Vitória do peemedebista é dura derrota
para a presidente Dilma, que mobilizou ministros para angariar votos para
Chinaglia mas viu desafeto levar a eleição
Eram 18h47 da tarde deste domingo quando
o deputado Eduardo Cunha (RJ), um rebelde na governista bancada do PMDB,
encerrou seu discurso na tribuna da Câmara dos Deputados sob o coro de
“presidente” e forte aplauso. “Temos que nos dar o respeito para ser
respeitados”, discursou o peemedebista. No fundo do plenário, um grupo de
deputados da oposição comentava animadamente: “Vai ser pior do que o governo
pensava”. E foi. Com 267 votos – dez a mais do que o mínimo necessário –, Cunha
foi eleito presidente da Câmara, o segundo cargo na sucessão da presidente
Dilma Rousseff, atrás apenas do vice-presidente da República.
O resultado surpreendeu o Palácio do
Planalto, cuja contabilidade indicava que a disputa terminaria em segundo
turno, quando seu candidato, Arlindo Chinaglia (PT-SP), poderia virar o jogo. O
petista teve o apoio de 136 deputados, Júlio Delgado (PSB-MG) que recebeu 100
votos, e Chico Alencar, do Psol, teve 8 votos. Houve 2 votos em branco.
O resultado da eleição é sintomático
para o PT. Além de não ter conseguido emplacar Chinaglia, o principal partido
de sustentação do governo Dilma terminou a eleição sem nenhum cargo na Mesa
Diretora da Casa. Na tentativa de angariar votos em favor de Chinaglia, os
petistas abriram mão de lançar candidatos para os postos administrativos da
Câmara. A sigla teria direito a indicar nomes para a 2ª vice-presidência, que
cuida, por exemplo, do ressarcimento de despesas médicas de parlamentares, e a
para 2ª secretaria, responsável pelos passaportes diplomáticos dos deputados.
Com uma campanha feita boca a boca,
recheada de promessas corporativistas e insuflada pelo discurso de independência
do Palácio do Planalto, Cunha procurou um a um os parlamentares e cortejou na
véspera da eleição os 198 novatos que desembarcaram em Brasília. Segundo
aliados, não dormiu de sábado para domingo – mas não se trata de ansiedade, e
sim de telefonemas e conversas que vararam a madrugada. Após a vitória, houve
queima de fogos na frente do Congresso. “Em nenhum momento falamos que seríamos
oposição e não seremos. O governo sempre terá legitimidade, mas houve uma
tentativa de ingerência do Poder Executivo e o Parlamento soube reagir. Não
temos que fazer disso uma batalha nem qualquer tipo de sequela”, afirmou,
depois de eleito.
Cunha passou toda a votação diante das
cabines onde os congressistas depositavam seus votos. Além de agradecer
nominalmente a cada potencial eleitor, pedia abertamente o voto dos deputados.
“Aqui não tem lei que proíba a boca de urna”, dizia. Foi comparado pelos
próprios correligionários a um vereador em campanha.
Um dos mais hábeis negociadores
políticos em atividade do Congresso Nacional, Cunha está no quarto mandato e
liderou até a véspera a poderosa bancada do PMDB. Com ótimo trânsito no chamado
“baixo clero” da Casa – deputados sem grande expressão –, ele capitaneou uma
série de rebeliões na base governista durante o primeiro mandato dada a
capacidade de aglutinar forças independentemente da coloração partidária. Não é
exagero afirmar que nenhum projeto relevante foi aprovado no primeiro mandato
de Dilma sem que ele estivesse na mesa de negociação. Agora, seu cacife cresce
ainda mais.
E por que o cargo de presidente da
Câmara é tão relevante neste momento? A partir desta segunda-feira, será
Eduardo Cunha quem terá a prerrogativa de pautar os projetos que serão votados
na Casa num ano em que o governo precisará desesperadamente aprovar, por
exemplo, o pacote de medidas econômicas. Também será ele quem poderá acelerar
ou barrar textos que tratam das reformas política ou fiscal, chancelar a
abertura de CPIs e até a instauração de processos de cassação de mandatos. Num
cenário extremo, será ele o articulador – ou não – de um pedido de impeachment
da presidente Dilma Rousseff.
O discurso de independência do
Legislativo ganhou tanta força nos minutos que antecederam a votação que o
próprio candidato oficial tentou pegar carona. “O erro de imaginar que a Câmara
possa ser um poder subordinado é não perceber que é a Câmara que decide as
leis, que decide a regra. É a Câmara que decide aquilo que os outros poderes
podem ou não fazer”, discursou Chinaglia. Mas era tarde. Às 20h30, Eduardo
Cunha seria eleito e encerrava a mais acirrada eleição na Câmara desde a
madrugada de 2005 na qual o pernambucano Severino Cavalcanti (PP) derrotou o
PT. Nos dois casos, as vitórias foram turbinadas pelo baixo clero. A diferença,
porém, é que Severino nunca teve a pretensão de peitar o governo. Com veja.abril
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