram contra o colonialismo e contra a ditadura pessoal que nos foi imposta (depois da independência) para que fôssemos livres de nos manifestarmos, no nosso País, contra a intolerância de qualquer espécie, venha donde vier.
Com profunda tristeza, pareceu-me que foi, também, contra essa realidade que se realizou a Marcha da Reconciliação Nacional: contra a discriminação de qualquer espécie e contra as más políticas do passado, que estão na sua origem.
Temos de ser capazes de eliminar do nosso quotidiano tudo o que possa representar más práticas, para podermos desenvolver um novo tipo de relacionamento, baseado no respeito mútuo, na cooperação e na tolerância, para fomentarmos uma sociedade mais coesa e dinâmica, onde cada homem ou mulher se sinta cidadão de corpo inteiro. 
Por isso, entendo bem o sentido da Marcha da Reconciliação Nacional como o reencontro do Partido (passados 40 anos) com os anseios do Povo Guineense do qual andou distante demasiado tempo.
O Grande Exemplo
de Nelson Mandela
 Graças à figura histórica de Nelson Mandela, a África do Sul foi capaz de libertar-se do regime egocentrista e desumano do Apartheid, ressurgindo uma nova sociedade, baseada na Lei, na Justiça social, na Liberdade e no Respeito mútuo.
Assim, também, nós, com o mesmo espírito de Justiça e Reconciliação, vamos precisar de exorcizar o nosso passado tenebroso (de segregação política, económica e social), para reconstruirmos uma nova sociedade (de integração económica e social) com sentido de humanismo e solidariedade inclusiva.
Foi isso que o PAIGC não soube fazer, nos seus 40 anos de governação (menos três), entalado na lama da corrupção e da incompetência, donde não ser possível destacar nenhuma obra feita (a não ser aquela que resultou da cooperação internacional).
Por isso, entendi o sentido da Marcha de Reconciliação Nacional como o retorno do Partido (passados 40 anos) ao encontro do Povo Guineense do qual esteve distante a maior parte do tempo.
 
Uma realidade incómoda
Toda a gente conhece a seguinte realidade, com que o nosso País ainda se confronta:
Se eu for um Mandinga ou Fula (apenas um exemplo), se errar, enquanto cidadão, sou julgado, com base na minha condição de Cidadão Guineense, e não com base na minha origem étnica, religiosa ou pela cor da pele.
Mas, se for de outra raça (como se diz, em bom crioulo) menos considerada…o caso muda de figura.
Jamais devemos permitir as “bocas foleiras" (passe a expressão) que se ouvem, todos os dias, na Feira de Bandim (principal Mercado de Bissau), quando se diz: “Eh!... Fulano… também quer mandar! Ele que vá lavrar a Terra pois eles são bons nisso”.
Estas formas levianas de discriminação social (que, também, é económica e política) é que semeiam e mantêm focos de comportamentos inaceitáveis, num País, que declarou a sua Independência, há quase 41 anos, e que, até à data, ainda não conseguiu educar o seu Povo para ter um comportamento cívico aceitável em nome de uma saudável convivência social e política.
O que se passa na Política do País, assim como na Vida Económica, é o reflexo desse modo de relacionamento social, que não pode (nem deve) continuar a existir, porque é a pura negação do Desenvolvimento humano e social, de que o nosso País tem falta, pela sua repercussão no subdesenvolvimento económico e social do País.
Conclusão
Obviamente, não é com as Marchas de Reconciliação que vamos lá, pois a mente humana, quando está cheia de vícios, devido à má formação cultural e cívica, só se consegue controlar, através de leis punitivas e duras, e…mesmo assim! Só Deus sabe quantos tempo levam a produzir efeito na sociedade.
 
Portanto, legislar, neste sentido, vai de encontro à necessidade de modernização da nossa Sociedade.
 
Como V.Exa sabe, sr.Primeiro-Ministro, todos os Países evoluídos do Mundo contemplam, nas suas Leis, um quadro de normas que visam combater todos os tipos de discriminação, por se reconhecer que são um obstáculo ao desenvolvimento harmonioso do seu Povo.
Alguém tem dúvida porque é que, durante anos, se continuou a falar, persistentemente, na necessidade de Reforma do Sector da Defesa e Segurança?
 
Em contrapartida, alguém se preocupou em perguntar com que direito alguns dirigentes do Partido (que se arrogam de ser Militares e Comandantes) continuam a morar em boas casas, deixadas pelos Portugueses, depois da Independência, sem pagar renda, sendo, desse modo, beneficiários de uma discriminação positiva injustificada, não só, em comparação com os restantes cidadãos, que pagam renda, pelo seu esforço, mas, também, em relação aos seus Camaradas, no activo, que nem condições têm para viver nos quartéis?
Quem ousou manifestar a sua indignidade contra Ministros e Directores-Gerais que, ao longo de anos, se apoderaram de dinheiros públicos para comprar casas e pontas (quintas) e outros bens, no País e no Estrangeiro (Portugal, França, etc)?
Quem é que, na Administração Pública Guineense, ganha o suficiente para sustentar, no País, uma família numerosa, e manter filhos a estudar fora ou comprar casas na Europa? 
 
Os Pilares da Reconciliação:
A Justiça Regeneradora
Os pilares mais importantes, na vida das Nações bem-sucedidas do Mundo, assentam em leis severas, de cumprimento obrigatório, que procuram combater todos os tipos de discriminação e práticas económicas anti-sociais, com as quais só pode haver tolerância zero.
Não foram os abusos de poder que trouxeram a miséria ao nosso País, que foi, no início da Independência, o único dos PALOPs a arrancar bem, depois da Luta de Libertação Nacional? Em que lugar se situa, hoje, entre os PALOPs?
Penso que a forma peculiar de constituição da nossa Sociedade Multiétnica, em que o conceito de unidade Nacional sempre foi uma relatividade, justifica fortemente uma legislação, igualmente forte, à medida dos fortes vícios que impregnam e distorcem a nossa Comunidade Nacional, tornando-se uma realidade geradora de conflitos sociais (e políticos), num futuro não muito distante, se nada for feito.
 
---x---
Caro Primeiro-ministro,
Espero, pelo menos, que a minha reflexão chegue até si! Pode, até, considerar-se uma reflexão redutora, em comparação com outras que possa já ter recebido, para a resolução deste problema nacional.
Mas, para mim, importante é que haja uma solução, seja de que natureza for.
A unidade de todos os Guineenses, pela Justiça e Igualdade de Oportunidades, é o pilar incontornável para uma Sociedade mais justa, mais motivada, rumo a uma Democracia participativa.
Estou certo que é isso que V.Exª, senhor Primeiro-Ministro, também deseja para o nosso País, em nome do bem-comum.

Obg pela atenção e Bom fim-de-semana para si e para todos Guineenses.

Nota: Os artigos assinados por amigos, colaboradores ou outros não vinculam a IBD, necessariamente, às opiniões neles expressas.

1 comentário :

  1. EU CONCORDO PLENAMENTE CONSIGO,mas tenho confiança neste Jovem Primeiro-Ministro ele sabe mais de que ninguém... Eu votei nota 20 para esta iniciativa.

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