os políticos vendem-nos, na busca do nosso voto, programas que já sabem que não vão cumprir, mentem-nos com toda a verdade que sabem imprimir a um discurso em que, no fundo, nenhum de nós - a começar por eles - acredita.
Há muitos anos, tive um chefe só com
certezas: perante qualquer assunto, tinha sempre uma sólida opinião, que
assumia com uma inabalável determinação. Porém, se as circunstâncias mudavam e,
forçado pela realidade, se via obrigado a alterar o que pensava, era em
absoluto incapaz de confessar que se tinha enganado. Afirmava a nova posição
com total desplante, como se nunca tivesse dito algo diferente. E ai de quem
tentasse sugerir que se estava a contradizer!
Quando passei pela política, aprendi que,
por aí, a regra era exatamente a mesma. Raramente se ouve alguém dizer:
"Enganei-me, procedi de forma errada e, porque aprendi com esses erros,
vou de futuro fazer diferente". Um político que assim proceda teme que lhe
seja atirado à cara que, afinal, era a oposição da época que tinha razão e que,
se ele havia cometido então os erros que agora confessava, talvez não haja
razões para o eleitorado voltar a confiar em que ele não venha a errar de novo
no futuro. E, por isso, continuará, com a segurança de sempre, a dizer e a
fazer coisas diferentes das que fez ou não fez no passado, mas sempre sem se
retratar, como se nada tivesse ocorrido, incapaz de pedir desculpa pelos
pecados cometidos.
Há quem, numa altivez política, teorize
mesmo esse comportamento. A uma figura pública muito conhecida, perguntei um
dia que erros reconhecia que cometera, face a uma realidade que se tinha
revelado completamente adversa das soluções que ele empreendera. Abespinhou-se
comigo e disse-me: "Eu não cometi erros. Atuei, da forma que me pareceu
mais adequada, em face dos dados de que, à época, dispunha. Esses dados e os
pareceres que recebi com base neles, apontavam para a tomada das medidas que
tomei". Ingénuo, perguntei-lhe se, ao menos, se não arrependia de ter
assumido as políticas que então preconizara. A resposta foi lapidar:
"Arrependermo-nos é errar duas vezes..." E passou à frente.
Será inevitável que os políticos procedam
sempre desta forma? É assim tão impiedosa, ao ponto do absurdo, a opinião
pública? Não será esta capaz de apreciar a sinceridade, a honestidade e a
franqueza, o humano assumir do que se fez de errado? Gostava de pensar que sim,
mas não penso. E, por isso, aprendi a viver com os políticos: vendem-nos, na
busca do nosso voto, programas que já sabem que não vão cumprir, mentem-nos com
toda a verdade que sabem imprimir a um discurso em que, no fundo, nenhum de nós
- a começar por eles - acredita. É o teatro da verdade.
Nota: Os artigos assinados por amigos, colaboradores ou outros não vinculam a IBD, necessariamente, às opiniões neles expressas.
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