Em entrevista à DW África, o professor universitário
diz acreditar que as eleições de 13 de abril, que têm “novos protagonistas” com
outras perspetivas e que funcionam segundo “outros paradigmas”, servirão para
limpar má imagem da Guiné-Bissau, que já é independente há 40 anos.
Leopoldo Amado deseja para a Guiné-Bissau dirigentes
de “mãos limpas”, sem antecedentes com a justiça e sem ligações ao mundo da
droga.
DW África: Como historiador, analista e
principalmente como guineense, como encara essas eleições gerais na
Guiné-Bissau?
Leopoldo Amado (LA): Vejo-as como uma oportunidade
ímpar para que o país regresse à ordem constitucional, mas também elas
representam um fecho de um ciclo, um ciclo longo de instabilidade em que o país
não se encontrou consigo mesmo. Espero que este ciclo termine e que essas
eleições possam significar a abertura de uma nova era para o país.
Porque a Guiné-Bissau é um país extraordinário com
todas as condições, com recursos naturais, muitos quadros, ou seja, um país com
as condições necessárias para se inserir na economia internacional que pode,
querendo suprir as necessidades das suas populações. Portanto um país
perfeitamente viável que precisa da paz e de estabilidade para que possa
promover o seu desenvolvimento.
DW África: Acredita que uma das diferenças nessas
eleições em comparação com as anteriores, esteja numa nova geração de
protagonistas "formalmente melhor qualificada"?
LA: É evidente que essas eleições trazem novos
protagonistas. Isto de "melhor formação ou não" é relativo. Mas o
certo é que esses protagonistas têm outras perspetivas, funcionam segundo
outros paradigmas.
Porque por incrível que pareça, a geração que fez a
luta armada contra o regime colonial é também uma geração muito bem formada,
mesmo que muitos tenham sido forçados a deixar as universidades para abraçarem
a luta de libertação nacional, mas era também uma geração muito bem formada porque
a luta não foi somente andar aos tiros.
Mas o que não tenho dúvidas, atualmente está em
marcha um novo paradigma que resultante de uma nova visão de como estar no
concerto das nações e principalmente como comportar-se daqui para a frente para
que possamos limpar esta má imagem de um país destroçado por um longo período
de guerras fratricidas, de golpes de Estado e de uma grande instabilidade.
DW África: O período pós-eleitoral já levanta
algumas preocupações, nomeadamente no seio da comunidade internacional. Para
si, qual deve ser a atuação dessa mesma comunidade internacional em relação à
Guiné-Bissau?
LA: Se a Guiné-Bissau não se estabilizar também a
própria comunidade internacional terá problemas. Não esqueçamos que durante
muito tempo a Guiné-Bissau foi um factor de instabilidade, não apenas na África
ocidental, a região onde está inserida, mas a nível do mundo devido ao
narcotráfico. No passado, a Guiné-Bissau desempenhou um papel de facto
perturbador. A instabilidade na Guiné-Bissau projeta-se, digamos assim,
internacionalmente.
Muitas vezes a comunidade internacional não
compreendeu muito tempo o problema da Guiné-Bissau porque essa mesma comunidade
tem receitas mecânicas e muito paradigmáticas para analisar todos os casos e
países, sobretudo os pobres, como a Guiné-Bissau. Felizmente essa comunidade
internacional já compreendeu que cada caso é um caso e que a instabilidade
recorrente na Guiné-Bissau tem as suas causas e especificidades próprias. A
Guiné-Bissau está a atravessar um processo profundo de reconsideração social e
política e agora que esse ciclo de instabilidade estava a tornar-se longo, a
comunidade internacional empenhou-se muito mais.
Recebemos na Guiné-Bissau uma figura de dimensão do
ex-Presidente de Timor-Leste, José Ramos-Horta, foi instalada em Bissau uma
estrutura de peso como a UNIOGBIS [Escritório Integrado das Nações Unidas para
a Consolidação da Paz na Guiné-Bissau], etc. Tudo isso porque a comunidade
internacional entendeu que o problema desse país requeria intervenções mais
musculadas. É evidente que nem tudo que foi feito foi reavaliado da melhor
forma, mas há coisas que só iremos ver os resultados daqui a algum tempo.
DW África: Pelo que nos acabou de dizer, conclui-se
que com o pleito eleitoral no dia 13 de abril a Guiné-Bissau termina um período
da sua conturbada existência para entrar numa nova fase?
LA: Não são propriamente as eleições que vão
resolver todos os problemas da Guiné-Bissau, mas sim são o corolário de todo um
processo e esses sinais que vinham surgindo demonstravam que este ciclo de
instabilidade estava a chegar ao fim. E a comunidade internacional que percebeu
esses sinais, apesar de ter cortado as relações com o governo de transição com
quem não se relacionaram plenamente, foi necessário que as partes encontrassem
plataformas de entendimento para solucionar certas questões. Muitas foram
resolvidas, outras estão a ser e outras enfim são de mais difíceis resoluções
nomeadamente a reforma no sector da defesa e segurança.
Mas acredito que toda esta intervenção, a
mobilização dos guineenses e o facto da população já estar cansada deste ciclo
de instabilidade leva a que tudo e todos trabalhem para uma mudança. Creio que
este é o momento ideal para que as coisas mudem. A Guiné-Bissau tem problemas
étnicos, tem clivagens de toda a natureza, casos de pobreza, muitas vezes de
pobreza extrema, enfim, tem muitas questões por resolver porque esses 40 anos
de independência deixaram sequelas nomeadamente no que concerne à satisfação
das necessidades básicas das populações, no setor da saúde, da educação, das
finanças públicas, etc.
DW África: Depois das eleições gerais o principal
desafio dos novos dirigentes passa evidentemente pela estabilização da
Guiné-Bissau e ao mesmo tempo credibilizar o país. Mas para que tal aconteça os
candidatos envolvidos na corrida eleitoral devem ser, como se diz em Bissau,
“pessoas frescas e limpas de todas implicações”. Defende também esta tese?

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