A descida do preço do petróleo é uma
ameaça à projeção de poder, influência e eficiência que Angola quer projetar
internacionalmente, disse em entrevista à Lusa a analista da Crisis Group que
segue o país.
"A crise do petróleo vai, de uma
forma ou de outra, acelerar a mudança porque um país que tem um défice de quase
17 mil milhões de dólares no Orçamento, vai ter de fazer cortes e poderá ter
alguma instabilidade, e isto influencia o poder externo, na medida em que a
crise dificulta o papel de mediador de países com instabilidade se o Governo
angolano não estiver preparado para tomar essas medidas internamente",
argumenta Paula Roque, uma investigadora portuguesa que trabalha no 'think
tank' Crisis Group, em Joanesburgo.
"A argumentação que Angola
apresentou para entrar como membro não permanente no Conselho de Segurança das
Nações Unidas foi na perspetiva de ter um papel importante para o continente,
mas isso traz responsabilidades, e o país não pode entrar em contradição, isto
é, não poderá apelar a reformas enquanto mediador de países com instabilidade
se o próprio Governo não está a tomar essas medidas internamente", explica
Paula Roque, acrescentando que, também por isso, a descida do preço do petróleo
vai acelerar a mudança.
"Se o Governo tem um défice de
quase 17 mil milhões de dólares no Orçamento do Estado, vai ter de fazer cortes
na função pública e isso poderá gerar alguma instabilidade, tensão social e
económica, e neste aspeto o Governo terá de tomar medidas de contenção
económica, para além de dever empenhar-se na diversificação da economia,
gerando recursos fora do setor petrolífero", argumenta a investigadora.
Para Paula Roque, Angola não vai
conseguir recuperar o caminho que estava a seguir, mas vai ser capaz de
recuperar e manter a projeção internacional, mas apenas se fizer reformas:
"A crise é um desvio no percurso, mas pode ser um desvio importante de boa
governação se repensarem a abordagem que estão a fazer agora, porque ainda é um
país fascinante para o exterior, pouco entendido e pode ter um papel
importantíssimo em África".
O papel importante estende-se, de resto,
ao próprio Presidente, argumenta: "Estamos a viver um momento de transição
importante, a descida do preço do petróleo poderá ser uma oportunidade para o
Presidente pensar como vai fazer a sua sucessão e o legado que quer deixar - o
legado da paz foi importantíssimo, mas tem de ser uma paz construtiva e com
desenvolvimento, não uma paz que gera problemas e convulsões".
Questionada sobre se Angola aprendeu as
lições da crise de 2008/2009, que obrigou à intervenção do Fundo Monetário
Internacional, Paula Roque mostra-se cética, sublinhando que o país não
conseguiu, seis anos depois, diversificar a economia e deixar de depender tão
fortemente da produção de petróleo.
"Angola vai ter de cumprir com as
promessas de 2012, que era crescer mais para distribuir melhor, mas aprendeu
com a crise de 2009? Não sei, porque não diversificou a economia, não criou outras
bases para gerar recursos para o Estado, como a agricultura, que era muito
importante para sustentar outra crise petrolífera", explica a
investigadora, notando que há seis anos a crise foi o resultado da crise
financeira mundial, "enquanto agora é o resultado da sobreprodução, o que
pode ter uma duração muito maior e, por isso, não é garantido que o petróleo
regresse aos 120 dólares por barril, aliás se calhar nunca mais regressa a esse
nível".
Angola, conclui, "ainda está a
tempo de reagir bem à crise, mas terá de se empenhar em não fazer cortes nas
áreas mais necessitadas, como o desenvolvimento".
//noticiasaominuto
Sem comentários :
Enviar um comentário
COMENTÁRIOS
Atenção: este é um espaço público e moderado. Não forneça os seus dados pessoais (como telefone ou morada) nem utilize linguagem imprópria.