quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Documentário reclama oficialização do crioulo na Guiné-Bissau

Um documentário rodado na Guiné-Bissau, a estrear no final do ano, mostra que a luta pela independência do país passa hoje por oficializar a língua crioula, explicou à agência Lusa o realizador Gorka Gamarra.

Apesar de ser falado "por 70 a 80 por cento da população", o crioulo ainda não está totalmente normalizado e a única língua oficial da Guiné-Bissau é o português, destaca Gorka.

Em diversas entrevistas a figuras das artes e letras e a residentes em diferentes pontos da Guiné-Bissau, o documentário capta um desejo comum.

"O desejo de muita gente é que, para além do português, o crioulo seja uma língua oficial para dignificar a cultura guineense", de modo a que a identidade nacional "tenha uma expressão institucionalizada ao nível do Estado", explica o realizador.

"A verdadeira independência, além de política e militar, tem que ser cultural, tem que ser pela defesa e dignificação da cultura do país e pela sua partilha em igualdade com outras culturas", acrescenta.

Gorka acredita que, apesar dos 40 anos de existência como Estado, ainda falta à Guiné-Bissau contrapor em definitivo a lei da cidadania guineense, de 1946, na era colonial portuguesa, "segundo a qual era indígena aquele que não falava ou não escrevia em português".

Pelo contrário, o documentário rodado no início do ano em vários pontos da Guiné-Bissau, encontrou poemas e músicas que mostram como o crioulo é a massa que "agrega as diferentes culturas milenares" da guiné.

Foi a língua que sempre serviu "para intermediar o diálogo" entre comunidades de diferentes crenças.

O músico Aliu Bari, que faleceu este ano em Lisboa, o escritor Abdulai Silai ou o cantor e escritor Ernesto Dabó, são algumas das figuras ouvidas no filme que conta com a colaboração da artista Karina Gomes.

O documentário deverá ter 70 minutos de duração, está em fase de montagem e prevê-se que esteja pronto a exibir em dezembro.

Deverá ter como título a palavra crioula "lantanda", que significa "pegar em algo que cai, no mesmo sentido em que se apanha a água que escorre", descreve Gorka.

A palavra para título foi escolhida por alguns entrevistados aos quais a equipa do documentário pediu que escolhessem uma palavra ou provérbio com o qual mais se identificassem.

"Disseram-nos que escolheram esta pelo significado e pela metáfora que representa em relação à situação atual da Guiné-Bissau", refere o realizador.

Gorka Gamarra, basco, é funcionário do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) na Guiné-Bissau.

Fazem parte da equipa do documentário outros dois bascos, três guineenses e dois portugueses, todos interessados na cultura do país em que vivem.

Apesar de estar prestes a ver a luz do dia numa altura em que o país celebra o 40.º aniversário, o documentário deixa de lado qualquer ambição de fazer um balanço do percurso de independência até hoje.

"Só tentamos compreender o que é a identidade guineense", realça o realizador.

E se essa identidade ainda não está totalmente plasmada na lei e no que se ensina, "é porque é preciso dignificar e trabalhar mais sobre essa identidade", conclui.

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