sábado, 9 de fevereiro de 2013

A Guiné-Bissau: história e sociedade



Localizada na costa ocidental africana, entre os estados modernos do Senegal e Guiné-Conakry, a Guiné-Bissau (antiga Guiné portuguesa) ocupa uma área de 36 125 km2. Corresponde hoje ao que sobrou de uma antiga área de influência portuguesa do século XVI. Esta área abrangia a zona costeira da feitoria de Arguim, prolongando-se até um ponto não especificado da Serra Leoa, território a que a historiografia actual apelidou de Senegâmbia.

Resultado de correntes migratórias vindas do Sudão e do Gabú, o território da
Guiné-Bissau é marcado pela sua diversidade étnica e linguística (um total de 25 grupos linguísticos), pela diversidade de costumes e pela sua organização política e religiosa (situada entre o animismo, o islamismo e o cristianismo).
Uma característica a realçar do encontro entre os diferentes grupos que habitam o território, foi a capacidade de assimilar e incorporar os modos e costumes de cada um, bem como a sua aptidão para a criação de novas unidades políticas.
Os três principais grupos populacionais do território são:
a) Os Balantas, que constituem o maior grupo do país. Composto por agricultores e criadores de gado. Caracterizam-se pela sua resistência, pela capacidade de viver em comunidade e pelo desenvolvimento de um estilo de vida baseado na independência e liberdade.
b) Os Fulas (ou Futas), constituem o segundo maior grupo do país. São agricultores sedentários. Numa primeira fase da colonização mantinham uma relação de cooperação com as autoridades coloniais, o que veio alterar com a introdução do pagamento de taxas.
c) Os Mandingas, terceiro grupo do país constituem um sub-grupo dos Fulas uma vez que o contacto com estes possibilitou a sua integração. Animistas de origem, manifestam no entanto práticas islâmicas, provenientes dos Fulas.
Para além destes três grandes grupos, é de destacar ainda a presença do grupo Manjaco; do Papel; do Macanha/Brame; do Beafada; do Bijagós e dos Nalú, quantificando um total de 52.8% da população98.
A chegada das caravelas portuguesas no século XV e de outras embarcações europeias acabaram por alterar profundamente a dinâmica social entre as sociedades tradicionais, tanto no campo político, económico e social.
No campo político, é de destacar a integração do território como distrito da província de Cabo Verde (Os rios grandes da Guiné do Cabo Verde) em 1466, mantendo- se sob sua jurisdição até 1879.
No campo económico, destaca-se a construção das primeiras povoações, primeiro Cacheu, seguindo-se Farim e Zinguichor e a edificação da fortaleza de Bissau. A criação destas povoações dedicadas exclusivamente ao comércio entre europeus e africanos veio alterar de forma drástica as relações sociais entre os diferentes grupos sociais e abriu espaço para o aparecimento e desenvolvimento de um novo grupo social – o crioulo ou sociedade crioula99 .
Este grupo crioulo (que não deve ser aqui entendido como um símbolo identitário ou um grupo social específico), nasceu do encontro histórico entre portugueses, caboverdeanos e africanos de diversas sociedades tradicionais100. Teve a sua origem num processo histórico, iniciado no século XV pelos lançados ou tangomãos, aventureiros portugueses e caboverdeanos que se integraram nas comunidades africanas como comerciantes. Em colaboração com este grupo encontram-se os grumetes, africanos que se consideravam «cristãos civilizados».
Com a criação, no século XVIII, de vilas e fortes, e a imposição do pagamento de taxas (Daxa), este grupo passou a viver nas praças, servindo de intermediários entre os comerciantes europeus, os luso-africanos e os dirigentes africanos.
Os lançados e os grumetes foram indispensáveis na penetração europeia no interior de África. Na realidade foram os pioneiros na implantação política e económica dos europeus na região.
Estes grupos estiveram na origem do que viria a ser designado no século XX por assimilados/ civilizados pela legislação portuguesa através da publicação do Estatuto Político, Civil e Criminal dos Indígenas das Colónias de Angola e Moçambique de 1926, alargado à Guiné em 1927, e pelo decreto 1:346 de 7 de Outubro de 1946.
A desanexação da Guiné-Bissau da administração caboverdeana em 1879 comprometeu seriamente a posição de Portugal no território, uma vez que esta Guiné, apesar do nome, não era portuguesa, mas também já não era da responsabilidade de Cabo Verde.
Seguiu-se um período de conflitos entre portugueses e africanos (1879-1936), somando um total de, no mínimo, de 81 campanhas, operações secundárias e encontros pontuais. A principal razão destes conflitos deveu-se maioritariamente à implantação colonial portuguesa no território e as consequentes imposições administrativas e fiscais.
Este clima de resistência viria abrandar durante o regime do Estado Novo, para ser reanimado na década de 1950 com a emergência dos primeiros movimentos nacionalistas no território. 
 OPAD-Pioneiros Abel Djassi
 99 Idem. p. 101.
100 “I use the Word ‘creolization’ as a root metaphor to refer to a process f cultural and social change involving masses of people with different bonds of social and political belonging. It presupposes a historical encounter of different and unequal societies the result of which has been a configuration characterized by open or porous boundaries separating the constituent groups, and by heterogeneity of cultural practices within and across these social units. (...). In these circumstances, people refashion cultural elements from many different sources so that they can be creatively transmuted into a novel social totality – a Creoule society. (...). Swinging like a pendulum between the poles of Africanization and Lusitanization, without reaching either extremity, the process of creolization in Guinea had continuity over time. Giving birth to the hybrid social unit I am calling Creole society thanks to the relative balance of forces between a weak colonial power and a fragmented collection of traditional societies, which were never able to act jointly.” Ibid. p.61-121.

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