sábado, 18 de fevereiro de 2017

Poucos conhecem a obra do líder histórico do PAIGC e académico, Amílcar Lopes Cabral


Ex-combatente do PAIGC e responsável pela mobilização de emigrantes cabo-verdianos na Bélgica, na Holanda e na França, Corsino Tolentino, dirigiu a primeira missão do Governo de Cabo Verde independente a Portugal.

Natural da ilha de Santo Antão, André Corsino Tolentino foi estudar para Lisboa em 1966. Um ano depois, a Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE) apreendeu-lhe livros no Lar dos Estudantes Ultramarinos. Foi expulso por alegadamente pertencer a uma rede contra a nação portuguesa.

Em 1970, Corsino Tolentino passa a dedicar-se inteiramente à luta de libertação nacional como dirigente do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC).

Regressou a Cabo Verde em 1974. Em agosto de 1975, dirigiu a primeira missão do Governo de Cabo Verde independente a Portugal, quando era secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros. Posteriormente assumiu o cargo de ministro da Educação.

Foi diretor da Fundação Calouste Gulbenkian e promotor do Instituto para a África Ocidental (IAO). Atualmente é administrador não executivo da Fundação Amílcar Cabral.

Mais de 80 por cento dos que citam o pensamento de Amílcar Cabral para os ajudar a manterem-se no poder não conhece a sua obra, defendeu à agência Lusa o académico cabo-verdiano Corsino Tolentino.

Numa entrevista alusiva ao 40.º aniversário da morte do "pai" das independências da Guiné-Bissau e Cabo Verde, Corsino Tolentino lamenta a utilização abusiva dos ideais de Cabral, assassinado a 20 de janeiro de 1973 em circunstâncias ainda por apurar, por parte do poder político, sobretudo na Guiné-Bissau.

"Provavelmente, mais de 80 por cento, para ser modesto, das citações ou dos citadores de Cabral não conhecem a sua obra e não refletiram profundamente sobre a consistência e a coesão dessa obra e a prática dele", salientou o presidente da recentemente criada Academia das Ciências e Humanidades de Cabo Verde (ACHCV).

"No plano teórico e político, há, na Guiné-Bissau, pouco mais do que citações de Cabral. Nota-se uma espécie de comportamento predador que levou o país a ser vítima dos seus próprios atores, sobretudo políticos e é de desconfiar quando eles repetem em demasia as citações ou recorrem a figuras do passado", sustentou Tolentino.

Para o antigo diretor-geral da Fundação Calouste Gulbenkian e antigo dirigente do Partido Africano da Independência Guiné e Cabo Verde (PAIGC) e, mais tarde, do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV), o partido guineense "faria muito melhor" em fazer um balanço sobre as ideias de Amílcar Cabral, "que são ainda válidas", do que "perder-se em citações".

"Há uma grande diferença entre a teoria e a prática. Quando nos limitamos a citar para afugentar certos riscos ou determinados adversários, reais ou supostos, tal não é legítimo nem honesto", disse, defendendo que, em Cabo Verde, os valores e ideias de Cabral foram mais longe.

Recusando a ideia de que Cabral terá sido ingénuo ao acreditar na unidade Guiné/Cabo Verde, Tolentino sustentou que o contexto africano das décadas de 1950, 1960 e 1970 tinha como pano de fundo precisamente a unidade africana.

"Foi correto e útil pensar essa unidade no contexto da unidade africana. Era razoável pensar-se assim. Reduzir as tensões e os riscos e aumentar o denominador comum, estendendo a unidade, foi uma estratégia genial", apesar de, mais tarde, em 1980, o "sonho" ter caído por terra com o golpe de Estado na Guiné-Bissau, disse.

Para Tolentino, Cabral está ao nível de um grande líder africano, mas a sua obra tem sido prejudicada por uma visão "muito circunstanciada e apologética", com pouca crítica.

"Hoje em dia, há cada vez mais crítica, no sentido de estudar com profundidade a obra de Cabral, para se poder dizer que ele falhou numas propostas e acertou noutras.


"É um pensador de que nos podemos orgulhar em África e pelo lugar que conquistou no mundo", disse. Ouvir aqui»

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