Os renovadores
apontam que resolveram participar do recém-constituído governo para estabilizar
o país e viabilizar a governação. Não é inverdade tal justificativa, entretanto
é muito reducionista e incongruente, e se não for concebida isoladamente,
torna-se vulnerável à rejeição. Ao alegar que a necessidade pela estabilidade
político-institucional do país foi a razão pela qual brindou o convite de
Baciro Djá, o Partido de Renovação Social (PRS) tenta dissociar a indissociável
e intrínseca relação entre o recém-formado governo e o deposto governo. O fato
é que o agora formado executivo foi gerado em resultado direto do destituído
governo, do qual o partido de milho e arroz era membro integrante. Ou seja, o
próprio PRS foi vítima do decreto presidencial que destituiu o governo, pois
era parte do executivo.
Outro elemento
que corrobora a incoerência da maior agremiação político-partidária de
oposição, no país, está relacionado à manutenção do mesmo discurso em relação à
justificativa para sua participação no anterior executivo de Simões Pereira e
também no atual governo de Djá. O discurso de “estabilização política” no país
encontraria enquadramento lógico na atual conjuntura – de participação no atual
governo – haja vista que, sem o apoio do PRS, a probabilidade de rejeição
parlamentar do programa de governação do atual executivo seria maior e a crise
se aprofundaria. Entretanto, mesmo para a sua integração governamental nesse
segundo momento, o referido discurso se evapora, pois ao atual governo precedeu
um governo (do qual PRS era membro) ilegitimamente deposto pelo Presidente da
República, não obstante a legalidade de sua destituição.
Ademais, não foi
razoável o comportamento político dos renovadores em integrar o precedente
deposto governo do PAIGC. Por constituir a principal força de oposição, o
partido deveria, normalmente, se resguardar na condição de legítimo e principal
opositor do executivo. O PAIGC tinha a maioria parlamentar e aliciou o PRS a
participar daquele governo (governo destituído) com vistas a governar sem
oposição. Por isso, a retórica de que o partido havia integrado o governo com o
propósito de contribuir pela estabilização política do país carece de um forte
fundamento. A fragilidade do referido discurso se evidencia e se sustenta ainda
mais com sua deliberação em integrar o executivo que acaba de ser formado.
A partir de uma
indagação retórica, pode-se perguntar até que ponto a participação do PRS no
governo chefiado pelo Baciro Djá legitima o contestado ato presidencial que
destituiu o governo de Simões Pereira. Até que ponto sua integração no
executivo dessa natureza encoraja sistemáticas destituições e gestações de
governos não oriundos do voto popular?
Os últimos
comportamentos políticos do PRS constituem objeto preocupante e importante ao
mesmo tempo, a partir do qual é possível analisar, não só a hodierna
configuração de relações político-partidárias em curso, na Guiné-Bissau, como
também a nova concepção de política partidária do PRS pós-Kumba Yalá. Primeiro,
a deliberação política dos renovadores em participar do anterior executivo e do
atual governo corrobora e fortalece a constatação de que o atual PRS (sua elite
político-partidária) tem adotado uma nova concepção sobre a política
partidária: “o importante é estar no governo, não importa de que natureza é e
em quais circunstâncias”. Quando é assim, o partido se transforma em
office-seeking party (partido cujo objetivo político central, nesse tipo de
situações, é conseguir cargos no governo do partido vencedor das eleições),
invertendo a sua histórica trajetória política de policy-seeking party (partido
que escolhe não estar no governo do partido rival vencedor, preferindo estar na
oposição com vistas a influenciar a estrutura política como um todo,
preservando suas convições políticas e ideológicas).
Por outro lado,
essa recorrente e não menos vertiginosa aproximação do PRS ao PAIGC,
vice-versa, em um país cuja configuração político-partidária é bipolar (pelo
menos por enquanto), pode ser uma potencial ameaça para a nossa tenra e
delicada democracia. Onde está (estaria) a oposição? Quando um partido é segundo
maior votado, deve, por congruência e conveniência política e democrática,
excetuando casos muito especiais, zelar pela oposição político-partidária, a
qual constitui um elemento imprescindível para a engrenagem da democracia,
sobretudo a guineense. No meu ponto de vista, além da corrente aproximação
partidária (no âmbito de governação) dos dois principais partidos e rivais
políticos constituir um incongruente comportamento político-partidário, ela
poderá exacerbar a fragilidade de já débil estrutura democrática da
Guiné-Bissau.
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