sábado, 26 de janeiro de 2019

A PROPÓSITO DA APLICAÇÃO EFECTIVA DA LEI DA PARIDADE PELO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA GUINÉ-BISSAU

“Todos os cidadãos são iguais perante a lei, gozam dos mesmos direitos e estão sujeitos aos mesmos deveres, sem distinção de raça, sexo, nível social, intelectual ou cultural, crença religiosa ou convicção filosófica.” - Constituição da República da Guiné-Bissau no seu Artigo 24º. 
“O homem e a mulher são iguais perante a lei em todos os domínios da vida política, económica, social e cultural.” - Constituição da República da Guiné-Bissau no seu Artigo 25º. 
Por:  Advogado e Consultor Jurídico, Dr. Carlos Vamain

De acordo com a informação veiculada nesta rede social pelo nosso compatriota, o Jornalista Braima Darame, «O Supremo Tribunal de Justiça (STJ), que na Guiné-Bissau também tem as competências de tribunal eleitoral, «está intransigente» em relação aos partidos que ignorarem a obrigatoriedade de apresentar 36% de mulheres nas suas listas de candidatos a deputado». E acrescenta o Jornalista, que: «Fonte do STJ disse à Lusa que «algumas listas» de partidos concorrentes às legislativas de 10 de março, «poderão ser rejeitadas por não respeitarem a quota mínima de 36% de mulheres», conforme a lei da paridade…». A dado passo da notícia, o Jornalista afirma o seguinte: « … é entendimento do Supremo Tribunal que em cada círculo eleitoral os partidos são obrigados a propor 36% de mulheres entre candidatos a deputados efetivos e suplentes.»

Ora, da leitura da Lei n.º 4/2018, aprovada pela Assembleia Nacional Popular (ANP), em 22 de novembro e promulgado pelo Presidente da República, em 3 de dezembro, depreende-se, desde logo, que para o legislador o presente diploma só: (…) tem como finalidade a observação de uma maior igualdade de oportunidade na esfera de decisão, incentivando os partidos a promoverem a paridade entre o homem e a mulher na esfera do exercício de cargos políticos, conforme o disposto no seu Artigo 1º. Isto porque, trata-se simplesmente de uma legislação complementar à nossa Constituição da República (Artigo 24º), a saber: «Todos os cidadãos são iguais perante a lei, gozam dos mesmos direitos e estão sujeitos aos mesmos deveres, sem distinção de raça, sexo, nível social, intelectual ou cultural, crença religiosa ou convicção filosófica.» E à esta disposição, acresce o disposto no seu Artigo 25º, que: «O homem e a mulher são iguais perante a lei em todos os domínios da vida política, económica, social e cultural.»

A presente lei de paridade não obriga nenhum partido político a aplicar a lei da paridade, mas unicamente a incentivar os partidos a mobilizarem a participação feminina em actividades políticas numa perspectiva de sua integração nos órgãos de decisão política do país. Uma situação que depende essencialmente das mulheres. Isso porque os partidos políticos não são e nunca serão culpados pela não participação das mulheres nas actividades políticas do país. Neste contexto, o legislador compreendeu bem a realidade do país e decidiu não adoptar a obrigatoriedade da aplicação da presente lei, anomalamente denominada de paridade - que devia tão-só ser denominada por lei de quotas -, mais sim, decidiu fixar a quota para a participação das mulheres em listas para eleições a cargos de deputados em 36%. Em todos os sentidos, trata-se, pois, de uma lei de quotas e não da lei de paridade.

Voltando à essência deste breve artigo de opinião, a própria lei fornece-nos o significado da paridade, que nenhum tribunal pode alterar: «Entende-se por paridade para efeitos da aplicação da presente lei, a representação mínima de 36% de mulher na lista para os cargos electivios (Artigo 4º, n.º1). Já no número 2, deste mesmo Artigo, dispõe que para o cumprimento do disposto no número 1, as listas plurinominais apresentadas pelos partidos não podem conter apenas os candidatos do mesmo género por forma a respeitar a paridade, conforme definida por lei.

O não respeito pelo disposto no Artigo 4º, da lei em causa, não implica a rejeição da lista do partido em participar nas eleições – sob pena de se incorrer na má aplicação da lei e, consequentemente, na má administração da justiça -, mas tão-só, a notificação, nos termos da lei eleitoral, pelo Supremo Tribunal de Justiça, neste caso concreto, ao mandatário do partido em causa para a correcção das listas. E, caso o partido não as corrija no prazo assinado pelo Tribunal, as sanções são apenas as previstas nos artigos 6º, 7º, 9º e 10º, da referida lei de paridade.

E estas sanções apenas dizem respeito, nomeadamente, à afixação pública das listas com a sua desconformidade com a lei; a sua divulgação nos órgãos de comunicação social, a redução do montante das subvenções (Artigo 9º) e a perda de isenções e de benefícios fiscais (Artigo 10ª), que tenham sido concedidos pelo Estado, subentenda-se, ao partido em causa.

Assim sendo, toda e qualquer interpretação em contrário da presente Lei n.º 4/2018, denominada de paridade só poderá contribuir para a perpetuação da instabilidade política no país. Isto porque aos tribunais, enquanto órgãos de soberania só têm a missão da aplicação da lei e não de legiferar, que compete à ANP e ao Governo, nos termos da Constituição da República da Guiné-Bissau (Artigo 91º). Os tribunais têm por finalidade a regulação e a pacificação da sociedade, contribuindo na criação de ambiente favorável para a promoção de investimentos nacionais e estrangeiros visando a criação de empregos, da riqueza e do robustecimento do Estado.

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