As imagens captadas pelo telemóvel do jovem sírio Khalid chocaram o mundo. |
Em Lampedusa, meses
após a morte trágica no Mediterrâneo de centenas de imigrantes clandestinos,
descobre-se que os que sobrevivem ao mar são tratados como bichos. No centro de
acolhimento da ilha italiana, ficam nus à frente de toda a gente para serem
desinfectados com um jacto de água. A imagem tem conotações duras. Um campo de
concentração? Um matadouro? Duas ou três palavras bastam para descrever essas
imagens. Indiferença. Desumanidade. Vergonha.
Em Outubro, quando mais
de 300 imigrantes morreram ao largo da ilha, o Papa Francisco resumiu tudo na
palavra vergonha. Passadas poucas semanas, a vergonha ainda não chegou a
Lampedusa. Nem à Itália. Nem à Europa que desiste dos seus valores a troco da
segurança imaginária de uma fortaleza.
Ao escândalo da morte
escondida no fundo do mar soma-se o escândalo da humilhação dos sobreviventes,
julgados demasiado indignos para serem tratados como mulheres e homens num
centro de acolhimento. A Europa que se mostra assim tem que legitimidade para
dar lições de direitos humanos aos outros?
Vimos as imagens, elas
suscitaram a indignação geral. Incluindo a fúria de Bruxelas, em vésperas de
mais uma cimeira europeia onde o tema da imigração corre o sério risco de ser
afastado do topo da agenda. E a pergunta a fazer é: o que aconteceria se não
tivéssemos visto essas imagens? O que aconteceria se Khalid não tivesse
obrigado os europeus a ver. Tudo continuaria na mesma.
Porque na verdade tudo
está na mesma. Desde as tragédias de Outubro, a UE não deu um passo para alterar
as suas políticas de imigração. Continua a preferir o medo à vergonha, a
indiferença à humanidade. E é
intolerável que a Europa não consiga encarar de frente a questão. O direitos
humanos são de todos os seres humanos. E esquecê-lo é infelizmente mais fácil
do que parece.
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